No fim de 2015, o administrador João Ferraz de Almeida Prado precisou se desfazer de cotas de consórcio que sua família possuía e se deparou com um mercado extremamente informal, desestruturado e com muita assimetria de informações. Foi aí que ele teve a ideia de construir uma solução tecnológica para resolver o problema de liquidez de quem comprou consórcio e precisa vender as cotas.
Potencial existe. Ao final de 2020 — último dado divulgado pelo Banco Central (BC) — o setor tinha 7,65 milhões de cotas excluídas. Historicamente, o índice de exclusão é alto e se aproximou de 50% do total das cotas em 2020. Na prática, isso significa que cerca de metade das pessoas que adquirem uma cota de consórcio não consegue adquirir o bem desejado.
Ao lado dos colegas de faculdade Alexandre Caliman e Pedro Amoroso Lima, João começou a construir o que viria a ser a Consorciei, uma plataforma com foco no mercado secundário, lançada em 2018, que permite ao cliente vender sua cota de consórcio, em um processo 100% digital, conectando administradoras, gestores de FIDCs (fundos de investimento em direitos creditórios) e clientes.
De lá pra cá, a fintech movimentou mais de R$ 450 milhões – R$ 210 milhões somente no ano passado –, atendendo mais de 20 mil clientes. Neste ano, a expectativa é crescer entre 2x e 2,5x o volume transacionado, e parte relevante dessa expansão deve vir da solução ‘as a service’ que acaba de ser lançada.
Com investimento de R$ 3 milhões, a nova plataforma permite às administradoras de consórcio ofertarem aos seus clientes a opção de venda das cotas ou o crédito com garantia das cotas. A solução é ‘plug and play’ e faz todo o processo, do lead à conclusão da transação, passando pelo fornecimento da plataforma tecnológica para que os clientes vendam suas cotas.
“Com o ‘as a service’, estamos ampliando o grau de relacionamento com as administradoras”, explica João Ferraz de Almeida Prado, sócio e cofundador da Consorciei, em entrevista exclusiva ao Finsiders. “[A solução] permite que 100% dos clientes dessas administradoras, independentemente do funding, passem a concluir a transação com o mesmo nível de experiência, em um ambiente 100% online e customizado com a identidade visual de cada administradora.”
A ferramenta foi construída com capacidade para atender administradoras de diferentes tamanhos. Para dar uma dimensão, hoje mais de dez administradoras estão plugadas à solução própria da Consorciei – são nomes como Itaú, Santander, Porto Seguro, Magalu, Randon e outros que, juntos, representam mais de um quarto do mercado de consórcios.
No ‘as a service’, os primeiros contratos já foram fechados, mas o empreendedor não fala em nomes. “Temos um pipeline interessante de próximos fechamentos”, informa. “Em algumas [das administradoras], é quase um processo evolutivo do nosso relacionamento.”
Expansão
A criação do modelo ‘as a service’ é mais um passo dado pela Consorciei para se firmar como um player relevante no mercado secundário de cotas de consórcios. Recentemente, a fintech também passou a disponibilizar uma linha de crédito com garantia de cotas (ativas ou canceladas), com operações de até 36 meses e taxas a partir de 1% ao mês.
Para realizar a operação de crédito, a fintech tem parceria com a QI Tech, uma SCD (Sociedade de Crédito Direto) que possui soluções de ‘credit as a service’ (CaaS) e fica responsável pela emissão das CCBs (Cédulas de Crédito Bancário) das operações.
“O funding vem de uma estrutura de securitização, com uma debênture financeira, mas tende a evoluir para um FIDC”, explica João.
Já para a transação tradicional de transferência das cotas, a Consorciei levantou dois FIDCs – o primeiro, gerido pela Integral Investimentos, soma atualmente patrimônio líquido (PL) de R$ 210 milhões; o segundo, sob gestão da Tera Capital, levantou R$ 165 milhões recentemente, em uma oferta integralmente subscrita. “Conseguimos trazer investidores institucionais de crédito”, diz o empreendedor.
A fintech também estuda a entrada no mercado primário de consórcio, que tem ficado cada vez mais disputado com novos entrantes.
“Temos estudado bem as alternativas e os modelos de negócio. É um projeto novo e que ainda está numa fase mais de estruturação do que de comercialização.”
Captable
Até meados de 2018, a Consorciei rodou a primeira versão da solução com recursos próprios dos sócios. No fim daquele ano, levantou um cheque de R$ 4 milhões com a Kamaroopin (uma das gestoras da SK Tarpon).
Em junho de 2021, a fintech captou uma Série A de R$ 30 milhões, liderada pela Tera, family-office dos fundadores do Pátria, em uma rodada acompanhada pela Tarpon e por outros family-offices.
Mercado
O avanço das fintechs como a Consorciei no mercado de consórcio tem explicação. Em 2021, a modalidade bateu recordes históricos de vendas. No total, o volume de créditos comercializados somou R$ 222,26 bilhões, alta de 35,8% ano contra ano, segundo dados divulgados pela Abac.
Com diferentes modelos de negócio, disputam uma fatia do bolo players como a BomConsórcio, fintech soteropolitana que também atua no secundário e em setembro do ano passado captou R$ 30 milhões com a gestora Crescera Capital, antiga Bozano do atual ministro da Economia, Paulo Guedes.
A lista de competidores inclui, ainda, Mycon (que prevê vender R$ 4 bilhões em consórcios este ano e lançou recentemente seu marketplace), Turn2C (cuja história foi revelada em primeira mão pelo Finsiders), Klubi (que levantou em outubro R$ 32,5 milhões), a Eutbem (que recentemente entrou nos segmentos de carros e motos), a Up Consórcios (da Embracon), entre outras. Um sinal de que potencial não falta para a expansão de novos entrantes no setor.
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