Há cerca de um ano, o Finsiders contou em primeira mão a história da Turn2C, uma nova fintech a desbravar o tradicional e pouco inovador mercado de consórcios. Na ocasião, a empresa havia acabado de iniciar as operações e já com o apoio (e o cheque) de um executivo tarimbado como investidor-anjo: Fabio Leme, que atuou no alto escalão de empresas como HDI Seguros, Itaú Unibanco, AIG e Liberty Seguros.
Agora, o captable ganha mais reforços de peso. Isso porque a Turn2C acaba de levantar um seed money de R$ 8,5 milhões em uma rodada liderada pelo fundo Honey Island by 4UM — criado no ano passado por Honey Island Capital e 4UM Investimentos, conforme mostrou o Finsiders. O round teve a participação de nada menos que a B3, e contou ainda com a Urca Angels. O valuation não foi revelado.
“O consórcio como conhecemos tem um potencial subestimado pelo mercado financeiro, em especial como solução de autofinanciamento. Ficamos positivamente surpresos pela proposta de valor da startup e pelos resultados surpreendentes que tem alcançado”, diz Léo Jianoti, membro do comitê de investimento do fundo Honey Island by 4UM.
Para a B3 — que vem buscando crescer em outras frentes —, o aporte é estratégico. “O investimento na Turn2C é mais um passo nessa direção e amplia a nossa atuação no segmento de infraestrutura de financiamento”, assinala Marcos Vanderlei, VP da unidade de infraestrutura para financiamentos da B3.
Modelo de negócio e tecnologia
Em entrevista exclusiva ao Finsiders, o fundador e CEO Bruno de Lima Pinheiro explica que a Turn2C quer fazer um “consórcio inteligente”. Com uso de inteligência artificial (IA), big data, modelos matemáticos e estatísticos, a fintech facilita o “match” entre as opções de consórcios e o cliente, considerando o perfil de cada consumidor e, especialmente, seu objetivo com a compra do consórcio (adquirir um carro ou imóvel, por exemplo).
“Temos pouco mais de 14 modelos que analisam todas as informações de grupos de consórcios de administradoras, e geram análises para fazer o match com o objetivo do cliente. É uma quantidade imensa de dados”, diz Bruno — que teve passagens por players como Itaú Unibanco e C6 Bank, e tem como sócios na Turn2C a advogada Tatiana Bacchi E. Anderson (ex-Votorantim e Rabobank) e Thiago Almeida (ex-Mapfre).
O modelo de negócio é B2B2C, ou seja, a Turn2C não atende diretamente o cliente final, e sim fecha acordos com canais de distribuição (que têm os clientes) em uma ponta e com as administradoras de consórcios, na outra. Entre os parceiros estão assessores de investimentos (a nova nomenclatura dos agentes autônomos, AAIs), consultores de investimentos, corretores de seguros e ex-gerentes de bancos que hoje atuam de maneira autônoma.
Há um ano, quando falou pela primeira vez ao Finsiders, a base tinha 240 parceiros, com expectativa na ocasião de chegar a 500 até o fim de 2021 — número que foi superado.
“Terminamos o ano com 800, agora já passamos de 1,4 mil e aumentamos a meta para encerrar 2022 com 3 mil parceiros”, conta o empreendedor.
Entre os escritórios que utilizam a solução estão Acqua-Vero (que tem o BTG Pactual como sócio), Valor Investimentos (ligado à XP), além da corretora de seguros Asteca, entre outros nomes.
“Estamos abrindo diversos canais de distribuição, como franqueadoras de veículos, fundos de investimento”, exemplifica Bruno. “Estamos em negociação agora com uma rede de materiais de construção, que tem 40 lojas no Brasil, e vai oferecer consórcio para reforma e construção”, diz ele, que ainda não pode revelar o nome da empresa.
Na plataforma da Turn2C estão plugadas algumas das maiores administradoras de consórcios do país, como Itaú Unibanco, Banco do Brasil, Santander, Embracon e Mapfre. Juntas, as 16 companhias representam, segundo Bruno, 72% do mercado. O último dado divulgado pelo Banco Central (BC), referente a 2020, aponta 141 empresas no setor, sendo 136 com grupos ativos. Até o fim do ano, a fintech estima chegar a 80% do total de administradoras e consulta a 6 mil grupos ativos.
A estratégia e o modelo de negócio da startup têm explicação. Ao final de 2020, o setor tinha 7,65 milhões de cotas excluídas. Historicamente, o índice de exclusão é alto e se aproximou de 50% do total das cotas em 2020. Na prática, isso significa que cerca de metade das pessoas que adquirem uma cota de consórcio não consegue adquirir o bem desejado. Um dado que escancara a ineficiência de um mercado gigantesco, que cresce a dois dígitos ao ano e movimentou R$ 222,26 bilhões em 2021.
“O ativo consórcio, a dinâmica do produto e a matemática financeira são vantajosas para o cliente, desde que o produto seja o correto para o objetivo de cada pessoa”, diz Bruno. “Entrego uma solução mais ágil, com 96% de acuracidade nas análises. Ou seja, a cada 100 análises, nosso modelo acerta 96 na risca. E conforme temos mais dados, o modelo fica melhor. Já estamos na 26ª versão do modelo. E com índice de inadimplência de 3%.”
Planos
Em média, por mês, um volume de R$ 200 milhões em cartas de crédito passam pela solução da fintech. “A ideia agora é aumentar a capilaridade, explorar novos canais [de distribuição], e fazer mais do mercado passar pela solução da Turn2C”, aponta Bruno. Até agora, o crescimento foi bastante orgânico e, com o aporte, a ideia é passar a investir mais em material publicitário, diz o empreendedor.
A empresa também planeja novos produtos e serviços, tanto para a rede de parceiros quanto para o cliente final. Sem abrir detalhes, Bruno conta que dois “grandes lançamentos” estão previstos ainda para este ano.
Outro plano, este para 2023, é a expansão internacional, começando por países na América Latina, como Argentina, Equador, Peru, Colômbia e Uruguai. “Sabemos que nossa estratégia é replicável em países como Uruguai, que tem o chamado ‘ahorro previo’”, exemplifica. Questionado se algum país é prioridade, o empreendedor diz que isso ainda não foi definido. “Vamos ver mais pra frente isso. Este ano ainda temos muito ‘mato alto’ para cortar no Brasil.”
Competição
Um “mato” que tem cada vez mais players tentando “cortar”, cada um com uma técnica (ou melhor, modelo de negócio). Oportunidades não faltam para explorar em um setor que bateu recorde histórico de vendas no ano passado, com R$ 222,26 bilhões em créditos comercializados, alta de 35,8% ano contra ano, conforme dados da Abac, associação que representa mais de 120 administradoras de consórcios.
Além da Turn2C, na lista de fintechs com foco no ramo — incluindo negócios mirando os mercados primário e secundário —, estão players como Mycon, Consorciei, BomConsórcio, Klubi, Eutbem, Up Consórcios (criada pela Embracon), entre outros.
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