O “jogo” está começando para a iniciação de transação de pagamento (ITP). A modalidade — que integra a fase 3 do Open Finance — ganhará tração mesmo quando recursos como jornada sem direcionamento e pagamentos recorrentes forem implementados, avaliam executivos de BTG Pactual, Celcoin, Iniciador, Itaú Unibanco, Mercado Pago e PicPay, em reportagem que assino nesta semana no Valor Econômico, como parte do caderno especial “Meios de pagamento”.
“Estamos na fase 1 da iniciação de pagamento”, resume Marcos Xavier, sócio e head da área de banking as a service (BaaS) do BTG Pactual. O banco aposta em uma solução de “ITP as a service”. Na prática, permite que empresas não financeiras ofereçam a seus clientes a experiência de ITP, sem precisar construir dentro de casa toda a infraestrutura tecnológica e regulatória.
Segundo o executivo, o banco é agnóstico em relação a segmentos, e tem atuado como ‘enabler’ de carteiras digitais ou players que precisam cobrar as parcelas de um empréstimo, por exemplo. “Depende da criatividade do nosso cliente B2B”, afirma Marcos.
Quem também aposta nessa tendência é a Celcoin, que fornece infraestrutura de tecnologia financeira e bancária. Há exato um ano, a fintech colocava no ar sua API de iniciação de pagamento, conforme mostrou o Finsiders. Hoje, cerca de 30 empresas já utilizam a solução, segundo Thiago Zaninotti, CTO da Celcoin. “A maior parte desse grupo é de empresas de conteúdos e produtos digitais, e o restante são casos específicos de varejo.”
Outros modais
Para o executivo, a iniciação vai funcionar como uma espécie de “meio de transporte” para os principais métodos de pagamento. Naturalmente, o Pix é a prioridade, contudo, a agenda evolutiva do Banco Central (BC) prevê outras modalidades, como TED, boleto, débito em conta e até cartões. Aliás, foi o que disse João André Calvino Marques Pereira, chefe do departamento de Regulação do BC, ao podcast da Let’s Open.
“O ITP, na verdade, vai funcionar como veículo de transporte para conectar os diferentes modais de pagamento. No fundo, o BC deseja que as operações de ‘cash-in’ e ‘cash-out’ ocorram de forma aberta, via APIs”, aponta o CTO da Celcoin. “O futuro do ITP não será só olhar para desembolso, mas também para troca de dados. Isso vai habilitar casos de uso, como verificação de identidade, onboarding em outros serviços financeiros e facilidade para portar serviços.”
No Itaú, a iniciação de pagamento começou a ser disponibilizada no fim do ano passado para clientes pessoas físicas e, em abril de 2023, o banco liberou essa funcionalidade para mais de 1 milhão de pequenas e médias empresas (PMEs). Em outra frente, a instituição também atua com a solução de “ITP as a service”, dentro da proposta do que chama de “Itaú as a service”. Um dos clientes, por exemplo, é a operadora de telefonia Vivo.
Conforme diz Marcos Cavagnoli, diretor de fluxo de pagamentos do Itaú Unibanco, há um crescimento na procura por e-commerces, principalmente, mas o executivo entende que o ITP está em seu estágio inicial. “2023 é o ano de fazer testes, reduzir o tempo da jornada, para escalar em 2024”, avalia. “É como qualquer produto digital: faz MVP, pega feedbacks, melhora, daí escala. O próprio Pix foi assim. Nada é lançado e começa a rodar 100% de partida.”
“Experiência Uber”
Na visão de Patrícia Leal, diretora de inovação em pagamentos do Mercado Pago, o iniciador de pagamento chegou para “revolucionar” a forma de pagar online, especialmente em e-commerces. “De maneira geral, o mercado tem dado passos importantes para melhorar a experiência e intensificar o uso e a adoção”, avalia a executiva. “O objetivo de toda a indústria é chegar na ‘experiência Uber’, ou seja, o pagamento se torna uma etapa do processo, sem que a pessoa sinta.”
Primeira companhia a colocar o serviço de ITP em produção, em fevereiro do ano passado, o Mercado Pago soma 440 mil usuários ativos da iniciação de pagamento. Atualmente, disponibiliza a solução para “cash-in” e também como opção no check-out dos “sellers” que são clientes do banco digital. Entre os próximos passos estão colocar essa funcionalidade em jornadas de cobrança e agregação de conta. “Estamos estudando como entregar isso de forma simples para facilitar a vida dos clientes.”
A consolidação das finanças dos usuários num só ambiente é a tese do PicPay. A fintech lançou há pouco mais de três meses o que chama de “conta das contas”, bebendo da fonte do Guiabolso, o aplicativo de gestão financeira comprado em 2021 pela companhia. Desde a sua criação, o “conta das contas” soma 1,5 milhão de usuários, 3 milhões de acessos e mais de R$ 17 milhões transacionados.
O tamanho da base do super app — mais de 33 milhões de usuários ativos — revela a oportunidade. “O nível de conversão ainda está abaixo do que deveria ser, mas o próprio mercado como um todo precisa evoluir nesse sentido”, avalia Pedro Romero, diretor de serviços financeiros para pessoa física do PicPay. Segundo o executivo, o nível de engajamento de quem usa o “conta das contas” tem sido maior. “O cliente transaciona mais no PicPay.”
Quadro atual
Atualmente há 22 instituições aptas a operar como ITP, de acordo com o Banco Central. No acumulado do ano, até 31 de julho, foram movimentados R$ 273,9 milhões em quase 800 mil transações nessa modalidade. No mês passado, o volume total se aproximou de R$ 65 milhões, o que representou uma alta de mais de 20% em relação a junho. Na comparação anual, o avanço é de mais de 6x.
A fila de players com interesse em atuar como ITP vem aumentando. Há mais três instituições já autorizadas e neste momento em processo de adesão ao Open Finance em andamento na Estrutura de Governança. Existem, ainda, 28 companhias que já entraram com o pedido de autorização junto ao regulador. “O BC tem percebido o crescimento do interesse das instituições na atuação como ITP, em função, em grande medida, dos avanços nas funcionalidades e nos casos de uso em que essas instituições poderão atuar”, disse o órgão, ao Valor.
Na visão de Marcelo Martins, CEO da fintech Iniciador e diretor-executivo da Associação Brasileira de Fintechs (ABFintechs), evoluções como a jornada sem redirecionamento e a opção de transações recorrentes vão impulsionar a iniciação de pagamento no país. “E com as melhorias no fluxo, novos produtos em cima do ITP serão criados”, aponta o especialista.
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