MERCADO FINANCEIRO

Como os antigos bondes têm a ver com o cenário atual das fintechs

Uma breve reflexão sobre a época das financeiras independentes e a evolução do mercado com o avanço das fintechs

Imagem: Acervo pessoal
Nilton Volpi. Imagem: Acervo pessoal

Quanto conto estórias de bondes na São Paulo de 1950 e anos seguintes, passagem da minha infância para a juventude, meus netos ficam me olhando com olhares incrédulos, de espanto, e com cara de quem vai perguntar: “do que é mesmo que o vovô está falando?”. O mesmo acontece quando, conversando com profissionais do mercado bancário, me refiro a antigos tempos dessa atividade.

Participei do mercado na época das financeiras independentes, particularmente as dedicadas a empréstimos para pessoas físicas, com ou sem garantia. Era o tempo em que o crédito era aprovado quase “olho-no-olho” ou com “critérios técnicos” daquela época.

O sucesso ou não das carteiras de crédito era muito dependente da conjuntura de mercado. As financeiras independentes tinham mais dificuldades em vencer os ciclos dos anos de planos econômicos mal-sucedidos.

O Banco Central, com alguma frequência, acompanhava a transferência dessas instituições independentes para os bancos maiores e com melhores condições de captação de recursos, evitando assim crises sistêmicas no mercado.

Avanço das fintechs

Participei também da fase da instalação das primeiras fintechs, estrangeiras ou nacionais. Elas mudaram o mercado, operando inicialmente com recursos próprios aportados por investidores estrangeiros ou fundos familiares nacionais.

Essas empresas cresceram rapidamente utilizando algoritmos, oferecendo crédito por meio de sites ou aplicativos para a massa crescente de jovens tomadores de empréstimos sem garantia, com prazos de 6 a 12 meses e tíquete médio pequeno.

Além disso, as fintechs tiveram relativa facilidade de captar recursos por meio dos FIDCs e nem sempre apresentaram retornos financeiros convincentes. Eram mais cobradas pelo crescimento das carteiras e do número de clientes do que pelos resultados.

Desafios para crescer e sobreviver

Assim como os antigos bondes de São Paulo foram substituídos por corredores de ônibus, metrôs etc., as fintechs estão passando por maiores desafios para crescer e sobreviver. Ao mesmo tempo, há exigências dos investidores para obtenção de lucratividade real juntamente com o crescimento saudável das carteiras de crédito. A atual conjuntura atingiu duramente os resultados de alguns players.

O mercado está se ajustando, haverá vencedores (uns poucos), haverá fusões e aquisições. Além disso, os bancos retomarão parte desse mercado utilizando-se de produtos melhorados em relação àqueles inovados pelas fintechs.

Meus netos serão clientes de outros tempos e outras soluções ou dirão novamente “do que é mesmo que o vovô está falando?”.

[Texto republicado do LinkedIn do autor]

*Nilton Volpi tem mais de 35 anos no setor financeiro. Entre outras posições, foi vice-presidente da American Express e do Citibank, presidente da Abecs e sócio da fintech Rebel (hoje Open Co).