Thiago Rolli e Gabrielle Hernandes*
No cenário atual de serviços financeiros, há muitas discussões sobre o conceito de finanças embarcadas (Embedded Finance) e como ele pode apoiar a entrada no segmento financeiro de empresas de outros setores. Para exemplificar essa questão, é possível considerar um varejista que oferece cartão de crédito próprio para seus clientes fazerem compras. Esse varejista também pode oferecer a mesma extensão de crédito aos seus fornecedores com a antecipação de recebíveis, de forma inovadora e fluída. Neste caso, a empresa tem acesso a novos serviços, não somente o crediário, potencializa a principal cadeia de valor e melhora a experiência do consumidor.
O modelo de finanças embarcadas é uma oportunidade para varejistas, atacadistas, indústrias, cooperativas, produtores, prestadores de serviço e empresas de telecomunicações, entre outros, para a oferta de produtos e serviços financeiros sem intermediação de instituições financeiras. Com a estrutura de finanças embarcadas, é possível utilizar mecanismos como APIs (Application Programming Interface ou Interface de Programação de Aplicação, em português) de empresas de segmentos variados, como e-commerces, plataformas de marketplace, provedores de serviços financeiros e produtos de backoffice com estrutura de tecnologia. É oferecida então aos clientes uma seleção de produtos financeiros, principalmente aqueles relacionados a meios de pagamento, como contas digitais, concessão de crédito, seguros e investimentos.
A premissa e o contexto que formam a base dessa oportunidade são o desenvolvimento de plataformas e a exposição dos serviços de maneira intuitiva, em que os aplicativos e o ecossistema de serviços são potencializados em uma experiência inovadora integrada às ofertas originais da empresa. Acrônimos como BAAS (Banking as a Service) e CAAS (Credit as a Service) são exemplos de modelos de negócios que permitem a experimentação e validação de teses pelas empresas de origem não financeira. Estudo da Juniper Research prevê que, em 2026, o mercado de finanças embarcadas atingirá a marca de US$ 138 bilhões, um aumento de 215% no volume de operações no período de 2021 a 2026.
A colaboração entre empresas que não atuam no segmento financeiro e instituições financeiras aumenta o potencial competitivo do mercado e a satisfação do consumidor, podendo ampliar a inclusão de clientes, proporcionar educação financeira, diversificar fontes de receitas, e reduzir custos de capital. Um aspecto relevante é que o modelo de finanças embarcadas requer o cumprimento de diretrizes do Banco Central relacionadas com governança corporativa, controles internos, compliance, segurança de informação, privacidade de dados e proteção contra fraudes. A agenda propositiva do Banco Central, regulador do setor financeiro, em seu conceito BC#, tem calibrado os processos de regulação e de supervisão para ampliar a simetria de regras e modelos de negócios.
O modelo de finanças embarcadas tem potencial para gerar diversos casos de uso, possibilitando que empresas não financeiras desenvolvam novos modelos de negócios na oferta de serviços financeiros, como CaaS(Credit as a Service) e BaaS(Banking as a Service), facilitados pela utilização de APIs e de infraestruturas reduzidas com o apoio de prestadores de serviços de tecnologia. Adicionalmente, em razão da criação de uma linha de serviços financeiros, também é necessário avaliar a estrutura societária e o modelo tributário atual da empresa para suportar a nova operação e alcançar maior eficiência tributária.
Empresas que disponibilizam novos produtos e serviços financeiros digitais aos seus clientes por meio do modelo de finanças embarcadas poderão apresentar vantagens competitivas no mercado financeiro tradicional, o que demandará alterações em sua cadeia de valor, investimentos em tecnologia, compliance, proteção de dados e jornada de experiência do consumidor. Trata-se de uma oportunidade de nova fonte de receita e melhoria do engajamento de clientes no ecossistema das organizações, podendo potencializar novos caminhos e modelos de negócios no contexto de serviços financeiros.
*Thiago Rolli é sócio de Consulting e Gabrielle Hernandes é sócia-diretora de Consulting da KPMG no Brasil