Golpes | Imagem: gerada por IA/Adobe
Golpes | Imagem: gerada por IA/Adobe

O Pix foi apresentado ao Brasil como a solução definitiva para pagamentos instantâneos: rápido, acessível, quase sem custos para o usuário. As fintechs, por sua vez, surgiram como agentes modernizadores, para democratizar crédito, serviços bancários e dar voz ao cliente tradicionalmente excluído do sistema financeiro. Mas, passados alguns anos, essas “soluções” começam a revelar efeitos colaterais preocupantes. Inovação sem mecanismos proporcionais de segurança, regulação e responsabilização se mostram insuficientes. E os prejuízos já são gigantes.

Os dados são alarmantes. De acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, entre julho de 2024 e junho de 2025, cerca de 24 milhões de brasileiros foram vítimas de golpes financeiros envolvendo Pix ou boletos bancários, resultando em um prejuízo estimado em quase R$ 29 bilhões. 

Esses números não são meros erros, eles começam a se configurar como risco sistêmico, afetando a confiança dos usuários, aumentando o custo para instituições financeiras e exigindo respostas regulatórias urgentes.

‘Fintechzação’ em massa

Se antes o crime era associado à “saidinha de banco” física, hoje ele ocorre na palma da mão. O Pix trouxe praticidade, mas também se tornou o método preferido de criminosos para extorquir valores de vítimas em sequestros relâmpagos, assaltos e golpes virtuais. A promessa de conveniência acabou expondo uma vulnerabilidade: a velocidade das transações tem se tornado inimiga da segurança. O sistema que democratizou pagamentos instantâneos também criou um ambiente em que fraudes se espalham com a mesma rapidez.

Com o entusiasmo pela inovação, deixamos escapar um detalhe crucial: nem toda solução resolve problemas de forma definitiva, algumas apenas os transformam em novas dores de cabeça.

Renan Basso/MB Labs
Renan Basso/MB Labs | Imagem: divulgação

O outro fenômeno é a proliferação das fintechs. Segundo levantamento da A&S Partners, empresa especializada na estruturação de bancos digitais, o número de fintechs que operam no Brasil disparou 77% desde 2020, indo de 1.158 empresas para 2.048 em 2025. O estudo ainda projeta um crescimento de 50% no setor para os próximos dois anos, indo para cerca de três mil fintechs em 2027.

Em um país historicamente dominado por grandes bancos, a ascensão das startups financeiras surgiu como um sopro de modernidade e concorrência saudável. No entanto, a corrida por clientes nem sempre foi acompanhada do mesmo ritmo em maturidade regulatória, governança sólida ou sistemas antifraude eficazes. O resultado foi um cenário de consumidores vulneráveis, confiança abalada e um mercado que começa a questionar se o crescimento não ocorreu rápido demais, sem a infraestrutura adequada.

Casos recentes, como os escândalos que envolveram fintechs supostamente ligadas ao crime organizado de São Paulo, aceleraram a reação do Governo Federal, que oficializou a equiparação das fintechs aos bancos, medida que promete reforçar a fiscalização e endurecer o combate a ilícitos.

Paradoxo da inovação

Não se trata de depreciar o Pix ou as fintechs. Ambas as inovações trouxeram ganhos inegáveis: inclusão financeira, redução de custos de transações e acesso a serviços antes restritos a poucos. O problema está na ausência de planejamento para os efeitos colaterais. Reguladores e instituições parecem ter corrido atrás do prejuízo, criando camadas de segurança apenas depois que os problemas se tornaram impossíveis de ignorar.

A questão central é equilibrar inovação com segurança. Isso passa por garantir que as fintechs tenham padrões mínimos de compliance e segurança comparáveis aos grandes bancos, preparar usuários para identificar golpes e agir de forma preventiva e ter a tecnologia a favor da proteção. Ou seja, Inteligência Artificial (IA), biometria comportamental e análise preditiva precisam ser mais do que buzzwords; devem ser integradas ao dia a dia das operações financeiras.

O Pix e a ‘fintechzação’ trouxeram progresso inegável. Mas inovação sem precaução é terreno fértil para crise. O mercado financeiro brasileiro vive uma encruzilhada. O que nasceu como solução para democratizar e simplificar pagamentos e serviços bancários pode corroer a credibilidade do sistema se não for tratado com seriedade. Inovação sem segurança é um castelo de areia: impressiona de longe, mas não resiste ao primeiro impacto da maré.

*Co-fundador e diretor de negócios da MB Labs