Imagem: gerada por inteligência artificial (IA) via ChatGPT | DALL·E.
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A publicação, em 3/11, da Resolução CMN nº 5.261 e da Resolução BCB nº 518 marca um avanço relevante no aperfeiçoamento do arcabouço regulatório para Instituições de Pagamento (IPs). O Banco Central (BC) reforça, de forma inequívoca, que modelos operacionais que fragilizam rastreabilidade, governança e segregação individualizada de recursos não têm espaço no sistema financeiro brasileiro.

Nos últimos anos, alguns agentes do mercado difundiram a narrativa de blindagem ou opacidade operacional, frequentemente sustentada por estruturas de “contas bolsão“. Nelas, múltiplos usuários eram alocados sob um mesmo titular. Essa arquitetura, apresentada como vantagem competitiva, foi explorada indevidamente em diferentes cenários, incluindo lavagem de dinheiro, ocultação patrimonial vinculada a casos de corrupção e tentativa de frustração de medidas judiciais, como bloqueios do Sisbajud. Ao dificultar a identificação do beneficiário final e o rastreamento dos fluxos, esse modelo ampliou riscos relevantes de uso abusivo do sistema financeiro e comprometeu a integridade do ambiente de pagamentos.

Esse direcionamento não surge agora. O BC vem reforçando, de forma gradual e consistente, a necessidade de individualização e rastreabilidade das contas. Esse movimento ganhou força com a criação do participante indireto do Pix. Depois, avançou com a obrigatoriedade de que participantes do Pix, inclusive indiretos e ainda sem autorização de funcionamento, reportassem o CCS (Cadastro de Clientes do Sistema Financeiro) e demais informes regulatórios. E prossegue agora com as novas normas.

A expectativa é que próximos normativos sobre modelos de Banking as a Service (BaaS) aprofundem esse nível de transparência, consolidando a responsabilidade de todas as instituições que operam no ecossistema de pagamentos.

Sem atalhos regulatórios

A nova norma elimina qualquer ambiguidade sobre o tema. Toda relação deve permitir rastreabilidade granular por usuário e por operação, com identificação do detentor real dos recursos e da finalidade da transação. É uma sinalização inequívoca de que o sistema financeiro não admite atalhos regulatórios nem estruturas que comprometam transparência e supervisão.

Nayara Sales/Mêntore | Imagem: divulgação

Esse movimento está alinhado com a diretriz adotada pelo BC nos últimos anos: promover um ambiente inovador, competitivo e inclusivo. Tudo isso sustentado em controles robustos, governança efetiva e responsabilidade sistêmica. Não se trata de burocratização, mas de preservação da integridade do ecossistema e da confiança dos usuários. Transparência operacional, granularidade de dados e mecanismos auditáveis são pilares estruturais de uma infraestrutura de pagamentos madura.

A adoção definitiva desse padrão de rastreabilidade representa uma etapa importante na evolução do mercado. Instituições que pretendem operar com escala e longevidade precisarão investir em arquitetura adequada, monitoramento transacional, identificação do usuário e segregação precisa das posições financeiras. O futuro do setor pertence às instituições que compreendem que inovação sustentável exige disciplina regulatória, rastreabilidade e responsabilidade institucional.

*Advogada e diretora de Compliance, Regulatório e Privacidade do Mêntore