O avanço de ativos digitais (como criptomoedas), contratos inteligentes e plataformas financeiras embarcadas em experiências de varejo e entretenimento estão redesenhando a forma como o brasileiro lida com o dinheiro. “A inovação não vai apenas melhorar a experiência do consumidor — ela vai criar negócios que antes não existiam”.
A afirmação é de Paulo Portinho, gerente de Educação e Inclusão Financeira da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Ele mais três especialistas participaram de painel durante o “Fórum Bancos & Banking”, evento realizado nesta quarta-feira (21/5) pela empresa de eventos Cantarino Brasileiro em parceria com a Acrefi, associação que representa principalmente financeiras.
O avanço técnico, porém, não garante inclusão. “O que mais me empolga é a velocidade da inovação. Mas o que mais me assusta é que parte da população vai ficar para trás”, contrapôs Talita Bartolassi, diretora da ALF Entretenimento, empresa de apostas regulada.
Ela citou o caso de idosos que deixaram de acompanhar jogos do próprio time por falta de acesso aos streamings. “No setor financeiro é parecido: para usar cripto ou apostar digitalmente, é preciso smartphone, internet rápida, letramento digital. Isso ainda é privilégio.”
Talita defendeu ações de educação financeira e digital desde cedo. “Falta base. A educação precisa ser inclusiva — e isso começa nas escolas.
Contratos inteligentes
Para Paulo, a maior transformação virá da tokenização e dos contratos inteligentes. “Você pode fazer um contrato de financiamento que executa sozinho, sem risco de inadimplência, com contabilidade perfeita. Isso reduz custo e aumenta o acesso”, disse. E citou aplicações possíveis como contratos de divisão de bens em casamento e fundos imobiliários descentralizados, operando fora do modelo tradicional, com maior eficiência e menor custo.
Ele mencionou também o uso do Drex, a moeda digital do Banco Central, como ferramenta de controle sobre recursos públicos, como o Bolsa Família. “Com o Drex, o dinheiro pode ser carimbado para só ser usado em itens autorizados. Ele não é fungível. Isso pode reduzir muito o risco de desvio e lavagem de dinheiro”.
Para Paulo, o Brasil tem hoje uma das infraestruturas financeiras mais eficientes do mundo. “Pra melhorar o Pix, só se ele pagar antes do envio”, brincou. O desafio agora, disse, é “não atrapalhar”. “Já temos smart contracts, blockchain, Drex a caminho. Precisamos de marcos legais que deem segurança sem engessar. E o Congresso precisa ser transparente sobre os motivos quando recusar propostas.”
Avanços
Ele criticou o fato de pautas como a educação financeira terem sido barradas no passado por “questões ideológicas”. “Havia medo de que ensinar a investir fosse doutrinar. Hoje isso mudou, mas ainda falta clareza no debate regulatório.”
O avanço da tecnologia financeira permite que qualquer empresa — varejo, telecom, entretenimento — ofereça serviços antes exclusivos dos bancos. “Hoje, um estudante pode comprar 10 dólares por mês legalmente, sem banco, numa carteira digital. Isso era impensável 20 anos atrás”, observou Ricardo Chisman, presidente da Matera, empresa que fornece infraestrutura tecnológica para pagamentos e serviços financeiros.
Ele destacou que a função bancária está cada vez mais distribuída. “Bancos continuam relevantes, mas terão que dividir espaço com plataformas especializadas e muito mais ágeis.”
Para Talita, a consequência é uma reinvenção obrigatória. “Os bancos tradicionais estão correndo atrás todos os dias. Aparece um novo player a todo momento.”