Fraudes, golpes, segurança digital | Imagem: Adobe Stock
Fraudes, golpes, segurança digital | Imagem: Adobe Stock

Os golpes com Pix no Brasil estão cada vez mais profissionais, estruturados e sofisticados. Os criminosos vêm utilizando mais contas PJ (de empresas) e se valem de intermediários (como gateways e hubs de pagamento) para dificultar o rastreamento e a devolução do dinheiro. A constatação está na terceira edição do estudo “Golpes com Pix”, divulgado nesta semana pela Silverguard, plataforma de inteligência antifraude contra golpes e “contas laranjas”.

De acordo com dados da plataforma SOS Golpe, criada pela startup, 65% dos golpes via Pix têm como destino contas de empresas. No levantamento de 2024, elas representam 42%. A imensa maioria das contas (91%) é de companhias limitadas (Ltdas). O restante se divide entre MEIs (6,6%), SAs (1,7%) e outras naturezas (0,8%).

“Os golpes digitais deixaram de ser práticas amadoras. O que vemos hoje é uma indústria criminosa altamente estruturada, que movimenta bilhões, aluga contas PJ, compra anúncios em redes sociais e funciona como uma empresa paralela ao mercado formal. Estamos diante de um crime organizado digital que cresce em escala e sofisticação”, afirmou Marcia Netto, CEO da Silverguard e coordenadora da pesquisa, em nota.

A tendência da profissionalização do crime já vinha sendo apontada pelos estudos da empresa. Agora, o que chama atenção é o modus operandi dos golpistas e o impacto disso no Mecanismo Especial de Devolução (MED).

Intermediários de pagamento

Conforme dados do Banco Central (BC) obtidos pela Silverguard por meio da Lei de Acesso à Informação, a taxa de devolução total dos MEDs aceitos por fraude está em queda: em junho de 2023, era de 9,5%, passou a 8,5% um ano depois e atingiu 7,9% em junho de 2025. A pesquisa estima que o volume de infrações abertas deva ultrapassar R$ 7 bilhões em 2025. No entanto, apenas 6,8% dos valores devem ser efetivamente devolvidos.

Estudo “Golpes com Pix”/Silverguard | Imagem: print de tela

Na visão de Marcia, a queda nas devoluções do MED está ligada a uma combinação de fatores, entre eles, a “migração massiva” dos golpes para contas PJ. E no pano de fundo desse movimento, os intermediários de pagamento têm sido uma peça fundamental para a atuação dos golpistas. Na prática, quando a vítima faz o Pix, o dinheiro passa primeiro por esse intermediário, que depois repassa o valor ao verdadeiro recebedor. No comprovante da transação, porém, aparece apenas o nome da empresa intermediária, e não o do golpista.

Esse modelo, comum em plataformas legítimas, acabou se tornando uma brecha explorada por quadrilhas. Um golpista pode, por exemplo, criar uma loja falsa em um marketplace, ou abrir uma conta em uma plataforma de infoprodutos, e usar o sistema de pagamento da empresa para receber o dinheiro de vítimas — sempre “escondido” atrás da marca do intermediário.

“Para resolver o problema na origem, segundo análise da Silverguard, é necessário criar um terceiro nível no arranjo do Pix, como já ocorre nos boletos. Isso permitiria que o ecossistema tivesse maior visibilidade sobre o cliente por trás do intermediário de pagamento”, defende o estudo. “Sabemos que essa é uma mudança tecnológica profunda e de longo prazo, mas, sem esse ajuste, a efetividade do MED tende a cair, mesmo com o MED 2.0 – já que a instituição de pagamento recebedora da primeira transação continua sendo a responsável pela devolução dos demais níveis.”

Big techs

Ainda conforme o estudo, a perda média em golpes com Pix neste ano é de R$ 2.540, 21% maior em relação a 2024. As empresas registraram prejuízo médio de R$ 5.200, o dobro das pessoas físicas. Nas classes A/B, as perdas médias chegam a R$ 10.500, enquanto nas classes D/E ficam em R$ 1.500. Vítimas com 60 anos ou mais perdem, em média, cinco vezes mais que os jovens.

Os golpes com Pix encontram nas big techs sua porta de entrada. De acordo com a pesquisa, 64% dos casos começam em plataformas da MetaWhatsApp (29,6%), Instagram (21,4%) e Facebook (13,1%). Já o Telegram responde por 11,8% das ocorrências, um crescimento de 61% em relação a 2024.

“O cenário fica ainda mais perigoso com o uso crescente de Inteligência Artificial, especialmente deepfakes, que tornam as histórias mais convincentes”, disse Marcia. Para ela, a nova interpretação do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o artigo 19 do Marco Civil pode ser um divisor de águas. “Ao permitir a responsabilização de plataformas a partir de uma notificação extrajudicial, abre-se caminho para dividir de forma mais justa o peso entre bancos, fintechs e big techs.”