Por Thiago Zaninotti*
Na nova lógica de distribuição de crédito, os FIDCs estão deixando de ser estruturas periféricas de funding para assumir um papel central como plataformas programáveis de capitalização da economia real. À medida que o endofinance ganha força — com o embedded finance presente nas jornadas produtivas de empresas de logística, marketplaces, varejo omnichannel, serviços recorrentes, saúde, educação, mobilidade urbana, crédito rural e fintechs — os FIDCs passam a operar como motores de liquidez programados e orquestrados por código. São capazes, então, de reagir em tempo real a eventos da operação.
Essa transformação só é possível porque o FIDC evoluiu para o que podemos chamar de runtime financeiro. Trata-se de uma infraestrutura de capital que executa, em tempo real, regras de alocação, liquidação e governança de crédito de forma automatizada e adaptável. Em vez de apenas empacotar ativos, o fundo se torna um componente computacional — configurável por código, alimentado por dados e conectado a múltiplas fontes originadoras. O gestor, por sua vez, deixa de atuar apenas como alocador e passa a ser o arquiteto de uma plataforma de fomento de capital, baseada em eventos, políticas automatizadas e integrações com outros ecossistemas.
Esse movimento é habilitado pelo avanço do paradigma de ‘Banking as a Code‘. Nele, componentes bancários — como contas escrow, liquidação via Pix, motores de cobrança e conectores regulatórios — tornam-se modulares, programáveis e interoperáveis. Nesse contexto, a infratech atua como infraestrutura neutra e preparada para suportar essa composição.
Papel da IA
Com APIs abertas, módulos de liquidação automatizada, contas segregadas e gateways de integração com ambientes bancários, a plataforma permite ao gestor configurar sua lógica operacional sem fricção tecnológica ou dependência de um stack proprietário. A gestão passa a ser composta como um fluxo de software — com componentes financeiros interconectados e agnósticos ao tipo de originador.
É aqui que a Inteligência Artificial transforma completamente o jogo. Com o runtime e o Banking as a Code estabelecidos, a flexibilidade para programar fluxos financeiros em contextos de embedded finance atinge uma nova dimensão: customização inteligente e redução drástica de custos de transação. Por meio de integrações que permitem extensões via API — por exemplo, RAG (Retrieval-Augmented Generation) e MCPs (Model Context Protocols) — os LLMs se tornam catalisadores naturais de uma nova geração de fintechs e plataformas de endofinance.
O papel da IA vai além da decisão de crédito: ela se estende por toda a jornada. Vai da qualificação do originador ao onboarding, da análise de risco à gestão dinâmica da cobrança, renegociação personalizada e recálculo da liquidez.
Os MCPs funcionam como pontes inteligentes entre modelos de linguagem e APIs de Banking as a Service (BaaS). Com isso, permitem que cada FIDC desenvolva sua própria “personalidade” operacional. A tomada de decisões sobre risco, inadimplência, liquidez e alocação passa a ser com base em dados dinâmicos, aprendizado contínuo e contexto específico de cada originador. O resultado? Fluxos financeiros que se adaptam automaticamente aos padrões de cada negócio. Dessa forma, otimiza custos e maximiza eficiência.
Imagine um marketplace que conecta diretamente seu fluxo de vendas a um FIDC programado para entender sazonalidades, perfis de compradores e ciclos de pagamento específicos daquele setor. Ou uma fintech de crédito rural que ajusta automaticamente suas políticas com base em dados meteorológicos, preços de commodities e histórico de safras. Essa é a nova fronteira do embedded finance: a IA não apenas processa dados, mas orquestra inteligentemente todo o ecossistema financeiro.
Plataforma programável de crédito
Essa transformação acontece em paralelo a um movimento estrutural do mercado de capitais. De acordo com dados da Uqbar, o volume de gestão sob os FIDCs triplicou nos últimos cinco anos e atingiu R$ 630 bilhões em 2025. Houve crescimento expressivo de estruturas pulverizadas, multicedentes e conectadas a ecossistemas digitais. O fundo, antes limitado a grandes estruturas institucionais, passa a ocupar o centro das estratégias distribuídas de crédito. Assim, promove desconcentração, capilaridade e alinhamento com a lógica da nova economia produtiva.
Ao integrar essas capacidades — infraestrutura modular, runtime financeiro e decisões orientadas por IA — o FIDC se consolida como a principal plataforma programável de crédito da nova economia. Mais do que uma transformação tecnológica, esse modelo cria um ambiente em que cada participante do ecossistema financeiro pode construir soluções verdadeiramente customizadas, com custos marginais decrescentes e capacidade de escala exponencial.
A Celcoin é o backbone dessa nova geração de FIDCs inteligentes. Oferece a infraestrutura modular, neutra e interoperável para que gestores construam, em código, a lógica do crédito embutido nas relações produtivas do País. O futuro do crédito já é programável — e ele será gerido por um runtime financeiro.
*Diretor de Produtos (CPO) e de Tecnologia (CTO) da Celcoin