Apenas 8% dos valores transferidos via Pix e contestados como golpes e fraudes, em média, voltam para a vítima. A conclusão é de um levantamento de dados do Mecanismo Especial de Devolução (MED), do Banco Central (BC), feito a pedido do Finsiders Brasil. A ferramenta veio para facilitar a devolução do dinheiro às vítimas, mas limitações no sistema atual a impedem de ter uma taxa de sucesso satisfatória. Mas vem aí o “Med 2.0”.
Em junho, dos R$ 2,1 trilhões movimentados via Pix no Brasil, R$ 452 milhões foram sinalizados ao MED como transferências fruto de fraudes ou golpes. Ou seja, o Pix nasceu para facilitar a inclusão bancária e revolucionar o mercado de pagamentos. Mas se tornou também um aliado de estelionatários que se valem da instantaneidade do depósito.
Cinco camadas
Apenas a solicitação via MED não garante o retorno do dinheiro à vítima. A transação financeira passa por uma análise pelos bancos envolvidos e, só se for identificada como fraudulenta, segue para a etapa da devolução do dinheiro à conta original. Esse passo, no entanto, depende de ainda ter dinheiro na conta que recebeu a transferência, o que nem sempre acontece, já que os criminosos acabam transferindo para outras contas assim que executam o golpe.
No desenho atual, o MED para na chamada “primeira camada” de transferência. Ou seja, se depois do golpe, o estelionatário distribuir o dinheiro para uma terceira conta, o valor não é mais localizado.
Em junho, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) iniciou conversas com o BC para apresentar melhorias para o MED. “Estamos discutindo [com o BC] qual é o melhor modelo para conseguir ampliar esse rastreio”, diz Walter Faria, diretor-adjunto de Serviços da Febraban. “A ideia é que, no fim do ano que vem, possamos colocar em produção o ‘MED 2.0’.”
O BC disse, em nota, que está aprimorando o MED para “rastrear os recursos após a conta originalmente usada para cometer a fraude”, para alcançar ainda mais camadas e conseguir devolver o dinheiro à vítima com maior efetividade. O objetivo é conseguir alcançar até a quinta camada das transações.
Além disso, Walter adianta ao Finsiders Brasil que há estudos que se debruçam sobre a possibilidade de bloqueio de todas as contas do titular que recebeu a transferência inicialmente, independentemente do banco.
Tempo de resposta
Outro ponto discutido é a diminuição do tempo de resposta dos bancos para bloquear os recursos. Em nota, o BC disse que estabeleceu, no início deste ano, um Acordo de Nível de Serviço em que os bancos devem abrir a solicitação — bloqueando, assim, a saída de recursos da conta suspeita durante a análise do caso —em até 30 minutos após a reclamação do cliente.
“Hoje, pagamentos em tempo real [como o Pix] oferecem a perspectiva tentadora de acesso imediato a fundos roubados. Tudo o que o golpista precisa fazer é engenharia social (ou seja, enganar) um consumidor para enviar um pagamento para uma conta laranja que ele controla. Depois, é só transferir rapidamente o dinheiro para um lugar não rastreável, como converter para criptomoedas”, escreveu no relatório “Scamscope” Cleber Martins, diretor de Pagamentos Inteligentes & Soluções de Risco na ACI Worldwide.
O relatório, que analisa o cenário das perdas monetárias para golpistas em diferentes países com métodos de transferência financeira em tempo real, como o Pix, também estima que o valor das perdas com golpes do tipo aumentem em 21% até 2027.
A maioria das vítimas brasileiras perdeu dinheiro ao tentar pagar por produtos e/ou serviços que não existiam. Veja:
- 27% das vítimas transferiram o dinheiro como pagamento antecipado por um produto ou serviço;
- 20% tentavam comprar um produto;
- 17% tentavam investir em um produto ou empresa;
- 10% tentavam pagar uma fatura ou saldo pendente de produto ou serviço;
- 7% fizeram transferência para alguém que fingia estar em um relacionamento amoroso;
- 7% transferiram dinheiro para alguém que alegava ser outra pessoa ou organização confiável;
- 13% nenhuma das opções acima.
*Para o Finsiders Brasil