
A aprovação do projeto de lei que aumenta a tributação de fintechs na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado acendeu um sinal de alerta no setor. Entidades representativas e especialistas criticaram a proposta que eleva a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) de forma escalonada, de 2026 a 2028. Na avaliação dos participantes, a medida representa uma ameaça aos avanços da inclusão financeira no Brasil. E pode inviabilizar modelos de negócio que já operam com margens reduzidas.
O PL 5.473/2025, de autoria do senador Renan Calheiros (MDB-AL), prevê a alta do imposto de 9% para 12% em 2026, chegando a 15% em 2028, no caso das Instituições de Pagamento, (como operam muitas fintechs), administradoras de mercado de balcão e bolsas de valores. Já as sociedades de capitalização e instituições de crédito, financiamento e investimento terão a alíquota elevada de 15% para 17,5% em 2026, alcançando 20% em 2028.
O projeto ainda pode ir à votação no plenário do Senado se for apresentado recurso. Caso contrário, o texto segue para análise na Câmara dos Deputados.
Pressão
Para Marcelo Perez, sócio da área tributária do BZCP Advogados, o aumento da CSLL tende a exercer pressão ainda maior sobre margens que já são apertadas. “Diferentemente das instituições financeiras tradicionais, as fintechs têm natureza predominantemente tecnológica, o que implica ciclos longos de investimento e custos significativos de conformidade regulatória”, afirmou.
O advogado avalia que a alta da alíquota poderá gerar “desincentivo ao investimento em inovações tecnológicas que trazem benefícios a todo o mercado bancário e financeiro brasileiro”.
Para a Zetta, que representa alguns dos maiores bancos digitais e fintechs do País, a alta da CSLL é um “retrocesso”. Na visão da entidade, a majoração do imposto “ameaça os avanços na inclusão financeira”. Além disso, vai de encontro à agenda de aumento da competição no setor financeiro. “O aumento na tributação das fintechs atingirá os clientes que mais precisam e que hoje se beneficiam de serviços de qualidade e gratuitos”, argumentou, em nota.
A associação defendeu que, em vez da elevação de alíquotas nominais, seja adotada uma alíquota efetiva mínima para todos, em busca de maior isonomia tributária. Na avaliação da entidade, embora haja previsão de escalonamento gradual da CSLL, a elevação “penaliza quem já arca com alíquota efetiva mais elevada”. Ainda na nota, a Zetta reforçou que não é contra a tributação, mas defende “isonomia, previsibilidade e um ambiente regulatório estável”. Esse cenário, de acordo com a entidade, favorece o acesso da população a “produtos financeiros simples e digitais”.
Impacto ‘desproporcional’
Para a Associação Brasileira de Fintechs (ABFintechs), embora o texto do PL apresente um aumento aparentemente linear para diferentes tipos de instituições financeiras, o impacto recai de forma desproporcional sobre as fintechs. Segundo a entidade, os players mais impactados pela medida são aqueles com licenças como Instituição de Pagamento (IP), Sociedade de Crédito Direto (SCD), Sociedade de Empréstimo entre Pessoas (SEP) e Sociedade de Crédito Financiamento e Investimento (SCFI ou financeira).
Na visão da ABFintechs, o setor já enfrenta um contexto de forte pressão regulatória e operacional. Esse cenário inclui aumento recente nos requerimentos de capital mínimo, intensificação das obrigações de reporte e vigilância e um ambiente macroeconômico marcado por juros elevados. “Essas cargas adicionais, somadas a novos aumentos tributários, intensificam o estrangulamento de um segmento essencial para a modernização do sistema financeiro brasileiro”, avaliou a entidade, em nota.
A associação disse, ainda, que qualquer majoração tributária tende a gerar “impactos desproporcionais”. Pode, assim, “inviabilizar produtos acessíveis, reduzir alternativas aos consumidores e frear o avanço da inovação”. A ABFintechs ressaltou que pequenas e médias empresas, operando com margens reduzidas, têm capacidade limitada de absorção de custos. “O setor recebe com grande apreensão qualquer medida que eleve a carga tributária sobre serviços financeiros inovadores”, afirmou.
Com o projeto caminhando em direção à Câmara, a ABFintechs reforçou disposição em colaborar tecnicamente com o debate legislativo. A entidade defendeu “ajustes que preservem a proporcionalidade entre fintechs e bancos tradicionais. Isso “respeitando as diferenças estruturais entre modelos de negócio, exposição a risco e impacto sistêmico”.
Isonomia
Para além do Congresso, nas últimas semanas, a discussão sobre isonomia tributária de bancos e fintechs se mantém acalorada. Os “embates” se dão principalmente em eventos do setor e redes sociais. Há argumentos contra e a favor de ambos os lados.
No último dia 25/11, em post no seu LinkedIn, CEO do Nubank David Vélez escreveu que a instituição, nos seus 12 anos, deu “mais contribuição fiscal do que qualquer grande banco”. Nos últimos meses, Roberto Campos Neto, ex-presidente do BC e hoje vice-chairman e chefe global de Políticas Públicas do Nubank, também vem defendendo as fintechs publicamente. Em outubro, por exemplo, ele disse que “nenhuma fintech quer tratamento privilegiado“.
Também em outubro, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) divulgou um documento rebatendo o argumento de que os bancos digitais pagariam mais impostos de que as instituições tradicionais, conforme reportagem do jornal Folha de S. Paulo. A entidade defendeu que a alíquota efetiva não reflete os impostos efetivamente recolhidos. De acordo com a análise da Febraban, o fato de as fintechs terem uma margem bruta maior permite mais deduções. Em um evento no dia 13/11, o presidente da entidade, Isaac Sidney, cobrou tratamento igual para todos os agentes que oferecem os mesmos riscos ao sistema financeiro.
O Finsiders Brasil procurou a Febraban para comentar a aprovação do PL 5.473/2025 na CAE do Senado e aguarda um retorno.