Stephan Krajcer*
Estamos vivenciando a explosão das fintechs nessa última década, trazendo uma série de inovações não só tecnológicas, mas também de modelo de negócios e público-alvo. Já pararam para pensar por que o sistema financeiro tradicional, com toda sua geração de riqueza, abrangência, robustez e tecnologia tem ficado para trás nessa corrida de inovação?
Resumindo em três palavras – aversão a risco.
Historicamente, os bancos evoluíram baseados na geração de valor através do gerenciamento de riscos. Por outro lado, inovação tem em seu elemento fundamental o risco do novo. Foi por isso que encontrou no Venture Capital (VC – capital de risco) um de seus parceiros ideais.
Mas e se, hoje, o maior risco para sua instituição financeira seja não inovar? Ou seja, o maior risco é não tomar riscos. Como fica?
Bom, fica complicado pois, ao longo do tempo, os bancos e demais instituições financeiras se desenvolveram e se consolidaram no paradigma anterior de aversão a risco, montando sua estratégia, estrutura e incentivos de forma a prosperar nesse contexto.
Obviamente há vários outros elementos que explicam por quê instituições financeiras tem amarras para inovar, tais como cultura, perfil de seu capital, regulação/risco sistêmico dentre outros. E há muitos outros fatores pelos quais fintechs e VCs têm perfil mais apropriado para inovar.
Neste artigo, vamos começar a analisar o tripé de elementos que na prática travam a inovação em instituições incumbentes, começando pela estratégia. No próximo, falaremos dos outros dois: estrutura e incentivos.
A estratégia:
O antigo paradigma do mercado financeiro era o do domínio pela distribuição. Uma instituição teria sucesso na medida em que dominasse o ciclo de distribuição de seus produtos para seu público-alvo. No segmento de varejo dos anos 1990, por exemplo, isso se refletia em número de agências e sua capacidade de trazer novos correntistas. As instituições fortes de hoje são as que melhor aproveitaram a consolidação do mercado nessa época, reforçando sua presença de distribuição.
Dessa forma, até meados da década atual, a estratégia era de dominar a distribuição e “empurrar” a prateleira de produtos para os clientes. O foco estava centrado no produto. Ou seja, faça um bom produto que a rede garante a distribuição.
Na esteira desse paradigma, foram criadas estruturas internas e os incentivos para a correta execução da estratégia. Que, por sinal, foi muito bem executada pelos principais grupos financeiros nas últimas décadas.
Porém, com todos os avanços tecnológicos atuais, a distribuição perdeu relevância como barreira de entrada. A internet e o mobile foram incorporados ao dia a dia da população, os investimentos para construir uma rede de agências do zero perdeu relevância e portanto, a distribuição tradicional perdeu força. Logo, se o paradigma anterior era “foca no produto pois garantimos a distribuição” agora que a barreira caiu, está mais complicado.
Outro ponto importante que esta mudança de paradigma traz é facilitar o acesso de novos grupos de clientes, quer seja por que a distribuição física não chegava até estes grupos, quer seja por que com uma estrutura de custos mais enxuta e melhor conhecimento do cliente, esses grupos começam a se tornar atrativos.
Em ambos os casos, a estratégia tem que mudar para focar no cliente – e para isso é necessário ter diferencial na oferta, já que esse cliente tem acesso a várias outras soluções.
Mudar a estratégia é apenas o começo da jornada, pois ela é executada pela estrutura montada especificamente a ela e sustentada pelos incentivos dados às pessoas. Ou seja, ao mudar a estratégia, será preciso também mudar a estrutura e seus incentivos. E é no terreno das estruturas e incentivos que, na prática, ocorrem as batalhas mais sangrentas contra a inovação.
No próximo artigo, abordaremos esses últimos dois tópicos.
*Stephan Krajcer é o CEO e fundador da Cuore Platform e criador da Katapult. Ele tem 20 anos de experiência no mercado financeiro tenho sido diretor de administração de fundos e investimentos offshore. Stephan é engenheiro elétrico formado pela PUC-Rio com MBA pela UC Berkeley, com grande experiência internacional, tendo vivido (além de Brasil) em São Francisco, Israel, Cidade do México e Toronto.