Diego Gonçalves Coelho*
Diante da crise do coronavírus e com a latente necessidade de crédito pelas empresas e população, algumas fintechs (Sociedades de Empréstimo entre Pessoas – SEP e Sociedades de Crédito Direto – SCD) assumiram papel ainda mais relevante para a sustentação do mercado, e ganharam destaque como fonte para empréstimo mais rápido e, muitas vezes, como a única alternativa a determinado público.
Nesse sentido, as fintechs de crédito que precisam de recursos para financiar suas atividades estão encontrando na securitização de recebíveis uma ótima opção. Mais especificamente, há duas maneiras de captação que podem ser bastante interessantes: por meio da cessão de créditos aos Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDCs) ou por meio das companhias securitizadoras de créditos financeiros, que emitem determinada série de debêntures, denominadas pelo mercado de Debêntures Financeiras (reguladas pela Resolução 2.686 do Banco Central).
Vale explicar que a SEP é enquadrada pelo BC como instituição financeira voltada à intermediação de empréstimos em operações que ocorrem diretamente entre credor e devedor. A SCD, por sua vez, é enquadrada como instituição financeira voltada à concessão de empréstimos e financiamentos e na aquisição de direitos creditórios, exclusivamente com capital próprio, por meio de plataforma eletrônica.
Como diversas SCDs foram constituídas como startups e, portando, com baixo capital social inicial, a limitação de operarem exclusivamente com capital próprio traz grande dificuldade à concessão de crédito em larga escala. Por isso, estruturas como os FIDCs e as Debêntures Financeiras conseguem atender bem as necessidades das fintechs, de acordo com o que é permitido pela regulamentação atual.
Os FIDCs já se consolidaram como principal alternativa de securitização de recebíveis às fintechs de crédito, via aquisição da carteira de recebíveis da SCD e, com isso, liberando novamente capital próprio da SCD à concessão de novos créditos ou, figurando como credores das operações realizadas pela SEP. Na prática, os fundos compram os direitos creditórios da fintech, enquanto remuneram os investidores.
Apesar dos efeitos da pandemia, o mercado dos FIDCs continua extremamente ativo. Na maioria dos FIDCs as perdas geradas por eventual inadimplência da carteira acabam absorvidas primeiro pelas cotas subordinadas, que costumam ficar com os originadores ou cedentes, antes de atingirem as cotas seniores.
No primeiro semestre, foram realizadas 120 novas operações de FIDCs, de acordo com dados da Anbima. Não é à toa que o instrumento foi escolhido pelo BNDES como forma de dar fôlego para as pequenas e médias empresas. O banco de fomento selecionará até 10 FIDCs, dentre os 12 melhores colocados já divulgados, para investir um total de até R$ 4 bilhões no segundo semestre. Os FIDCs, por sua vez, terão a missão de garantir que os recursos sejam destinados a financiar as pequenas e médias empresas, sendo que as fintechs de crédito poderão figurar como um dos principais originadores dessas operações.
As debêntures financeiras também podem atender a função do FIDC, mediante aquisição de créditos financeiros por companhia securitizadora de créditos financeiros. Tal instrumento, além de mais barato quando comparado ao FIDC, uma vez que não há obrigatoriedade de contratação de administrador fiduciário, gestor, agência de classificação de risco, dentre outros prestadores, pode vincular determinada carteira de recebíveis ao pagamento de única série de debêntures financeiras, diferente do que ocorre no FIDC.
Ainda podemos destacar como principais vantagens das debêntures financeiras: regulação mais simples; utilização de um veículo (securitizadora) por cliente, ou por operação, o que acaba mitigando o risco de contaminação dos ativos em caso de discussões judiciais; e grande autonomia para que o agente de cobrança (servicer) negocie valores e movimente contas bancárias.
Hoje, com a taxa básica de juros no menor patamar, investir em FIDCs e em debêntures financeiras pode entregar retornos bastante atrativos aos investidores, com risco de crédito pulverizado e, geralmente, com estrutura de subordinação, via cotas ou debêntures subordinadas, que acomodem a inadimplência histórica da carteira.
As debêntures financeiras ainda não se popularizaram tanto quanto os FIDCs, mas o atual momento de mercado é promissor e tende a potencializar esse produto, que deve passar a fazer parte da carteira dos investidores. A tendência é que tais alternativas de investimentos, ainda restritas a investidores qualificados, ganhem espaço. Do outro lado, as fintechs de crédito caminham para ampliar o seu acesso a recursos, via securitização de recebíveis. A expectativa é de um mercado cada vez mais ativo, com benefícios para todos.
Diego Gonçalves Coelho é sócio do Coelho Advogados