Gabriel Ponzi*
A pandemia apertou o acelerador da transformação digital, e a disputa por profissionais de tecnologia aumentou drasticamente. Até porque, agora, com a maioria trabalhando remotamente, a concorrência é nacional. Ou até mesmo internacional, já que vários brasileiros estão conseguindo empregos em empresas estrangeiras e estão ganhando em dólar ou outras moedas mais valorizadas que o real. E além da dificuldade de encontrar, o maior desafio nesse momento é atrair os talentos, ou seja, atraí-los para que se interessem em conversar com os recrutadores, podendo mostrar aos candidatos potenciais que aquela empresa é o melhor lugar para eles nesse momento.
Algo parecido aconteceu com a área de vendas. Hoje em dia, além de identificar quem são os potenciais clientes, é necessário também mostrar que tem a melhor solução possível para o desafio atual do comprador. Para resolver esse problema, os times de vendas começaram a estruturar funis de aquisição de clientes com objetivo de ter previsibilidade de resultados, ou como costumam chamar, ter receita previsível.
O método do funil de vendas é um conceito utilizado pela equipe comercial para visualizar toda a jornada do cliente, desde o primeiro contato até a compra. Ter um funil com etapas claras e bem estruturadas, com métricas monitoradas constantemente, permite que as empresas otimizem os processos em cada uma das etapas e aumentem as suas taxas de conversão, o que resulta em mais vendas previsíveis.
Voltando então ao mundo do RH, com tanta concorrência e um grande número de vagas abertas, como garantir um recrutamento previsível? Assim como ocorre nas vendas, o recrutamento possui diversas etapas que vão desde o primeiro contato com o candidato até a sua contratação. Ao incorporar uma mentalidade de vendas, e pensar no recrutamento como um funil, as empresas podem ter mais clareza dos gargalos e das taxas de conversão do processo, garantindo previsibilidade nas contratações. Analisando mais de perto o processo de recrutamento, no topo do funil temos a fase de atração. Há muito tempo essa etapa deixou de significar o anúncio de uma vaga e a simples triagem de currículos que chegam na caixa de entrada.
Hoje, os melhores talentos do mercado são abordados diariamente por recrutadores. Por isso, além de encontrá-los, torna-se necessário convencê-los a participar do processo seletivo e “comprar” a visão, a cultura e os desafios da empresa. Nesse aspecto é possível visualizar uma das principais semelhanças entre recrutamento e vendas: para ser um bom recrutador é necessário saber vender a oportunidade.
Para aumentar o fluxo no topo do funil, fator necessário para um recrutamento de alta volumetria, algumas outras técnicas de vendas também podem ser utilizadas – como copywriting (arte de escrever textos persuasivos) e marketing de performance (arte de fazer anúncios efetivos nas mídias sociais).
Testar diferentes “copies” (textos persuasivos), e fazer uso de gatilhos mentais, podem aumentar a taxa de resposta das abordagens do recrutador, que muitas vezes é ignorada em uma caixa de mensagens cheia delas. Além disso, utilizar anúncios pagos leva o processo seletivo a alcançar mais pessoas, na medida em que a oportunidade literalmente surge na frente dos talentos.
No meio do funil ficam os talentos que já estão inscritos no processo seletivo, e é onde as etapas de qualificação acontecem. Considerando um grande volume de vagas abertas, é provável que essas etapas possuam um alto fluxo de candidatos. Diante disso, algumas empresas não conseguem fazer uma boa gestão das candidaturas e acabam tendo que lidar com desistências no meio do caminho. Por isso nessa etapa é preciso observar dois aspectos.
O primeiro é relativo às taxas de desistência: se muitos candidatos desistem durante o processo, é necessário avaliar o motivo, porque isso pode indicar que a experiência não está sendo positiva. Alguns dos motivos comuns podem ser a complexidade das etapas, a duração do processo, a dificuldade de comunicação com a empresa. Identificar esses gargalos e corrigi-los, vai ajudar a manter os talentos engajados.
O segundo aspecto é a qualificação dos talentos que seguem no processo. As etapas de triagem funcionam para identificar quais talentos têm “fit” (encaixe) com a vaga e estão prontos para desempenhar os desafios propostos. É esperado que nem todos sejam aprovados nessas etapas, mas se as taxas de conversão estiverem muito baixas, pode ser um forte indicador de que a complexidade dos testes está mais alta do que o necessário para ocupar a posição. E isso pode fazer com que bons talentos sejam desperdiçados.
Por fim, na etapa final do funil ficam os candidatos que foram aprovados na qualificação e estão aptos para o exercício da função. Aqui é onde acontecem as “offers” (ofertas de emprego) para esses talentos, fazendo com que eles terminem o funil como colaboradores da empresa.
No mundo ideal, a taxa de conversão de talentos aprovados no processo para os que são contratados seria de 100%. No entanto, existem muitas variáveis que não podem ser controladas, como por exemplo uma contraproposta da empresa atual do profissional. Independente disso, se essa taxa estiver muito baixa pode significar que as offers que estão sendo feitas não estão de acordo com a realidade do mercado ou que a experiência do candidato não foi positiva. Por isso é necessário um processo de investigação, buscando entender as motivações para reduzir as chances de uma recusa.
Em inúmeros aspectos, a área de vendas pode servir como um grande benchmarking para a área de Recursos Humanos. Os times que incorporarem metodologias e processos de vendas, a começar pela adoção do método de funil, vão garantir mais previsibilidade de resultados e um recrutamento muito mais eficiente.
Gabriel Ponzi é executivo de vendas da Intera, hrtech de recrutamento digital membro do Cubo Itaú, maior centro de empreendedorismo tecnológico da América Latina.