Quais serão as empresas que vão representar a próxima geração de fintechs? Bilhões de dólares foram investidos na busca pela resposta a essa pergunta, e, certamente, ainda há muito a construir para um veredicto indiscutível. No entanto, existem alguns padrões e tendências se revelando de forma cada vez mais nítida para aqueles que atuam na fronteira desse mercado.
A primeira geração de fintechs conquistou sucesso com o seguinte “playbook”: “Pegue os produtos bancários tradicionais (cartões de crédito, conta, etc.) e os entregue em uma UX (user experience) excepcional para um público que não teria acesso a eles, ou seria mal atendido pelos canais tradicionais.” A empresa de maior valorização de mercado que executou esse playbook é o Nubank, o banco digital que inspirou diversas outras empresas e segue inspirando a próxima geração. O Nubank é o exemplo mais marcante pelo seu valor de US$ 38,5 bilhões mas existem inúmeros outros como Stone, PagSeguro, Mercado Pago (para citar somente as empresas de capital aberto).
O sucesso da primeira geração gerou um aumento significativo na bancarização dos brasileiros, impulsionado também pelo pagamento do auxílio emergencial na pandemia via conta digital do Caixa Tem (segundo a Febraban, foram bancarizados ao menos 34 milhões de brasileiros no período), e motivou o Banco Central a seguir na sua agenda de aumento de competitividade, trazendo inovações no nosso mercado que são únicas no mundo dos serviços financeiros, como o Pix e a digitalização de recebíveis.
O sucesso e a contínua abertura do mercado propiciado pela regulação vêm atraindo o interesse de outros setores da economia e gerando o fenômeno da “fintechzação”, que é a oferta de produtos e serviços financeiros por empresas não-tradicionais do setor. Nesse contexto, o Brasil está bem posicionado para ser um “celeiro” de inovações para o mundo, dado que (1) somos um mercado gigantesco, (2) com inúmeros desafios a serem enfrentados e (3) temos um regulador competente com uma agenda pró-mercado (intervindo para abrir espaço para o setor privado, evitando ao máximo ocupar os espaços criados pelas novas regulações).
Varejistas, distribuidores e sistemas de gestão financeira, dentre outras empresas, percebem esse movimento como uma oportunidade para diversificação de serviços e aumento da rentabilidade na própria base de clientes. Nessa tendência, que é chamada de embedded finance (ou “finanças embarcadas”), os produtos financeiros são ofertados nos canais e nas cadeias de valores já constituídos. Nesse contexto, o desafio é inovar no produto financeiro ofertado para que seja percebido como um passo natural da experiência já existente.
Em paralelo, mesmo as próprias fintechs, que conquistaram seu espaço em uma direta oposição aos conglomerados financeiros, precisam entregar uma proposta de valor completa para continuar crescendo de forma competitiva e rentável. Essa oferta inclui contas, cartões de crédito e de débito, meios de pagamentos, investimentos e até softwares de gestão financeira para controle de caixa e planejamento. São produtos que requerem expertises diversas para que o desenvolvimento seja feito inteiramente “in-house”.
Para suprir a demanda de fintechs e de empresas tradicionais que buscam embedded finance, surge a tendência invisível à maior parte dos consumidores: as empresas de infraestrutura. Estamos falando de players com tecnologias cada vez mais sofisticadas que fornecem: (1) o uso de licenças financeiras para distribuição desses produtos, (2) a tecnologia de APIs para que as ofertas se adequem ao contexto do canal para viabilizar seu sucesso e reduzir o atrito ao usuário final, (3) a gestão de risco em escala para assegurar a rentabilidade das operações e (4) a oportunidade de capturar as oportunidades na fronteira da inovação regulatória com acelerado “time-to-market”.
Por exemplo, hoje, é cada vez mais corriqueiro às pequenas e médias empresas o consumo de oferta de contas digitais integradas aos sistemas de gestão financeira, resolvendo antigos problemas de conciliação e gerando aumento de produtividade para todos os envolvidos. As empresas de sistemas de gestão financeira fazem parcerias com infraestruturas que oferecem contas transacionais e integram o produto aos seus sites e aplicativos.
Outro exemplo é a oferta de antecipação de recebíveis de cartões de crédito com a garantia de recebíveis no contexto do planejamento financeiro. No momento em que o diretor ou o gerente financeiro examina as necessidades de caixa do seu negócio, ele consegue fazer a contratação de um produto que libera recursos para ele no curto prazo, viabilizado pelo uso de uma solução de infraestrutura que o ajuda a analisar de forma automática o risco dos recebíveis.
Em resumo, com a tsunami do embedded finance, o vácuo de mercado ocupado por empresas de infraestrutura e o pioneirismo da abertura regulatória a nível internacional, veremos companhias sólidas sendo exportadas do Brasil para todos os países do mundo. O relacionamento com os serviços financeiros será contextual e fragmentado e ocorrerá em diversas cadeias de valores, de forma que as empresas de infraestrutura, junto aos seus clientes, precisarão inovar continuamente, tanto em produtos quanto em serviços. Essa inovação e sua subsequente exportação será a grande marca na próxima geração de fintechs e demandará um playbook essencialmente diferente da primeira edição.
*CEO e Fundador da Destrava Aí