OPINIÃO

Lei de duplicatas escriturais é tão importante quanto a reforma tributária 

Empresas que não se adaptarem estarão mais sujeitas a fraudes, protestos, pagamentos incorretos, entre outros riscos

Empresas e negócios
Empresas e negócios | Imagem: Adobe Stock

As discussões sobre a reforma tributária seguem avançando e as mudanças significativas que a regulamentação trará estão movimentando diversos setores da sociedade civil. Nas áreas fiscais de empresas de todo o País, executivos aguardam com apreensão a simplificação do recolhimento dos tributos. Impactos devem ser notados também ao longo da transição, quando dois modelos tributários estarão em vigor.

É importante ressaltar, no entanto, que essas não são as únicas preocupações dos executivos responsáveis pelo pagamento a fornecedores das empresas brasileiras.

Aprovada em 2018 e perto de ser implementada, a lei de duplicatas escriturais (lei 13.775/2018) irá mudar bastante a forma como as empresas pagam seus fornecedores. A lei tem o objetivo de “destravar” as duplicatas dos fornecedores, dando a eles uma forma mais simples e barata de se financiarem. Na prática, a legislação cria o framework jurídico e habilita a criação da infraestrutura tecnológica que irá proporcionar maior transparência e liquidez para esses títulos.

Contas a pagar

Aprovada no fim de 2024 pelo Banco Central (BC), a convenção com as escrituradoras irá disparar o início da contagem dos prazos previstos na Resolução BCB 339/2023, fazendo com que a infraestrutura de escrituração esteja pronta já em 2025. Assim, os fornecedores poderão começar a escriturar e negociar suas duplicatas, gerando impacto significativo nos processos de contas a pagar de seus clientes.

As duplicatas escriturais são títulos eletrônicos de crédito para formalizar relações comerciais entre credores e devedores. Esses documentos caíram em relativo desuso no Brasil. Isso porque os pagadores geralmente incluem cláusulas nos contratos com seus fornecedores, impedindo a cessão de duplicatas a terceiros. Dessa forma, dificultam o uso desse instrumento como alternativa de financiamento no mercado. Porém, a lei 13.775/2018 torna nulas essas cláusulas, fazendo com que os fornecedores possam, então, negociar livremente suas duplicatas.

Izaias Miguel/V360 | Imagem: Amanda Melo

O objetivo dos pagadores ao impedir a cessão de títulos é evitar riscos de fraudes e trabalho operacional interno, que a cessão de duplicatas de seus fornecedores a terceiros implica. Por isso mesmo, a lei de duplicatas escriturais causa preocupação nas empresas, por conta dos riscos e custos associados. Empresas que não se adaptarem estarão mais sujeitas a fraudes, protestos, pagamentos incorretos, aumento do risco de não conformidade legal e crescimento de custos operacionais.

Riscos e custos

Outro ponto que também gera apreensão está relacionado aos prazos associados. Quando as novas normas estiverem em vigor, além de não poder impedir que os fornecedores registrem e negociem suas duplicatas, as empresas terão um prazo de apenas dez dias para se manifestarem em relação a essas duplicatas.

Com isso, o tempo de reação a registros incorretos de duplicatas escriturais, de boa ou má-fé, será muito baixo. Há de se considerar que grandes empresas tratam volumes significativos de pagamentos mensais. E muitas vezes levam mais de 30 dias apenas para processar e registrar no contas a pagar suas obrigações. Empresas que não conseguirem cumprir este prazo estarão sujeitas a protestos por bancos, FIDCs, factorings e outras instituições que negociarem essas duplicatas junto a seus fornecedores.

Além disso, pagamentos incorretos também poderão gerar protestos e custos. Ao negociar uma duplicata junto ao fornecedor, o financiador automaticamente passa a ser seu novo titular. Assim, informa na escrituradora o novo domicílio bancário onde ocorrerá a liquidação da duplicata. Caso a empresa pague direto ao fornecedor um título que foi negociado, ela pode ser protestada pelo novo titular e obrigada a pagar duas vezes. Por mais que haja posteriormente o ressarcimento pelo fornecedor de boa parte desses pagamentos, a gestão dos protestos e ressarcimentos será um processo complexo de se instaurar.

Entre executivos das áreas financeiras das grandes companhias, a avaliação é de que a lei de duplicatas escriturais é tão importante para as empresas quanto a reforma tributária. Uma das formas mais eficientes para evitar os riscos mencionados e os custos adicionais será utilizar a tecnologia como aliada. Significa, por exemplo, automatizar os processos de gestão, manifestação, liquidação e conciliação de duplicatas. Com isso, as empresas poderão cumprir os prazos com o objetivo de administrar grandes volumes de títulos, sem que haja um aumento de protestos e pagamentos incorretos.

*Co-CEO da fintech V360, ‘spin-off’ do grupo Visagio