“Não tem como separar totalmente o sistema financeiro e o mercado de capitais, até porque o mercado de capitais se tornou “o principal motor” do financiamento da dívida pública e das empresas. Assim, cabe à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) “promover a segurança para todos, evitando um cenário de estresse”. A opinião é do presidente interino da CVM, Otto Lobo.
Otto participou da comemoração de cinco anos do Centro de Estudos de Direito Bancário (CDB) da Faculdade de Direito da USP, na segunda‑feira (25/8) por videoconferência. E cobrou melhorias no regime informacional e na padronização contábil da indústria de fundos, com foco em gestão de liquidez e proteção ao investidor.
“O universo de fundos corresponde a uma parcela muito expressiva do PIB nacional, R$ 9,5 trilhões e já atingiu 77% do PIB brasileiro”, afirmou. O estoque de ativos de crédito no mercado de fundos já superou R$ 2,5 trilhões… representando 21% do PIB brasileiro”, sem considerar FIDCs e FIIs. “É um volume que justifica o aperfeiçoamento normativo, principalmente no sentido de habilitar mecanismos de gerenciamento de liquidez”. Essa dimensão traz interdependências.
Mercado
Otto avaliou que o Brasil vive um momento “particularmente estratégico” para o mercado de capitais e colocou a Proposta de Emenda Constituicional (PEC) 65 no centro do debate regulatório. Ele cobrou melhorias no regime informacional e na padronização contábil da indústria de fundos, com foco em gestão de liquidez e proteção ao investidor.
A PEC 65 visa estabelecer um novo regime jurídico para o Banco Central (BC), conferindo-lhe autonomia técnica, operacional, administrativa, orçamentária e financeira.
Otto destacou o artigo 11 da PEC, que trata de concessão extraordinária de liquidez pelo Banco Central a infraestruturas, entidades e fundos “em situações de grave disfuncionalidade”. Isso, com o objetivo de manter níveis adequados de liquidez e a funcionalidade dos mercados. Ele comparou com medidas adotadas na pandemia e fez um alerta sobre o mercado de crédito. “O mercado ainda é um mercado de balcão, sem tela, sem clareza de custos… está tudo dentro desse spread da negociação, o que prejudica investidores”.
Segundo Lobo, há uma preocupação geral com o regime informacional: identificação e monitoramento de riscos, dados sobre captações, estoques de ativos, liquidez e quantidade de investidores. A discussão inclui manter o modelo atual ou caminhar para o modelo “Twin Peaks”. “O objetivo é sempre permitir uma melhor avaliação dos investidores”, resumiu.
“Twin Peaks” é um modelo de supervisão finacneira por objetivos (prudencial e conduta) exercido por duas autarquias de forma integrada. Concebido pelo britânico Michael Taylor, em meados da década de 1990, é amplamente adotado por países da OCDE.
“Know Your Service Provider”
A fotografia da indústria também pede transparência sobre prestadores de serviço: “Atualmente nós temos 1,3 mil gestores de fundos e quase 200 administradores… O resultado de tudo isso não parece ajudar o investidor na seleção dos mais de 32 mil fundos existentes hoje”, afirmou, defendendo a lógica do “Know Your Service Provider” — além do tradicional “Know Your Client”.
Nesse contexto, auditoria é peça-chave. “Hoje existem mais de 80 empresas de auditoria externa prestando serviço para a indústria de fundos”, disse. Por isso, propôs “protocolos, parâmetros, critérios” mínimos: “Nos parece utópico um padrão único… mas por que não trabalharmos em um padrão do que não pode ser feito e criarmos guidelines e guardrails para evitar os absurdos?