NOVOS ENTRANTES

Open Finance inclui 11 novas instituições e 36 milhões de clientes

C6 Bank, Mercantil, 99 Pay, Master, BRB, CSF (Carrefour), Inter, PagSeguro, Midway, Realize CFI (Renner) e Crefisa CFI passam a fazer parte em 1/7

Open Finance
Open Finance | Imagem: Adobe Photoshop

A extensão da cobertura do Open Finance (OF) para 11 instituições financeiras e de pagamentos que até hoje estavam fora do compartilhamento de dados incluirá cerca de 36 milhões de brasileiros. Isso representa aproximadamente 220 milhões de relacionamentos financeiros adicionais ao que já se encontra contemplado.

A extensão está na Resolução Conjunta nº 10/2024. “Tal expansão não apenas fortalece o ecossistema do Open Finance. Mas, também, proporciona maior completude de informações no compartilhamento, estimulando o surgimento de novos casos de uso e funcionalidades inovadoras”. A afirmação é da diretora-presidente da Associação Open Finance, Ana Carla Abrão, citando dados compilados pela consultoria Ernst Young (EY), em entrevista ao portal.

“Estão sendo incluídas instituições importantes, como bancos digitais, instituições especializadas em crédito ao varejo e instituições que proveem banking as a service (BaaS) para fintechs. Isso vai trazer essas instituições mais próximas das iniciativas do Banco Central (BC) que têm por objetivo incentivar a portabilidade de crédito, e dos salários, o Pix Parcelado e um potencial viabilizador de um marketplace de crédito que o BC vislumbra”, detalha o diretor de operações (COO) da Iniciador, Gustavo Bresler.

A lista

A lista de instituições com mais de 5 milhões de clientes obrigadas, a partir desta terça-feira (1/7), a participar do Open Finance compreende C6 Bank, Mercantil, 99 Pay, Master, BRB, CSF (Carrefour), Inter, PagSeguro, Midway, Realize CFI (Renner) e Crefisa CFI, segundo a Associação Open Finance.

Para o advogado Daniel Alvarenga, especialista em direito regulatório e tecnologia financeira da Franco Advogados, a ampliação tem impactos significativos para o ecossistema do Open Finance. Mas também para o mercado financeiro nacional e para as próprias instituições. “Elas enfrentarão desafios operacionais e regulatórios consideráveis. Entre eles, a necessidade de adequação tecnológica, revisão de contratos de compartilhamento de dados, ajustes na governança de APIs, além da observância rigorosa à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD)”, advertiu. Ele foi entrevistado no lançamento de seu livro “Open Finance: Sistema Financeiro Aberto, Regulamentação Comentada”, na quinta-feira (26/06). API é um conjunto de regras ou protocolos que permitem que aplicativos de software se comuniquem entre si para trocar dados, recursos e funcionalidades.

Iniciadores de pagamentos e fintechs, em particular, poderão ampliar sua atuação com base em informações mais completas e padronizadas. Já os conglomerados financeiros e grandes instituições de pagamento, que agora entram na regulação, deverão adaptar seus modelos de negócio. “A vantagem competitiva baseada na exclusividade de custódia de dados de seus clientes tende a diminuir brutalmente, dando lugar à eficiência na análise, oferta e execução de serviços com base em dados abertos compartilhados mediante consentimento prévio e expresso”, salienta o especialista.

“Por exemplo, um motorista de aplicativo que recebe via 99Pay pode usar esses rendimentos para realizar aplicações em outras instituições. Da mesma forma, alguém que tem uma dívida em um daqueles cartões de crédito de lojas do varejo, poderá realizar a portabilidade do crédito para outras instituições por taxas menores”, ilustra Gustavo, da Iniciador.

Clientes e consumidores

A entrada de alguns dos maiores bancos digitais do País que estavam fora do ecossistema regulado de compartilhamento de dados financeiros atrairá mais consumidores. Levantamento da consultoria EY apurou que 29% das buscas no Google que associam o termo “Open Finance” a uma instituição financeira específica estão relacionadas a bancos que ainda não fazem parte do ecossistema. E 11% de todas as reclamações com o termo “Open Finance” no Reclame Aqui citam explicitamente o desconforto do cliente com o fato de seu banco não participar do ecossistema.

A mesma pesquisa, com 50 instituições, mostrou que 57% dos novos entrantes afirmaram não ver valor no Open Finance e por isso não aderiram de forma voluntária. Apenas 14% mencionaram o custo como um fator limitante, indicando que o maior obstáculo é estratégico e cultural. Além disso, 71% dos novos entrantes entrevistados ainda não possuem uma estratégia bem definida para o uso dos dados que estarão disponíveis a partir da sua entrada no ecossistema. E 43% enxergam o Open Finance exclusivamente como uma obrigação regulatória.

Riscos

“O risco, portanto, é que essas instituições entrem no ecossistema sem um plano claro de como explorar os dados, gerar valor para seus clientes ou se posicionar frente à concorrência. Isso pode prejudicar sua imagem dos novos entrantes e do ecossistema como um todo”, alerta a consultoria.

Como sinal promissor, a pesquisa aponta que 57% dos novos participantes afirmaram desejar aproveitar o Open Finance para entregar valor aos seus clientes. Isso demonstra que há disposição para uma mudança de postura.

O Banco Inter afirmou, em nota, ver na ampliação “uma oportunidade estratégica”. “Podemos aprimorar a compreensão do perfil e das necessidades de nossos clientes, possibilitando uma oferta de produtos e serviços ainda mais alinhada e personalizada”. E acrescentou que utilizará as informações consentidas pelos clientes e as possibilidades oferecidas pelo Open Finance para aprofundar o conhecimento sobre o perfil de cada usuário. E, assim, entregar soluções financeiras customizadas e oferecer produtos de investimento ou crédito de forma ainda mais assertiva.

Conglomerados x fintechs

Se mais opções de serviços a custos menores para os clientes afetará a base de clientes dos grandes conglomerados bancários – ou mesmo dos novos grandes bancos digitais – é discutível. De um lado, os conglomerados tradicionais dispõem de custo de capital menor. Logo, margens de lucro ou de negociação maiores. De outro, os entrantes tem vantagens de tecnologia, especialização, experiência de usuário e, no geral, abordam nichos ou setores do mercado sub atendidos pelos grandes, para depois expandir sua base.

“Hoje vemos o Mercado Pago expandindo sua carteira de crédito (e seu valor de mercado) com análises 100% feitas em cima do Open Finance. Nubank também tem se destacado na expansão de sua carteira de crédito. Outros novos entrantes podem se apoiar nessa possibilidade de mobilidade e velocidade tecnológica para implementarem análises e processos mais eficientes”, cita o COO da Iniciador.

Entretanto, a quantidade de clientes dos bancos que aderiram ao Open Finance ainda é relativamente pequena. Conforme pesquisa da consultoria Deloitte apresentada na Febraban Tech de junho, apenas 19%, ou 23,2 milhões. Segundo a pesquisa, a falta de entendimento sobre o que é o OF é a principal barreira à maior adesão. “Uma coisa é aderir, outra é realmente usar. O cliente vai aderir e usar quando vir valor. Isso é uma das grandes lições aprendidas na Europa, que instalou o OF antes de nós”, diz o sócio líder para Indústria de Serviços Financeiros da Deloitte, Sérgio Biagini.

Barreira

Ele vê na disseminação dos softwares de gestão financeira ou gestão de negócios o primeiro passo para superar essa barreira. “Em outras palavras simples é o agregador. O primeiro passo da gestão financeira é agregar os dados. É a instituição conseguir mostrar para o cliente final tudo que ele tem nas diversas instituições em uma única página. Os casos de sucesso na Europa, tanto de pessoa física quanto de pessoa jurídica, são aqueles em que a agregação foi colocada na frente da jornada, na frente da experiência do cliente”, recomenda. “O que que nós fazemos no Brasil? A gente esconde a agregação. Ela não está no cerne da jornada do cliente.”

Segundo Sérgio, não é por falta de preparo. “A primeira vez que falei de Open Finance foi no Ciab (o nome anterior da Febraban Tech) de 2017, e os primeiros trabalhos com os bancos a respeito começaram em 2019”. Aliás, o OF é o maior item do orçamento de Tecnologia da Informação dos bancões: 65% de um total de R$ 47,8 bilhões. Há, porém, uma overdose de informação a ser deglutida pelos agentes financeiros.

Dados

“Nosso volume de dados é muito grande em comparação a outras jurisdições mais evoluídas da Europa, que se concentraram em transações, enquanto o Brasil expandiu muito esse aspecto, mirando crédito, mirando limites e uma série variada de outros dados. Lidar com esse volume de dados não é salutar”, ressalta. “Eu digo que é como uma e instituição que tem uma visão 360 graus virar para 720 graus.”

E isso sem mencionar o desafio maiúsculo de incluir as pessoas jurídicas no OF. “Ao contrário do Reino Unido, onde a empresa foi a primeira agenda, a que pegou lá, aqui ainda estamos patinando, porque tem um desafio do consentimento, quem tem poder e quem não tem poder”, reconhece Ana Carla.

“Mas até isso também já se começa a ver casos de uso super interessantes, como Pix automático, em que as ITPs conectam ali as instituições e permitem uma gestão dos seus recebíveis muito mais eficiente, muito mais flexível do que débito em conta-corrente ou em cartão de crédito. Temos ainda a portabilidade de crédito, a portabilidade de salário, enfim, uma avenida muito larga pela frente”, sustenta a presidente da Associação OF.

*Repórter free-lancer do portal