O avanço da tecnologia, combinado com as mudanças regulatórias e os novos hábitos do consumidor, provocou uma verdadeira revolução na experiência de pagamentos, crédito e outros serviços financeiros para pessoas físicas (B2C). Agora, essa onda promete invadir os negócios entre empresas (B2B, na sigla em inglês). A avaliação é de Luis Eduardo Cascão, co-fundador da fintech Tino (antiga TruePay).
“A gente entende que o B2B hoje está no mesmo estágio que o B2C da década de 70”, define o empreendedor, que é filho de varejistas assim como seu sócio Pedro Sônego. Ele dá como exemplos o crediário – criado e popularizado pela Casas Bahia – e o cartão de crédito. “Só que teve um probleminha. Toda compra que a gente faz no cartão de crédito à vista, o lojista demora 30 dias para receber aquele pagamento. Em qualquer lugar do mundo, o prazo é de dois dias”, aponta.
Com a cultura do parcelamento enraizada no País, os varejistas enfrentam constantemente o dilema do descasamento de caixa, diz Luis. Isso porque vendem em parcelas, porém precisam pagar seus fornecedores (indústrias e distribuidores) em um prazo menor. As opções de recursos para financiar a operação, então, são antecipar recebíveis ou recorrer ao crédito dado pelos próprios fornecedores. E é a falta de capital de giro que quebra a maioria das pequenas e médias empresas (PMEs) no Brasil, lembra o fundador.
“Então, hoje a gente fala que está na época do ‘crediário fornecedor’. Um varejo é refém da análise de crédito de distribuidores de diferentes produtos, assim como tem que administrar inúmeras relações de crédito. E quem está vendendo tem praticamente um banco dentro de casa, convivendo com risco, prazo, inadimplência.”
Multicanal
A proposta do Tino é oferecer um meio de pagamento B2B que, de um lado, facilita o crédito para os lojistas e, por outro, permite aos distribuidores e indústrias venderem mais. “Não somos um boleto a prazo. O crédito é uma parte do que nós fazemos. Temos toda uma jornada, que inclui a gestão de contas a pagar pelo aplicativo”, explica o fundador.
Além de mais digital, ele enxerga no futuro um mercado cada vez mais multicanal. Ou seja, as vendas no B2B podem ocorrer por lojas físicas, marketplaces, aplicativos ou WhatsApp. “E a necessidade que o distribuidor tem no online é muito diferente do offline. Não dá para o cliente dele fazer o cadastro se demorar dois dias para aprovar o crédito”, diz. “Hoje, a gente dá crédito em menos de dois minutos para esse cliente comprar.”
Segundo ele, o Tino assume todo o risco de crédito, e os recebíveis (performados ou não) são usados como garantia. “Nosso negócio hoje é muito controlado. Somos muito cautelosos, e a proridade é o longo prazo. Sempre tivemos como foco construir um produto e modelo de negócio que fossem sustentáveis”, assegura Luis.
Fundada em 2020, a fintech recebeu pouco mais de US$ 40 milhões em duas captações no ano seguinte, ainda no boom dos aportes em startups. Entre seus investidores estão fundos de venture capital como Addition, Kaszek e Monashees.
Novas parcerias
Nos últimos meses, a fintech vem fechando novas parcerias para avançar mais no mercado digital. Uma delas, por exemplo, é com a VTEX, plataforma com soluções de e-commerce e marketplaces. “Hoje somos o único meio de pagamento B2B integrado à VTEX. É no B2B que está a grande oportunidade para e-commerce nos próximos anos”, diz Luis. Outra parceria, cita ele, é com a GeoVendas, especialista em soluções de CRM para indústria e com forte atuação no mercado da moda. Conforme Luis, a expectativa é anunciar novos acordos em breve.
“Somos um meio de pagamento, e essas parcerias às vezes fazem outras partes da jornada”, explica Luis. De acordo com ele, o Tino tem feito parcerias em dois níveis principais: plataformas de e-commerces (caso da VTEX) e sistemas de gestão empresarial (ERP, na sigla em inglês) ou de força de vendas. “São soluções importantes na jornada de compra de um varejo com um fornecedor.”
Atualmente, o Tino tem mais de 100 indústrias e distribuidores como clientes em diversos setores como foodservice, têxtil, eletrônicos. O foco maior está em alimentação, por exemplo, mercados e restaurantes. Em relação à base potencial de varejistas que usam o Tino, Luis diz que varia conforme o fornecedor. “Tem indústria que atende diretamente o lojista, mas a grande maioria faz isso via distribuidor. Temos casos de fornecedores que já nos trouxeram 40 mil varejos”, explica.
O Tino opera como uma instituição de pagamento (IP) não regulada, mas isso deve mudar em breve, quando a fintech atingir a volumetria que a obriga a ser uma IP regulada pelo Banco Central (BC). “Ainda não passamos, mas estamos no processo. Temos conversas avançadas com eles sobre algumas licenças”, diz Luis. Além da IP, ele se refere à licença de Sociedade de Crédito Direto (SCD), para a qual a fintech também aguarda aprovação do regulador.
Oportunidade
São várias as fintechs de olho nos grandes volumes que são transacionados entre varejistas e seus fornecedores. O mercado de recebíveis (cartões e duplicatas) também vem evoluindo nos últimos anos com novas regras criadas pelo Banco Central (BC), o que impulsiona esses negócios.
Com diferentes propostas, os exemplos de fintechs incluem Blu, CashU, Líber, Marvin, Totvs Techfin, Trademaster, entre outras.