Denise Ramiro
O Brasil tem o enorme desafio de incluir digitalmente 60 milhões de brasileiros. A maioria das pessoas tem celular, mas nem sempre com chip ativo ou acesso à internet. Com o advento da pandemia, sem data para acabar, a inclusão se tornou ainda mais urgente. Um levantamento do IBGE, divulgado no final do ano passado, mostra que 382,5 mil estabelecimentos encerraram suas atividades e ao menos 2,9 milhões perderam empregos diretos. Por outro lado, o país registrou empreendedorismo recorde no período, aquecendo ainda o mercado de fintechs, que não vê crise pela frente. “Hoje temos mais de 1.100 fintechs no país, existe empreendedorismo, tem dinheiro para investir, temos um Banco Central moderno, mas ainda precisamos fazer a inclusão educacional”, alerta João Bezerra Leite, conselheiro do Conselho de Administração da Surf, startup de telecomunicações e serviços financeiros.
Diante desse cenário, ele prevê grandes oportunidades para as fintechs, como por exemplo nas áreas de saúde – a grande preocupação das pessoas após a Covid-19 – e de pequenos seguros. A Surf, que tem foco nas classes populares, oferece solução white label de serviços de conexão de voz, dados, banda larga e telefonia fixa para marcas se tornarem operadoras, assim como uma conta digital com cartão de crédito e serviços de empréstimo direcionada direto ao consumidor final. A solução conquistou 65 empresas que hoje têm o próprio cartão. As parceiras vendem e a Surf faz a operação financeira das transações. Entre os clientes, Correios Celular, a BMG, Uber, Lojas Pernambucanas, Marabraz, clubes de futebol, Central Única das Favelas.
Private label
Outra ponta do negócio da Surf é a concessão de microcrédito, de R$ 300 e R$ 600, realizado em parceria com a operadora de energia CPFL e com cobrança direta na conta de luz. Ela já negocia parcerias também com a EDP e a Enel. Os pequenos seguros também estão no radar. “Este ano estamos projetando dobrar de tamanho, em faturamento e expansão dos negócios”, diz Bezerra.
A cearense FortBrasil, fintech de serviços e soluções financeiras que administra cartões private label cobranded, também escolheu o nicho popular para atuar. Desde o início em 2004, ela atuou no nicho de crédito para baixa renda através de parcerias com os varejistas populares de rua que vendem produtos como roupas, calçados, móveis, eletrodomésticos, entre outros. A fintech é responsável por enviar o cartão e a fatura para o consumidor, gerir a tecnologia da operação, assumir o risco da operação e de parte da recuperação de crédito que o varejo.
Segundo José Pires Neto, cofundador da FortBrasil, o modelo de negócio tem se mostrado vantajoso para todos. O varejista alavanca as vendas, reduz o custo financeiro e aumenta a fidelização desse cliente. O cliente final -autônomo, na faixa dos 30 a 60 anos e renda média mensal de R$ 1,5 mil, tem acesso ao crédito através de uma marca (varejista) que ele já confia e pode se beneficiar de descontos, promoções e prazo maior de pagamento. E a FortBrasil ganha escala.
Há quatro anos a fintech lançou o cartão Vai Bem, voltado para a saúde, através da parceria com clínicas médicas e laboratórios de diagnóstico. Nos últimos três anos, a FortBrasil passou a expandir a atuação para as regiões Centro Oeste e Sudeste, que hoje já representam 20% dos negócios.
Sem garantia
A SuperSim também nasceu com o propósito de inclusão financeira. O seu público alvo, das classes C e D e com renda mensal de até R$ 2.500, tomam empréstimos com tíquete médio de R$ 500 a R$ 1.000. De acordo com Antonio Brito, CEO da SuperSim, a fintech atende a parcela da população que não tem excedentes – qualquer imprevisto ultrapassa o orçamento. “Muitas vezes emprestam para pagar conta de luz e de gás atrasadas, comprar remédio, material escolar, reformar ou trocar pneu de carro”, explica Brito.
Por se tratar de um negócio de alto risco, a SuperSim lida com o problema oferecendo duas opções de empréstimos, uma com garantia do aparelho celular, geralmente o único bem que a pessoa tem, e outra sem garantia, obviamente mais caro. E a demanda é grande, atualmente a empresa recebe cerca de 100 mil pedidos de empréstimo por mês, com tíquete médio de R$ 250 a R$ 2.500. “O crédito sem garantia geralmente é a porta de entrada para o cliente. Ele vai ganhando mais crédito conforme cumpre o contrato e vamos nos conhecendo melhor”, diz Brito.
Mais uma novidade para o público de baixa renda e microempresários vem com o Banco Supera. Aberto no ano passado, ele oferece um cartão de crédito pré-pago sem anuidade e com abrangência nacional, além de possibilitar que pessoas, com ou sem pendências judiciais, possam abrir uma conta com liberação de recebíveis em até 24 horas, contas PJ, entre outros serviços. Além disso, o usuário pode emitir TEDs, DOCs, PIX e boletos registrados, e ainda realizar saques na rede de Banco24Horas.
“A inclusão financeira é extremamente importante, principalmente neste cenário em que os brasileiros estão vivendo, tendo que superar ainda mais o dia a dia e se reinventar a todo o momento”, diz Rafael Thielmann, cofundador e CFO do Banco Supera.