O Brasil é, de fato, o maior ecossistema de fintechs na América Latina. Disso não dá para duvidar. E também não dá para ignorar o avanço de outros mercados, como o México. Desde 2018, as fintechs mexicanas já levantaram US$ 2,5 bilhões em 220 rounds, segundo levantamento feito pela plataforma Sling Hub, com exclusividade para o Finsiders. Ainda está distante do volume de aportes recebido pelas fintechs brasileiras que, no mesmo período, captaram mais do que o dobro (US$ 5,9 bilhões) em 392 rodadas de investimento.
Este ano, o mercado segue aquecido em solo mexicano. Até 30 de junho, as startups do setor financeiro no país levantaram US$ 1 bilhão. O volume é puxado, claro, por mega rounds, como da fintech de pagamentos Clip, que levantou US$ 250 milhões em junho em aporte liderado por SoftBank e Viking. Teve, ainda, a captação também de US$ 250 milhões feita pela corretora de criptomoedas Bitso, recém-chegada ao Brasil, inclusive. A Konfío, de soluções financeiras para PMEs, também recebeu um aporte de US$ 125 milhões, há uma semana.
Por aqui, até 30 de junho, as fintechs brasileiras já captaram US$ 2,3 bilhões, cifra impulsionada também por mega rounds, entre eles, o último aporte do Nubank de US$ 500 milhões, ou ainda a captação de US$ 430 milhões do Ebanx, anunciado no mês passado.
Segundo a análise feita pela Sling, a maior parte (110 rounds no total) das rodadas em fintechs mexicanas é de até US$ 10 milhões. Aportes entre US$ 10 milhões e US$ 50 milhões vêm em seguida, com 23 deals registrados desde 2018. Entre US$ 50 milhões e US$ 100 milhões, foram apenas três rounds de lá pra cá. No período, foram seis mega rodadas (acima de US$ 100 milhões).
No mercado brasileiro, o levantamento indica 17 deals acima de US$ 100 milhões; seis entre US$ 50 milhões e US$ 100 milhões; 37 rounds no intervalo entre US$ 10 milhões e US$ 50 milhões. E, claro, um número maior (256) de cheques menores, de até US$ 10 milhões.
Em número de fintechs que foram alvo de aquisições, o México é bem pouco representativo. Desde 2018, o levantamento indica sete operações, enquanto que no Brasil houve 80 fintechs adquiridas nesse período. Há quem diga (e as notícias indicam isso também) que esse número tende a crescer em 2021.
Segundo o Mapa Fintech MX 2021, recém-publicado pela plataforma Finnovation, o México atingiu 435 fintechs ativas em abril deste ano, número que representa quase o dobro em relação a 2019, quando foi realizado o primeiro levantamento.
Ao todo, são 13 verticais, com destaque para as categorias de pagamentos e empréstimos (lending), que reúnem a maior quantidade de fintechs, a exemplo do que ocorre no Brasil. O mapa inclui, ainda, verticais como investimentos, neobanks, gestão financeira pessoal, criptomoedas e infraestrutura financeira.
Na avaliação de Bruno Diniz, sócio da consultoria Spiralem e diretor para América do Sul da Financial Data and Technology Association (FDATA), o México tem problemas graves em relação à bancarização. O acesso a soluções digitais de pagamento ainda é baixo, e o volume de dinheiro em circulação ainda é bem grande.
“Eles estão em certa medida com mais gaps do que vemos no Brasil”, analisa o especialista.
No segundo maior país da América Latina, com 130 milhões de habitantes e PIB de US$ 1,3 trilhão, mais de 50% dos mexicanos não têm conta bancária, mais de 30% não têm acesso a nenhum produto financeiro e apenas 31% têm acesso a serviços de crédito. Detalhe: mais de 90% dos pagamentos no México são feitos com dinheiro em espécie, conforme cita a a16z, em relatório recente sobre o boom das fintechs na América Latina.
Seria como se o México estivesse vivendo agora o que nós vivemos há cinco anos no mercado de pagamentos, compara Bruno. Isso porque agora empresas como a Clip estão começando a popularizar as maquininhas de cartão (imagine isso!). Em relação às oportunidades, o mercado de pagamentos não é o único. Crédito (Konfío, CrediJusto e outras) e investimentos (GBM, investida do SoftBank) também vêm sendo explorados por fintechs mexicanas. Vale lembrar que o país já tem três unicórnios: Kavak, Bitso e Clip.
Vale lembrar que o México aprovou, em 2018, a Ley Fintech, que define as regras para a operação das fintechs no país, assim como a regulamentação sobre pagamentos móveis, carteiras digitais, crowdfunding e criptomoedas. A lei também determina as regras para serviços bancários abertos e uso de APIs.
Brazucas no México
O México também vem atraindo fintechs brasileiras. O Nubank divulgou, em abril, um investimento de US$ 135 milhões em sua unidade mexicana, o Nu México. Do total aportado, US$ 70 milhões serão injetados pelo Nubank na operação local. Os US$ 65 milhões restantes serão financiados por J.P. Morgan, Goldman Sachs e Bank of America (BofA).
A a55, fintech de crédito para empresas com receita recorrente (“revenue-based financing”), anunciou no início deste mês um aporte de US$ 35 milhões para financiar as operações de crédito no México. A captação, liderada pela gestora americana Accial Capital, vem para ajudar a alavancar a expansão da fintech no país, iniciada no ano passado, quando a a55 concluiu sua rodada Série A.
O Guiabolso fez parceria com a fintech mexicana Finerio, com atuação semelhante ao Guiabolso e que está presente no México, na Colômbia e no Chile. A aliança prevê que as fintechs trabalhem em conjunto, oferecendo soluções B2B da parceria, inclusive soluções relacionadas ao open banking (OB), em outros países da América Latina, além das regiões onde as duas empresas já estão posicionadas.
A Belvo, por sua vez, inaugurou sua primeira operação no México, em seguida na Colômbia, e no ano passado no Brasil, conforme antecipado pelo Finsiders. A fintech — que desenvolve APIs para o setor financeiro — tem no captable investidores como Founders Fund e Kaszek.
Este ano, a FacilitaPay, fintech brasileira que atua na América Latina com serviços de pagamento e transações cross-border, iniciou a operação no México, e também planeja expandir para Chile, Colômbia e Uruguai.
O contrário também é verdadeiro. A Bitso, corretora mexicana de criptomoedas, anunciou recentemente o início das operações de varejo no Brasil, assim como a fintech Clara, que auxilia empreendedores na gestão de gastos corporativos.