O Open Finance trouxe à tona uma explosão da mente das empresas no que diz respeito à utilização de dados financeiros para o processo de tomada de decisão. Nunca na história se viu tamanha possibilidade de acesso a dados tão ricos como o que se vê agora, empoderando o consumidor e ao mesmo tempo, dando a possibilidade de empresas de diversos segmentos a terem acesso a informações até então conhecidas internamente pelas grandes instituições financeiras.
E falo isso com certa propriedade, afinal sou nascido e criado dentro da indústria de dados, iniciando minha carreira na extinta Equifax no Brasil e passando pelos ciclos de dados negativos e cadastro positivo na Boa Vista e Quod respectivamente.
Durante esse período, vivi a evolução da indústria e o impacto disso no mercado financeiro e posso afirmar: só temos a concorrência de serviços financeiros atual em virtude de toda uma evolução no sistema de dados. Muitos falam que o que revolucionou os modelos estatísticos foi a inclusão de inúmeras metodologias, mas de nada pode se comparar a evolução da utilização de dados que subsidiam a adoção de novas metodologias.
Observando a história, considero que a indústria de dados financeiros tem três grandes fases: Cadastro Negativo, Cadastro Positivo e Open Finance.
Cadastro Negativo
O cadastro negativo foi durante décadas a base do sistema de dados financeiros compartilhados no Brasil, sendo Serasa e SPC as famosas marcas registradoras de débitos no país. O “nome sujo”, como foi popularmente conhecida a negativação, trazia apenas informações de débitos que eram expostos pelos credores no mercado, ou seja, caso o credor não reportasse o débito ou mesmo fosse pago rapidamente após a negativação, nenhuma informação era exposta e o comportamento financeiro da pessoa continuava “limpo”.
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Ao longo do tempo, os birôs de crédito deixaram de vender apenas a informação de débito e nada consta para implementar modelos de score que previam uma possível inadimplência baseada no histórico do consumidor na base de dados. Tal histórico já contemplava variáveis de débitos baixados e volume de consultas de crédito que o consumidor teve ao longo do tempo.
Mesmo assim, caso o consumidor nunca tivesse tido algum débito ou histórico recente de busca por crédito (consultas de credores), o modelo de score não performava ou tinha uma grande faixa de pessoas na “zona cinzenta” – aqueles que não conseguimos identificar como bons e maus pagadores.
Além disso, os modelos de renda presumida são baseados, em sua grande maioria, em informações cadastrais e advindas do Censo (que há 11 anos não é atualizado no país). Bem como, todos sabem que as discrepâncias sociais do país são gigantescas. Ainda mais pós pandemia, onde não é possível garantir que vizinhos, que têm idade e escolaridade similares, tenham a mesma renda.
Cadastro Positivo
Em 2019, com a alteração da Lei do Cadastro Positivo, pensava-se que o acesso a dados de contratos de crédito e de utilities (tal como cartões, empréstimos e gastos com telecom) mudaria o panorama da análise de dados para serviços financeiros como um todo.
Porém, apenas 65 milhões de brasileiros têm algum cartão de crédito no Brasil e esse é o método de crédito mais popular do país, portanto, pessoas que têm baixo nível de bancarização e/ou só usam meio de pagamento à vista, continuam não sendo vistas pelo mercado. Em decorrência disso, apesar da melhoria do sistema de crédito e melhor avaliação de risco, a personalização de ofertas, redução de taxas e criação de novos produtos praticamente inexiste usando esse tipo de dado.
Open Finance
Com o advento do Open Finance, as possibilidades de análises de perfis das pessoas aumentaram exponencialmente e a assertividade dos modelos, políticas e estratégias, também. Com acesso ao extrato bancário, é possível identificar rendas e gastos detalhados, seja de pagamento a prazo ou, principalmente, à vista. Afinal, o Pix é hoje o principal meio de pagamento do país e sem ele as análises de consumo são extremamente rasas. Com isso é possível:
- Avaliar comportamento das pessoas que têm nenhum ou quase nenhum histórico creditício;
- Mensurar a renda real de um indivíduo, garantindo segmentações, limites e produtos financeiros mais adequados;
- Avaliar o perfil de renda real da pessoa (se ganha mais dinheiro por ser autônomo, CLT, ou se há um mix de renda mensal que pode contribuir para ajudarmos pessoas que tanto trabalham e arrumam diversas fontes de rendas a serem reconhecidos dentro do mercado financeiro;
- Analisar o fluxo de caixa de cada indivíduo. Afinal, de que adianta ganhar um bom salário e gastar muito mais que ele?
- Atribuir limites de crédito corretos para as pessoas, tanto para que se possa contribuir para a redução da inadimplência, quanto para estimular as pessoas a usarem os serviços financeiros dos novos entrantes. Um exemplo disso é quando um banco digital começa sua operação de cartão de crédito e para reduzir riscos ele dá um limite baixo para todos os usuários e ao longo do tempo vai aumentando pouco a pouco, porém quem já usa nos bancos tradicionais um limite alto de cartão de crédito não vai querer trocar por um cartão de limite baixo;
- Potencializar as políticas de repescagem, favorecendo as empresas atingirem suas metas de aprovação sem comprometer sua PDD;
Personalizar ofertas! Afinal, quantas vezes recebemos ofertas de produtos que nada tem a ver com o nosso perfil?
É óbvio que a força e inteligência dos bureaus de crédito devem ser valorizadas, ainda mais que eles não precisam de uma jornada de consentimento como o Open Finance, porém os exemplos acima mostram que, sem o uso de dados e inteligência do Open Finance, as empresas perderão competitividade e rentabilidade.
*Este conteúdo foi originalmente publicado na newsletter especializada Let’s Open.
*Bruno Moura é diretor de negócios da Klavi, plataforma SaaS de agregação de dados, analytics e serviços API com foco em Open Finance.
As opiniões neste espaço refletem a visão dos especialistas e executivos de mercado, e não a do Finsiders.
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