Por Rogerio Melfi*
Recentemente tivemos a notícia da primeira emissão do real digital. O fato foi amplamente divulgado e acabou gerando algumas conclusões equivocadas que trouxeram certo pânico por parte do mercado e outros segmentos. Antes de chegar ao cerne da discussão, é preciso entender, de fato, o que é o real digital que, por definição, é uma “Moeda Digital do Banco Central”, CBDC (Central Bank Digital Currency), neste caso regulada pelo Banco Central (BC).
Atualmente temos o real físico (cédulas e moedas), o real “eletrônico” (dinheiro que é movimentado pelos meios eletrônicos) e teremos o real digital, uma nova versão da mesma moeda. Ou seja, assim como é feita a troca física pelo eletrônico e vice-versa, poderá ser feito o real eletrônico pelo digital. Seu valor será sempre o mesmo, de um para um, oscilando apenas pelas variações cambiais, exatamente como acontece com a moeda real físico e eletrônico. Mas para que ter o real digital, então?
Hoje, para realizar algumas transações, temos de ter confiança no provedor de serviço ou no pagador. Ou seja, quando uma pessoa compra crédito para o celular, por exemplo, primeiro é realizado o pagamento, confiando que a operadora vai debitar aquele crédito. Se der erro, claro que a pessoa irá resolver, mas não será uma funcionalidade da moeda a responsável em resolver essa questão, e sim um procedimento de back-office de operadora ou banco utilizado.
A moeda, por meio de um contrato inteligente, pode ter a característica de pagar a operadora no exato momento em que o saldo de créditos de recarga aumentar. Para a compra de um automóvel poderia ser realizado da mesma forma — um contrato inteligente no momento do registro da transferência de proprietário.
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Assim também seria na hora de fazer locação de um carro ou casa, podendo ser pago um valor a título de “caução” e, no final da transação, o valor voltar para origem se não tiver ocorrências.
Exemplos simples, mas são inúmeras e infinitas as oportunidades. De modo geral, todas as pessoas precisam ter o real digital em sua conta, porém todos os processos ainda estão em andamento e sendo avaliados cautelosamente porque entregar esta funcionalidade — contratos inteligentes — não é o principal neste momento.
O trabalho é assegurar que ela seja interoperável com a moeda existente, garantindo segurança, disponibilidade e privacidade necessária para o ecossistema, como também promover a participação de todas as instituições reguladas para operar neste ambiente. Enfim, precisamos e estamos fazendo “provas de conceito”, apelidadas de PoCs.
Com esse cenário, a Fenasbac (Federação Nacional de Associações dos Serviços do Banco Central) está coordenando o LIFT Challenge, edição especial do LIFT – Laboratório de Inovações Financeiras e Tecnológicas, em parceria com o Banco Central, que tem como desafio criar projetos aplicados em real digital, usando tecnologia distinta, validando se atende ou não atende todas as funcionalidades para o mercado.
Assim, a emissão de qualquer real digital, neste momento, só roda em experimentos de soluções isoladas. Para 2023, está planejada a realização de pilotos, isto é, casos dentro de um ambiente controlado que poderá ser acompanhado, validado e evoluído para, daí sim, poder chegar aos resultados positivos esperados e quem sabe, então, teremos o real digital disponível em larga escala em 2024.
Ou seja, diante desse cenário, as instituições que ainda não estão olhando para o real digital, certamente estão perdendo grandes oportunidades que poderão ser desbravadas. Mesmo que possam trazer desafios, a possibilidade de gerar impacto de larga escala nos negócios é enorme.
O sistema financeiro evolui dia após dia para tornar-se cada vez mais instantâneo, conectado e inteligente, e quem estiver inserido aqui, precisa também fazer a mesma movimentação.
*Rogerio Melfi é coordenador do GT de Open Finance da ABFintechs.
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