'FINTECHZAÇÃO'

"Sempre fomos uma grande empresa de microcrédito", diz CEO do banco digital da Natura

Para José Manuel Silva, que comanda o Emana Pay, o mercado de crédito ainda é altamente "coercitivo e negativista"

Da esq. para a dir., Carlos Benitez/BMP; Vanessa Butalla/MB; Priscila Faro/Mercado Pago; e José Manuel da Silva/Natura&Co Pay
Da esq. para a dir., Carlos Benitez/BMP; Vanessa Butalla/MB; Priscila Faro/Mercado Pago; e José Manuel da Silva/Natura&Co Pay | Imagem: Danylo Martins

A Natura aderiu nos últimos anos aos serviços financeiros embarcados (embedded finance) com a criação do banco digital Emana Pay, mas há muito mais tempo a empresa de cosméticos e beleza já sentia um “cheiro” do setor. Segundo o CEO da plataforma financeira da marca, José Manuel Silva, o Emana Pay não nasceu digital porque a Natura já era uma “grande empresa de microcrédito” bem antes de ter a própria fintech.

“Quando uma consultora comprava produtos e tinha prazo para pagar depois de vender, isso já era crédito — e isso acontece há quase duas décadas. O que fizemos foi aproveitar essa onda de regulamentação [no setor financeiro] nos últimos anos”, disse ele. O executivo participou de um painel sobre regulação financeira no “Fórum Bancos & Banking”, realizado nesta quinta-feira (21/5) pela empresa de eventos Cantarino Brasileiro em parceria com a Acrefi, associação que representa principalmente financeiras.

De acordo com José Manuel, um dos principais diferenciais do modelo de negócio do Emana Pay é que a Natura tem um amplo conhecimento sobre as mais de 3,5 milhões de consultoras que estão em sua base. E o uso intensivo de dados ajuda a desenhar soluções financeiras ajustadas à realidade de cada profissional. “Conseguimos ‘hackear‘ o sistema com muita informação, muitos dados. Hoje, a consultora tem um fluxo de caixa quase customizado. Porque a consultora que está no Macapá tem uma realidade completamente diferente da que está em Cajamar”, afirmou.

Para o executivo, apesar da evolução recente com o Cadastro Positivo e outras iniciativas que buscam melhorar a análise de crédito, esse mercado no Brasil ainda é “altamente coercitivo e negativista”. Na visão de José Manuel, é assim porque o setor não enxerga os bons pagadores, assim como rapidamente um nome é colocado na base de dados de um birô, caso a pessoa não pague em dia uma conta, por exemplo.

Questionado se o Emana Pay – que atingiu uma carteira de crédito de R$ 762 milhões no primeiro trimestre de 2025 – utiliza dados compartilhados via Open Finance para melhorar a concessão de crédito, o executivo respondeu com um “sim e não”. Sim, porque a Natura já possuía um “filme” de como cada consultora se comporta com a dívida. “Por outro lado, temos um baixo índice de opt-in [consentimento para compartilhamento de dados] porque nossa rede não nasceu digital.”

José Manuel destacou, ainda, a importância da educação financeira e da inclusão digital. “Se a gente conseguir, dentro do nosso aquário, que as consultoras consigam ser mais letradas financeiramente é o melhor Open Finance que podemos ter”, disse. “Queremos que as consultoras tenham contas digitais, que tenham conta no Mercado Pago. Porque não somos competidores no bottom-line [na última linha]. Nossa proposta de valor é cosmético, e que as consultoras tenham toda a dinâmica mercantil com a gente.”

Ecossistemas

Para o executivo, o momento atual envolve um entrelaçamento cada vez maior entre os ecossistemas. “O nosso se funde com o do Mercado Livre, com o do Mercado Pago. Isso cria valor onde antes não havia. A beleza está na adjacência dos ecossistemas”, afirmou.

O movimento de “fintechzação” ganha força justamente por meio de grandes ecossistemas em diferentes setores, entre eles, o varejo. No caso do Mercado Pago, banco digital do Mercado Livre, o trunfo vem desse “poder” do ecossistema de vendedores e consumidores em sua plataforma digital. “Temos a vantagem de conhecer muito bem os clientes, os dados comportamentais, o histórico de transações. Assim, conseguimos oferecer um crédito customizado e mitigar riscos de inadimplência”, disse Priscila Faro, diretora jurídica do Mercado Pago, também presente no painel.

De acordo com a executiva, a instituição utiliza as informações compartilhadas pelo Open Finance para melhorar a oferta e concessão de crédito. “Somos a instituição com mais consentimentos de PJs [empresas] no Brasil – são 120 mil. Mas esse número ainda é pequeno comparado ao potencial”, citou Priscila. Atualmente, segundo ela, o Mercado Pago soma mais de 11 milhões de consentimentos ativos no sistema.