Futuro da regulação cripto: projeto europeu precisa de atualização

O marco regulatório de cripto na Europa que o mercado tanto ansiava já nasceu com lacunas, escreve Morgana Tolentino, pesquisadora do Instituto Propague

O marco regulatório europeu para criptoativos (Markets in Crypto-Assets – MiCA) foi aprovado neste ano e promete ser benchmark para outras legislações. Contudo, a proposta deixou de fora segmentos relevantes do mercado cripto, principalmente os NFTs e DeFi (sigla em inglês para finanças descentralizadas).

Os NFTs movimentaram cerca de US$ 25 bilhões por ano desde 2021, enquanto o DeFi apresenta atualmente um valor médio alocado de cerca de US$ 50 bilhões em 2023. Assim, mesmo que a MiCA ainda nem tenha entrado em vigor, já é preciso pensar em uma atualização da legislação para incluir de forma clara NFTs e DeFi.

A votação da regulamentação do MiCA estava prevista para final de 2022, mas foi adiada e aprovada pelo Parlamento Europeu em abril deste ano com retificação do Conselho Econômico da UE no mês seguinte. Com isso, as novas regras passam a valer a partir de julho de 2023, em uma implementação escalonada em 18 meses. Portanto, só valerá de forma plena em dezembro de 2024.

O longo prazo para entrar inteiramente em vigor se deve à complexidade de criar um marco regulatório para um mercado relativamente recente, com alta capacidade tecnológica e de abrangência global, ainda pouco (ou nada) regulamentado na maioria das jurisdições.

Morgana Tolentino, pesquisadora do Instituto Propague. Foto: Divulgação
Morgana Tolentino, pesquisadora do Instituto Propague. Foto: Divulgação

Dessa forma, há uma grande expectativa para com a regulação europeia, afinal a MiCA se propõe a criar um regimento único para o mercado de cripto em todos os países da União Europeia. Define também uma taxonomia comum para criptoativos, servindo, então, de benchmark para o setor.

NFTs e DeFi devem ser os focos em uma possível atualização

É verdade que os NFTs não estão totalmente descobertos pela legislação europeia, pois alguns podem ter características que os enquadre em um dos ativos aos quais a MiCA se aplica. Porém, não há uma sistemática para NFTs especificamente, o que deixa grande parte das transações desses ativos fora do guarda-chuva da regulação.

Já no caso de DeFi, todo o mercado está descoberto, pois a MiCA não trata de negociações em ambientes descentralizados. Isso traz um risco extra agora que a norma entrará em vigor. Isso porque transações em DeFi podem passar a ser usadas como mecanismos de fuga da regulação, pois não estarão sujeitas às regras estabelecidas pela regulação europeia.

O marco regulatório que o mercado tanto ansiava e que prometia estabelecer os fundamentos para uma regulação robusta para cripto já nasceu com lacunas. Deixou descobertos segmentos que podem ser usados para arbitragem regulatória, gerando incerteza no mercado. Por isso, uma revisão se faz urgente e necessária, para incorporar esses pontos sensíveis e, com isso, garantir a confiança do mercado.

*Morgana Tolentino é pesquisadora do Instituto Propague e doutoranda em Economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UERJ). No Finsiders, assina uma coluna bimestral sobre cripto, banking, crédito e Open Finance.


As opiniões neste espaço refletem a visão dos colunistas, e não a do Finsiders.