Núclea se organiza para ativos digitais e busca fornecedor de infraestrutura blockchain

"Chamamos 20 provedores de tecnologia para nos propor respostas", diz Cesar Kobayashi, gerente-executivo de ativos digitais da empresa, ao site parceiro Blocknews

A Núclea é uma daquelas empresas que se você nunca ouvir falar ou não sabe o que faz, precisa saber que neste momento ela deve estar processando alguma operação financeira relacionada às suas finanças. Isso porque é a maior provedora privada de infraestrutura bancária e de pagamentos tradicionais. Agora, a empresa — que é de 48 bancos — também quer ser referência em ativos digitais. Para isso, sua nova gerência na área abriu uma concorrência para ter uma infraestrutura blockchain.

“Estamos fazendo uma grande RFP (‘request for proposal’, ou pedido de proposta, na tradução livre) para escolher de forma definitiva e para o longo prazo nosso parceiro tecnológico”, afirma ao site parceiro Blocknews Cesar Kobayashi, gerente-executivo de ativos digitais da Núclea. “Chamamos cerca de 20 provedores de tecnologia para nos propor respostas. A RFP abrange requisito mínimos, não é muito detalhada. Mas inclui, por exemplo, a apresentação de um case para ser testado e precificado”. Os provedores incluem protocolos descentralizados, blockchains privadas e consultorias.

A ideia é que a tecnologia que a Núclea vai oferecer ao mercado abarque de serviços atrelados à tokenização de múltiplos ativos, incluindo os ativos digitais reais (RWA), à interligação com a rede do Drex. A empresa está participando do piloto do real digital com Bradesco e Setl. Assim, quem apostar que blockchain pode tirar a empresa do mercado, está errado, diz Kobayashi. “É muito mais oportunidade em diversas formas do que ameaça”, afirma.

Oportunidades em ativos digitais

Sua explicação para isso é a seguinte: a Núclea tem uma agenda forte de infraestrutura para o mercado financeiro de registro de ativos, que corre paralela à agenda do Banco Central, que é “gigante”. Há mais de vinte ativos para passarem por regulação, incluindo recebíveis imobiliários. De acordo com ele, essa é uma agenda que diz respeito a um problema muito simples: o recebível existe, está disponível para garantir crédito. Como garantir que ainda não está garantindo, por exemplo?

E na tokenização desse recebível, quem garante que o token é o que dizem que o token é? E com o fracionamento de ativos que blockchain permite, isso fica ainda pior. “A segurança de um ‘pool’ de duplicatas tokenizadas de ponta a ponta vem da infraestrutura”, exemplifica.

“No fim do dia, quem garante alguma coisa, é um CNPJ. Esso é o jeito de interagir com os reguladores”, diz Kobayashi. “A tecnologia é um meio, mas quem garante que algo está sendo feito, é uma instituição. O token entra na rede vindo de algum lugar. De onde? Atrelado a quê? A origem dos ativos está na instituição financeira, na escrituração, no registro. A tokenização vai achar seu ângulo num legado que já existe.”

‘One-stop-shop’ de registro e de depositária

Nessa nova onda de tokenização da economia, a Núclea olha para ativos novos e para os que já estão na casa desde sua concepção. Os imobiliários estão entre eles, aproveitando que está entrando em vigor a lei 13.775/18 que trata da emissão eletrônica de duplicatas. A lei também torna o registro delas obrigatórios e trata da liquidação. Assim, membros do setor da construção como incorporadoras e loteadoras, em especial os de menor porte, terão de registrar os recebíveis. “Queremos ser ‘one-stop-shop’ de registro e de depositária”.

Kobayashi afirma que está tendo um retorno do mercado de que o papel da Núclea é necessário para a economia tokenizada dar certo. Além disso, diz que o BC não tem muitos entes para supervisionar o sistema financeiro, em especial liquidação financeira. Por isso, “nosso papel é importante para o regulador”. Para ele, a empresa terá esse papel de “gatekeeper” (porteiro). Assim, não some, mas pode ter novos papéis, como acontecerá com outros participantes do mercado financeiro por conta das mudanças que blockchain trará.

E falando em CNPJ, Kobayashi diz que a empresa atende cerca de 1,7 mil CNPJs e 700 grupos econômicos em operações, conectando esses atores do mercado. Com isso, processou 31 bilhões de transações equivalentes a R$ 19 trilhões, ou duas vezes o PIB do Brasil, em 2022. “A Núclea tem tudo a ver com um conceito de rede distribuída”, afirma. Assim, vai avançar as finanças tradicionais para o das finanças tão descentralizadas quanto possível, já que o desenho do BC não é de descentralização total da economia.

Empresa buscou profissional agnóstico

E é por tudo isso que a Núclea criou um centro interno de excelência que trata de ativos digitais e chamou Kobayashi para tocar a gerência desse braço do negócio. “Tenho vinte anos na área bancária e de pagamentos. Quando a Núclea me chamou, ainda não tinha trabalhado diretamente com criptoativos, mas era investidor”, diz ele ao Blocknews. Isso era exatamente o que o CEO André Daré queria, afirma. É que a empresa buscava um profissional com olhar de modelo de negócios, agnóstico em relação a blockchain, pragmático e que falasse a “língua do leigo”, sem os jargões típicos da comunidade cripto.

Um dos motivos para isso é que além de estruturar a área de ativos digitais, a missão de Kobayashi é fazer a interlocução com as instituições financeiras e empresas falando de uma inovação – blockchain – e de como fazer o cruzamento entre o mundo tradicional e o das finanças descentralizadas.

A equipe que está montando inclui também Leandro Pereira, que assumiu neste mês o cargo de gerente de infraestrutura da unidade de ativos digitais. Especialista e com experiência em projetos em blockchain, compõe com Kobayashi pelo lado tecnológico.

Leiga não é

Na verdade, a Núclea já está envolvida com ativos digitais em outros projetos, além do piloto do Drex. É parte, por exemplo, do projeto da BEE4, plataforma de tokenização de ações e negociação no mercado secundário que está no sandbox da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

Também criou uma plataforma de duplicatas escriturais em blockchain para evitar fraudes e dar mais eficiência ao processo junto com B3, CERC e CRDC (Central de Registros de Direitos Creditórios). Está, ainda, no grupo da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) que dá apoio técnico ao BC no Drex. Além de acompanhar projetos dentro de bancos.

A transição da Núclea para finanças descentralizadas está num contexto de remodelação da própria empresa. Até o ano passado, se chamava Câmara Interbancária de Pagamentos (CIP) e era uma instituição sem fins lucrativas dos 48 bancos. Agora, é uma empresa privada que tem de se mexer para continuar útil, atual e lucrativa.

O plano de Daré é fazer a empresa dobrar de tamanho em cinco anos, o que inclui crescimento orgânico e aquisições. O faturamento em 2022 foi de R$ 1,3 bilhão, 23% acima do valor de 2021 e com lucro de R$ 576 milhões antes do imposto de renda (LAIR). Comprar empresas ligadas a blockchain e ativos digitais é uma possibilidade, mas não é mandatório.

Tokenização tem poder de transformar a economia

De acordo com o gerente-executivo da área de ativos digitais, “o contexto da economia tokenizada no Brasil é ainda maior do que o Pix, que é enorme, mas que é um meio de pagamento”. O PIB do Brasil fechou 2022 em R$ 9,9 trilhões.

Para ele, “o token é uma disrupção que se desdobra em diversos segmentos econômicos, transações atômicas, por exemplo. Talvez, agenda do Drex não será tão rápida quanto a do Pix, mas o poder transformacional da economia tokenizada é equivalente à da economia atual”.

Sobre o centro de excelência que a Núclea está formando em ativos digitais, o objetivo é trazer conhecimentos de diversas fontes, inclusive por meio de treinamentos externos. A previsão é o centro ter um “número relevante” de profissionais.

*Conteúdo publicado originalmente no portal parceiro Blocknews.