Por Cesare Rollo Iacovone*, para o Finsiders
No mercado de crédito brasileiro, garantias são peças fundamentais no complexo quebra-cabeça econômico. Nos últimos anos, vimos avanços significativos tanto em aspectos legais, com o Marco das Garantias, quanto em regulatórios do Banco Central (BC), como nas resoluções que apoiam a digitalização de recebíveis de arranjos de pagamentos e de duplicatas mercantis.
Quando um financiador decide trabalhar com uma garantia, a premissa subjacente é a preferência pelo recebimento do dinheiro ao invés da garantia propriamente dita. Garantias, portanto, são um meio para o aumento da concessão e da recuperação, e não o fim em si mesmas. Porém, os financiadores que pensarem as garantias após o não pagamento estão em uma posição bastante desprivilegiada para encontrar bons negócios.
Em um contexto como o do Brasil, que possui um dos piores índices de recuperação de crédito do mundo, a importância das garantias é ainda mais evidente. Inclusive, recentemente o presidente do BC, Roberto Campos Neto, ressaltou a importância de aprimorar essa situação, ressaltando que temos taxas inferiores às de nações menos desenvolvidas, como Venezuela, Burundi, Zimbábue e Haiti. De acordo com estudos do Banco Mundial, um financiador com dívida inadimplente irá esperar, em média, quatro anos para recuperá-la e a expectativa é reaver 18 centavos a cada real perdido.
Felizmente, não faltam ações do mundo das fintechs no sentido de trabalhar melhor com as garantias. Por exemplo, uma pesquisa recente da PwC com a Associação Brasileira de Crédito Digital (ABCD) revelou um crescimento significativo no mercado de créditos com garantia, de R$ 2,6 bilhões, em 2019, para R$ 13,9 bilhões em 2022.
Interessante observar que, desde 2019, a oferta de produtos de crédito com garantias se manteve estável, enquanto produtos sem garantias cresceram de 23% para 26%. Paralelamente, a aceitação de garantias cresceu de 27% para 56% do crédito concedido. Estes dados, em conjunto com a nossa experiência conversando com players do mercado, nos sugerem que, apesar da evolução na aceitação de garantias, ainda há uma hesitação em incorporá-las de forma mais estratégica no momento do desenho do produto de crédito — e não no momento da renegociação de dívidas, porque já pode ser tarde demais.
Então, o questionamento que se impõe é: por que não desenvolver produtos que já incorporem garantias desde o início? A utilização estratégica de garantias pode levar a um ciclo virtuoso. Isso significa menor inadimplência, taxas mais competitivas e uma melhor seleção de pagadores no mercado. Esse aprendizado contínuo é chave para players que buscam se destacar em 2024 e além.
*Cesare Rollo Iacovone é fundador e CEO da Destrava Aí, fintech que oferece infraestrutura com foco em recebíveis de cartões.
Este é um espaço editorial, com análises e opiniões de especialistas de mercado e executivo(a)s com temas de interesse do ecossistema de fintechs. O Finsiders não se responsabiliza pelas informações do texto.
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