Por Ricardo Wendel*, exclusivo para o Finsiders
Sou empreendedor há quase 20 anos. Nos últimos seis, me dediquei a estudar, experimentar e me envolver em novas iniciativas de negócios em economia e finanças nos Estados Unidos, Europa e América Latina, áreas que representam o cerne do nosso capitalismo.
Mas foi no Brasil que comprovei uma tese com a Divi-hub, que venho perseguindo há um bom tempo: a necessidade de se criar um novo capitalismo, inaugurando um conceito que mantém o espírito criativo e empreendedor, que abraça a empatia e a real democratização do acesso ao capital e às oportunidades.
Para explicar melhor essa conquista, gostaria de falar de um caso real, sobre três mulheres negras, nordestinas (de Alagoas), jovens estudantes de graduação que criaram uma empresa pensando em fazer o mundo melhor. Essas jovens, além de corajosas, são extremamente competentes e inspiradoras.
Elas entendem como ninguém o seu espaço no mundo de uma forma proativa, gerando soluções inteligentes e necessárias. Juntas, fundaram o Amitis, um projeto de hortas hidropônicas que aproveita materiais como garrafas pet e pallets descartados para construir um sistema inovador para micro agricultura de alimentos orgânicos.
O sistema tem uma gestão simplificada, não é necessário ter conhecimento avançado para poder cultivar, a colheita ocorre com muito mais frequência e necessita de pouco espaço para a produção. E o melhor: a cada quatro sistemas vendidos, a empresa fornece uma horta totalmente sem custo para famílias vulneráveis que precisam complementar sua renda.
Para finalizar, o Amitis também cuida da logística de entrega dos produtos cultivados para os clientes que querem ter na mesa de casa alimentos de extrema qualidade. São tantos pontos positivos para descrever sobre o projeto, que precisaria de muito mais linhas aqui para explicar. Uma iniciativa incrível que fecha um ciclo positivo completo ambiental e social.
Qual seria a chance de Amitis acontecer em um mercado tradicional de angels, club deals, VCs, CVCs? Um mercado ávido por ‘unit economics’, tração de receita, CAC, LTV e todas essas métricas que o eterno modelo de Venture Capital demanda? Praticamente zero, infelizmente.
Os KPIs do Amitis são outros. A empresa precisava de capital para poder acelerar cada vez mais um círculo virtuoso de solução de problemas muito complexos como a fome, desigualdade, falta de dignidade, resgate do meio ambiente, empreendedorismo social e feminino, e muito mais. O mercado financeiro não tem olhos para isso, talvez empresas necessitando de um muro de arrimo para integração no ESG pudessem investir, mas não pelo conceito original.
Aí que entra a minha satisfação de poder afirmar que algo novo já surgiu! Esse ecossistema de dinheiro contido em uma diminuta parcela da população, gerido por Ventures e fundos que tem enorme pressão de performar, não é mais a única opção.
Amitis reuniu quase mil pessoas, que investiram uma média de R$115. Gente comum, não investidores. Gente que se apaixonou pelo trabalho brilhante das meninas. Gente que pode ter seu capital retornado e ainda melhorar nossa sociedade. Eles dividirão por cinco anos a receita bruta da empresa. Essa comunidade investidora é sócia, promotora e interessada. Está também nas mãos dessas pessoas a possibilidade de fazer Amitis vender mais e mais.
Isso é um neocapitalismo: pessoas percebendo que podem ter propriedade e retorno financeiro apoiando iniciativas que conversam genuinamente com elas. Gente que muito provavelmente não esteja ligando para um “exit” com múltiplos unicornianos, gente que na verdade não quer “exit” mas sim o contrário: entrar, participar e pertencer.
Se Amitis conseguiu, de forma orgânica, levantar o capital que precisava, qualquer outra empresa que traduza suas métricas em paixão também pode conseguir. Os não investidores podem fazer acontecer, basta espalharmos essa história.
Estou pronto para esse novo capitalismo, e você?
*Ricardo Wendel é CEO e fundador do Divi-hub, plataforma de investimento coletivo com foco em economia criativa, negócios descolados e impacto social.
As opiniões neste espaço refletem a visão de founders, especialistas e executivo(a)s de mercado. O Finsiders não se responsabiliza pelas informações apresentadas pelo(a) autor(a) do texto.
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