Eduardo Lopes/Zetta | Imagem: divulgação
Eduardo Lopes/Zetta | Imagem: divulgação

A derrota do Governo Federal com a perda de validade da Medida Provisória 1.303 reacendeu o debate sobre tributação das fintechs e criptoativos. A MP previa o aumento da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) para instituições financeiras não bancárias — entre elas as fintechs de crédito e meios de pagamento — e mudanças nas regras de tributação sobre aplicações financeiras e bets.

Apesar da derrota, o governo já deixou claro que pretende buscar novas formas de aumentar a tributação sobre o setor, seja por decreto, seja por ajuste de alíquotas.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou, em entrevista à rádio “Piatã FM” nesta quinta-feira (9/10), que a decisão representou “uma derrota do povo brasileiro”. “Eles acham que ontem derrotaram o governo? Derrotaram o povo brasileiro, derrotaram a possibilidade de melhorar a qualidade de vida do povo brasileiro, tirando mais dinheiro dos ricos e distribuindo para os pobres”, disse. Ele prometeu discutir uma nova proposta para que fintechs – “muitas maiores do que bancos” – paguem o imposto devido.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, confirmou que apresentará alternativas para compensar a perda de receita.

Alívio temporário?

Enquanto isso, o setor financeiro digital vê a derrubada da MP como um alívio — e um sinal de que o debate sobre tributação precisa considerar dados, não narrativas.

O presidente da Zetta, Eduardo Lopes, diz que o argumento de que fintechs pagam menos impostos do que os bancos “não se sustenta”. De acordo com levantamento da associação, que representa alguns dos maiores bancos digitais e fintechs do País, a alíquota efetiva média das fintechs em 2024 foi de 29,7%. Já os bancos pagaram 12,2%, considerando CSLL e IRPJ. “O discurso de que as fintechs são menos tributadas é equivocado. Na prática, elas já enfrentam uma carga proporcionalmente mais alta”, defende.

Eduardo também contesta a ideia de que há fintechs maiores do que bancos. Embora algumas tenham base de clientes maior, o volume de negócios ainda é concentrado no sistema tradicional. Conforme dados da Zetta, os cinco maiores bancos detêm 64% dos depósitos e 75% do crédito à pessoa física. E as cinco maiores fintechs somam cerca de 6% em cada caso.

Além disso, ele cita um relatório recente do Fundo Monetário Internacional (FMI), segundo o qual a competição trazida pelas fintechs reduziu em três pontos percentuais as taxas de juros cobradas pelos bancos entre 2020 e 2024. “Esse é um efeito direto sobre o spread bancário — e quem promove essa competição são as fintechs”, destaca.

Para o executivo, insistir no aumento da tributação apenas sobre o setor digital seria um contrassenso, por penalizar empresas que vêm ampliando o acesso ao crédito e à bancarização. “O governo precisa olhar para os números. Aumentar a carga das fintechs não resolve o problema fiscal e ainda compromete a concorrência e a inovação”, resume Eduardo.

Estabilidade e previsibilidade

Outras entidades também celebraram a decisão do Congresso. A Associação Brasileira de Fintechs (ABFintechs) afirmou que o resultado garante “estabilidade e previsibilidade” ao mercado, após semanas de incerteza. “Essa conquista mostra a força do setor quando atua de forma unida e estratégica”, declarou o presidente Diego Perez, em nota. Ele reforçou o papel das fintechs no desenvolvimento econômico e na inclusão financeira.

“A decisão representa uma conquista importante para o setor, ao evitar prejuízos imediatos e preservar um ambiente de negócios mais favorável. Por outro lado, permanece a preocupação com a narrativa de que as fintechs devem ser equiparadas aos bancos em termos de carga tributária. Declarações recentes do presidente da República e do relator da matéria, deputado Carlos Zarattini, indicam que o governo poderá buscar alternativas para elevar a tributação sobre o segmento por meio de decretos, ajustes de alíquotas, como no caso do IOF ou portarias do Ministério da Fazenda”, afirmou a ABFintechs, em nota.

Mais repercussão

Já a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) disse em nota que os bancos não atuaram contra a medida, ainda que tenham mantido diálogo com o Ministério da Fazenda. “Foram as fintechs e as empresas de apostas online que trabalharam ativamente pela rejeição da MP”, afirmou. A entidade disse, ainda, que as fintechs são bem mais lucrativas e com maior base de clientes do que grandes bancos. E que se utilizam de estratégias de planejamento tributário para reduzir o pagamento de impostos no Brasil. “Além de fintechs, empresas de apostas online (bets) também se opuseram firmemente à MP e continuarão pagando pouco imposto e drenando as finanças das famílias.”

A Associação Brasileira de Criptoeconomia (ABcripto), por sua vez, classificou a perda de validade da MP como “uma vitória do diálogo e da racionalidade regulatória”. Para a entidade, o texto aumentaria custos e insegurança jurídica, especialmente para pequenos investidores e exchanges locais. “A não aprovação da MP 1.303 mostra que o Brasil tem maturidade para discutir políticas públicas de forma transparente, ouvindo os setores impactados”, afirmou o CEO Bernardo Srur, também em nota.