Especialistas debatem novas normas para o mercado de ativos virtuais | Imagem: divulgação
Especialistas debatem novas normas para o mercado de ativos virtuais | Imagem: divulgação

O mercado já começou uma verdadeira corrida contra o tempo para se adaptar às novas regras impostas pelo Banco Central (BC) para a autorização e a prestação de serviços de ativos virtuais, que entram em vigor em 2/2/2026.

O consenso dos especialistas que participaram do evento “Nova Regulação Bacen do Mercado de Ativos Virtuais”, promovido pela consultoria CLA Brasil com o escritório Barcellos Tucunduva Advogados (BT Law) nesta sexta-feira (12/12), é de que a regulação de ativos virtuais representa um avanço necessário para dar credibilidade ao setor, reduzir ambiguidades jurídicas e aproximar o Brasil das melhores práticas internacionais. Por outro lado, para eles, inaugura um processo complexo de adaptação operacional, governança e supervisão.

Segundo o BC, a regulação define quem pode atuar no setor, quais exigências devem cumprir e como devem operar. Também enquadra determinadas transações com cripto como operações de câmbio ou capitais internacionais. O objetivo, diz a autoridade monetária, é aumentar segurança, transparência e prevenção a ilícitos, sem frear a inovação.

Regras redefinem governança e novos modelos

Conforme Thiago Amaral, sócio do BT Law, o avanço regulatório fica mais evidente quando se observam as três normas publicadas pelo BC. A Resolução 519 organiza o processo de autorização das Prestadoras de Serviços de Ativos Virtuais (PSAVs), praticamente espelhando o modelo das Instituições de Pagamento (IPs).

Já a Resolução 520 funciona como o coração do marco regulatório: estabelece regras de governança, políticas obrigatórias, padrões de comunicação com o usuário, auditoria e a exigência de segregação patrimonial. Por fim, a Resolução 521 atualiza a regulamentação de câmbio para acomodar operações com stablecoins e transações que passam a ser tratadas como câmbio ou capitais internacionais.

“Havia um preconceito de que trabalhar com meios de pagamento de cripto era high risk [alto risco], mas isso foi sendo quebrado. Aos poucos, fomos mostrando para bancos, Instituições de Pagamento e exchanges que era possível construir políticas, contratos e modelos de negócio firmes, até chegar ao diálogo que permitiu estruturar um mercado regulado de criptoativos”, disse.

Para Thiago, esse novo ambiente abre espaço para modelos como o “PSAV as a service“, em que uma empresa já licenciada oferece sua infraestrutura regulatória e operacional para que outras lancem produtos com cripto sem precisar obter autorização própria do BC.

O formato reduz custos e ajuda as companhias a colocar produtos no ar mais rapidamente. Com isso, fintechs, corretoras e plataformas digitais conseguem focar no produto e na experiência do usuário, enquanto terceirizam o back office regulado. “O regulador abriu um diálogo real com o mercado. As consultas públicas colocaram o dedo na ferida e permitiram construir, juntos, o que viraria a regulação”, completou.

Regime de adaptação e foco em stablecoins

Quem já estiver operando em fevereiro de 2026 terá nove meses para comprovar atividade prévia e ingressar em um rito especial de adaptação. Já quem não demonstrar operação antes dessa data deverá interromper as atividades. Trata-se de uma forma, segundo Pedro Henrique Nascimento Silva, auditor e coordenador do BC, de evitar rupturas, garantir continuidade aos players legítimos e retirar do mercado quem permanece irregular.

Para 2026, ele disse que o BC deve aprofundar a regulação de stablecoins — que respondem por 80% a 90% do volume global negociado, segundo dados informados pelo porta-voz do BC — e acompanhar o PL 4.308, voltado à supervisão dessas moedas digitais. Apesar dos avanços, Silva observou que o mercado ainda é “obscuro” para o regulador pela falta de granularidade dos dados, algo que deve mudar com o acesso direto às informações previsto nas novas regras.

“A crítica ajuda a melhorar a norma. Estamos abertos a ouvir, ajustar e evoluir”, disse, reforçando que a construção do mercado regulado de ativos virtuais depende da cooperação contínua entre empresas, consumidores e o regulador.

Maturidade das startups de cripto

Para Regina Pedroso, diretora-executiva da Associação Brasileira de Tokenização e Ativos Digitais (Abtoken), a nova regulação de ativos virtuais marca um ponto de virada porque obriga empresas, especialmente startups nativas de cripto, a tratar contabilidade, auditoria, segurança e compliance como pilares estruturais, não acessórios. Ela afirmou que o Banco Central está atento à origem e ao fluxo global do dinheiro, e que a supervisão será determinante para separar bons negócios de operações informais.

Regina também chamou atenção para a assimetria de impacto entre players. Segundo ela, o vigor da norma não pesa igual para todos e pode pressionar empresas pequenas que lutam para crescer.

Ainda assim, defendeu que a regulação é necessária para dar segurança ao setor e permitir que tokenização, stablecoins e outros modelos avancem com bases fortes. “O ideal é não deixar de estar atento aos movimentos do Banco Central, porque esse final de ano, janeiro e fevereiro serão meses muito importantes para o setor”, disse.