
O ano de 2025 foi definitivo na história do mercado de câmbio brasileiro. Essa percepção decorre, por exemplo, da publicação da Resolução BCB nº 542, nesta quinta-feira (18/12). A norma, que entrará em vigor em 2/2/2026, possibilita às corretoras de câmbio a prestação de serviços de intermediação de serviços de ativos virtuais e a emissão de moeda eletrônica (gestão de contas de pagamento pré-pagas).
O segundo semestre deste ano foi marcado pela publicação de normas que aumentaram barreiras de entrada e manutenção no setor financeiro. Apesar disso, a atividade normativa do Banco Central (BC) teve dois grandes contrapontos relacionados ao mercado de câmbio, especificamente quanto aos segmentos de criptoeconomia e de meios de pagamento. As manifestações da sociedade civil, com participação central da Associação Brasileira de Câmbio (Abracam), foram decisivas para essas opções regulatórias convergentes à agenda institucional BC#, em que a competitividade é um pilar.
A nova norma do BC alcança a competitividade, na medida em que permite aumento substancial da cesta de produtos das corretoras de câmbio. Ao agregar serviços de ativos virtuais e contas de pagamento à sua tradicional expertise em câmbio, as corretoras estarão aptas a fornecer soluções cada vez mais modernas e ajustadas às necessidades do consumidor de serviços financeiros.
Pensando nas novas regras publicadas em 2025, entendo que as corretoras de câmbio têm no Pix, na criptoeconomia e nos modelos de Banking as a Service (BaaS) fontes importantes de novas relações comerciais. Mas como fazer parte disso? É o que os próximos tópicos querem responder.
A participação no Pix
O Pix é o principal meio de pagamento do Brasil. Por essa razão, a oferta de serviços Pix tem impactos no relacionamento com clientes B2C e B2B, no cross-selling, na composição de marca e no valuation de instituições reguladas pelo BC. As corretoras de câmbio não eram elegíveis a participar no Pix. Isso porque não eram aptas a prover contas transacionais a seus clientes. É justamente este o ponto central da nova norma do BC: as corretoras poderão gerir contas de pagamento pré-pagas, que são contas transacionais, tornando possível a adesão ao arranjo de pagamentos Pix.

Para participar do Pix, o passo inicial que as corretoras de câmbio deverão tomar, após o dia 2/2/2026, é iniciar a emissão de moeda eletrônica e, portanto, a gestão de contas de pagamento.
A norma que trata desse tema, a Resolução BCB nº 80/2021, estabelece dois ritos procedimentais distintos para instituições autorizadas a funcionar pelo BC que pretendam prestar serviços de emissão de moeda eletrônica concomitantemente ao seu objeto social tradicional.
Ritos simplificado e autorização prévia
O primeiro desses ritos é mais simplificado, com previsão somente de comunicação formal ao BC com antecedência de 90 dias ao início da prestação de serviços. Ele é aplicável a:
- Bancos comerciais;
- Bancos múltiplos com carteira comercial;
- Caixas econômicas;
- Bancos múltiplos com carteira de crédito, financiamento e investimento;
- Cooperativas singulares de crédito;
- Sociedades de Crédito, Financiamento e Investimento (SCFIs, as financeiras);
- Fintechs de crédito – Sociedades de Crédito Direto (SCDs) e Sociedades de Empréstimo entre Pessoas (SEPs);
- Sociedades de Crédito ao Microempreendedor e à Empresa de Pequeno Porte (SCMEPPs);
- Sociedades Corretoras/Distribuidoras de Títulos e Valores Mobiliários (CTVMs e DTVMs)
As instituições não especificadas devem seguir o segundo rito, que é o da autorização prévia. Nesse caso, é necessário se valer das vias tradicionais de autorização de funcionamento. Deve-se, assim, submeter formulário disponibilizado no Manual de Organização do Sistema Financeiro (Sisorf). É bastante provável que o BC altere a norma para incluir as sociedades corretoras de câmbio no rol das instituições que precisam realizar somente comunicação.
Na sequência da emissão de moeda eletrônica, as corretoras de câmbio deverão submeter, via Protocolo Digital, pedido de adesão ao arranjo de pagamentos Pix direcionado ao Departamento de Competição e de Estrutura do Mercado Financeiro (Decem/BCB). A adesão compreende as etapas pré-cadastral, cadastral, homologatória e de operação restrita. Durante esse processo, a corretora de câmbio deverá decidir se participará de maneira direta ou indireta no Sistema de Pagamentos Instantâneos (SPI) e no Diretório de Identificadores de Contas Transacionais (DICT).
A escolha pela participação direta no SPI (que obriga a instituição a também participar diretamente no DICT) guarda consigo importante item de receita B2B. Nesse sentido, as corretoras de câmbio poderão firmar contratos com participantes indiretos, a fim de possibilitar as liquidações das operações desses players por meio da Conta Pagamentos Instantâneos (Contas PI).
Ativos virtuais no mercado de câmbio
A Resolução BCB nº 520/2025 estabeleceu que as corretoras de câmbio são instituições elegíveis à prestação de serviços de ativos virtuais. Em adição, a Resolução BCB nº 521/2025 definiu que os ativos virtuais referenciados em moeda fiduciária (stablecoins) integram o mercado de câmbio, independentemente da operação realizada. A nova norma, a Resolução BCB nº 542/2025, ratifica a relação cripto-câmbio das corretoras.
Há dois caminhos possíveis para a corretora de câmbio que pretende operar com ativos virtuais. Em primeiro lugar, elas podem iniciar imediatamente a prestação de serviços de intermediação. Caso o façam anteriormente a 2/2/2026, data de entrada em vigor da Resolução BCB nº 520/2025, elas terão até 30/10/2026 para comunicar formalmente ao BC sobre a prestação dos serviços, sem qualquer interrupção na atividade econômica.
Se, no entanto, preferirem iniciar a intermediação de ativos virtuais depois de 2/2/2026, terão de realizar uma comunicação formal com 90 dias de antecedência à prestação e — somente após o decurso desse período, sem manifestação contrária da autarquia — atuar no segmento cripto. Indica-se, é claro, adotar a primeira via.
Banking as a Service (BaaS)
A norma de regência de BaaS, a Resolução Conjunta CMN-BCB nº 16/2025, estabelece uma lista taxativa de serviços que podem ser objeto desse tipo de contratação. São eles: abertura, manutenção e encerramento de contas; pagamentos de serviços realizados por meio das contas; credenciamento; operações de crédito; e outros serviços determinados pelo BC.
Anteriormente à Resolução BCB nº 542/2025, assim como no caso do Pix, as corretoras de câmbio estavam excluídas da condição de prestadoras de BaaS. Isso mudou. A partir de 2/2/2026, será possível que as corretoras de câmbio prestem serviços para pessoas jurídicas constituídas no Brasil (entidades tomadoras de BaaS) que pretendam, via contrato de Banking as a Service, fornecer contas de pagamento a seus clientes.
Essa oferta de contas de pagamento, no contexto do BaaS, guarda ponto de contato interessante com os ativos virtuais: a segregação patrimonial.
Conforme determina a Resolução BCB nº 520/2025, as prestadoras de serviços de ativos virtuais (PSAVs) precisarão realizar segregação patrimonial. Isso vale tanto para moedas fiduciárias quanto de ativos virtuais. Para a primeira forma de segregação, essas instituições precisarão de contas de depósito ou de contas de pagamento. Por determinação da mesma norma, as PSAVs inaptas à prestação dessas contas precisarão firmar contratos de BaaS. Esta é também uma oportunidade que surge para as corretoras de câmbio: elas poderão ser as prestadoras de BaaS das contas de pagamento pré-pagas que as PSAVs terão de utilizar para segregação patrimonial.
What’s next? (o porvir)
A perspectiva para o segmento de câmbio talvez nunca tenha sido tão positiva. Em 2026, veremos as corretoras como vetores de inovação e de competitividade no Sistema Financeiro Nacional (SFN). Como ponto de dúvida, resta saber ainda o resultado da Consulta Pública nº 124 do BC, que esclarecerá a possibilidade de prestação de serviços eFX via BaaS.
Em um futuro próximo, poderemos observar uma corretora que concomitantemente realize intermediação de câmbio, intermediação de ativos virtuais, gestão de contas de pagamento e eFX. Isso tudo é positivo ao mercado financeiro, porque, quando ganham a competitividade e a concorrência, todos ganham.
*Advogado, professor especializado em regulação financeira e consultor jurídico e regulatório da GMS