POLÊMICA

Culpado ou inocente? O papel do Pix na explosão das 'bets'

Segundo consultor, o pagamento instantâneo reúne diversas condições favoráveis para as casas de apostas online

Bets, apostas - Imagem: Rawpixel/Freepik
Imagem: Rawpixel/Freepik

A novela dos jogos de apostas online, as bets, promete novos capítulos nos próximos dias. Nesta segunda-feira, 1/10, o governo divulgou uma lista com 199 empresas que estão legalmente autorizadas a operar, e aconselhou os consumidores a resgatar o dinheiro que estiver eventualmente em uma bet não autorizada.

Mas não vai parar por aí. Dividido entre o potencial de arrecadação e os riscos para a população, o governo busca saídas para cercear excessos. Ironicamente, a grande alavanca do crescimento das apostas online no Brasil é o Pix. Sucesso de público e de crítica, exemplo copiado globalmente, sua grande popularidade e aceitação facilitaram o acesso dos brasileiros a esses cassinos virtuais. E é ele que, agora, vai dificultar o aperto ao cerco que o governo vem prometendo promover.

Estudo da consultoria Gmattos mostra que a quase totalidade das transações de depósitos e retiradas das bets ocorre por meio do Pix. O pagamento instantâneo reúne diversas condições favoráveis para as casas de apostas: ausência de chargeback, alta usabilidade e conversão transacional, sem filtros restritivos de uso como nos cartões e liquidação instantânea 24×7.

Cartões

“Embora não tenha sido este o propósito, o Pix encaixou como uma luva nos requisitos ideais das bets e, não por acaso, o grande boom do seu crescimento coincide com a evolução do Pix no Brasil”, escreveu Gastão Mattos, sócio da consultoria, em seu LinkedIn. “A proibição legal do uso dos cartões não terá impacto, pelo simples motivo de que os cartões não são opção neste segmento.”

Do lado contra, estão setores da economia que já sentem os efeitos negativos sobre suas atividades. O “desvio” de dinheiro dos consumidores para esses jogos reduzem o montante que iria para investimentos, educação, varejo e até necessidades básicas.

Estudo recente realizado pelo Banco Central jogou ainda mais lenha nessa fogueira, alertando para o fato de que dos 24 milhões de apostadores brasileiros em 2024 (até agosto), 5 milhões são beneficiários do Bolsa Família. Essas pessoas teriam enviado R$ 3 bilhões às empresas de aposta utilizando a plataforma Pix, com gastos médios por pessoa de R$ 100. Desse total, 4 milhões (70%) são chefes de família (quem de fato recebe o benefício) e enviaram R$ 2 bilhões (67%) por Pix para as bets. Os números são baseados em estimativas de valores apostados em agosto de 2024 a partir de transações via Pix.

Ônus e bônus

O PL 3.626/2023 veio para regulamentar os jogos de aposta fixa, legais no Brasil desde a Lei 13.756, de 2018. Atualmente as chamadas bets, apesar de legais, por não estarem regulamentadas, não estão recolhendo tributos no Brasil. Estimativas conservadoras apontam para uma arrecadação de R$ 2 bilhões em 2024 – mas pode chegar a R$ 10 bilhões por ano, segundo cálculos do relator do PL, senador Angelo Coronel (PSD-BA).

A Secretaria de Prêmios e Apostas (SPA-MF), criada em 2024 para fazer o setor atuar de forma regulada e controlada, já publicou mais de dez portarias com todas as regras relacionadas às bets. As regras previnem lavagem de dinheiro, roubo de dados e envolvimento de menores de idade. Mas não trazem, até agora, limitações à propaganda na TV e aos meios de pagamento usados. Com o reinado do Pix, porém, a opção de proibir apostas com cartões de crédito ou de benefícios seria, de qualquer forma, inócua.