Se gerenciar as finanças de uma pequena empresa já é uma missão árdua, imagine fazer isso em uma grande varejista ou incorporadora, com contas em múltiplos bancos. A proposta da Datanomik, com seu “piloto de caixa inteligente”, é simplificar a gestão de tesouraria de empresas, com a consolidação dos dados financeiros num só lugar. No Brasil desde 2022, a fintech fundada no Uruguai se prepara para embarcar em sua plataforma produtos e serviços financeiros de terceiros. Ao mesmo tempo, vem acelerando o investimento em Inteligência Artificial (IA), mas com cautela – devido ao perfil da clientela.
Em conversa com o Finsiders Brasil, Gonzalo Strauss, CEO e co-fundador da Datanomik, conta que a empresa está fechando uma parceria com uma corretora de investimentos. “Devemos anunciar nos próximos meses”, diz, sem dar mais detalhes. Com esse acordo, a ideia é “plugar” produtos e serviços financeiros na plataforma, em um modelo de marketplace. “Queremos oferecer a melhor oferta para a política de investimento de cada empresa que atendemos, sempre mantendo nossa posição de player agnóstico.”
Gonzalo explica que a Datanomik está usando IA de forma progressiva, para aumentar a produtividade das equipes e também gerar insights comparativos sobre decisões passadas para as empresas clientes. “Não estou falando que a IA toma decisão sozinha, mas apostamos no uso de IA combinado com o potencial humano”, afirma.
O empreendedor reconhece a tendência dos agentes de IA – sistemas autônomos -, mas alerta sobre a tecnologia. “É preciso tomar cuidado sobre como utilizar esse tipo de solução, principalmente em relação à confiança dos clientes [no uso de IA para tomar decisões]”, diz.
Apesar desse desafio, Gonzalo vê mudanças à frente não apenas com a aplicação de IA, mas também com o avanço de recursos do Pix e do Open Finance, como as transferências inteligentes e os pagamentos em lote. Gonzalo cita, ainda, o Pix Automático, cujo lançamento será no mês que vem.
Desafios do Open Finance PJ
“Tudo isso será possível por meio da nossa plataforma. Assim, as tesourarias se tornarão cada vez mais estratégicas”, aponta ele. “Eu acredito que dinheiro tem que ter vida própria. Não deveria ter intervenção humana, se estiverem bem definidas as regras do jogo. Por exemplo, as políticas de investimento e liquidez, os limites de concentração de recursos em uma instituição ou outra.”
Autorizada desde janeiro de 2024 a funcionar como uma Instituição de Pagamento (IP), na modalidade Instituição de Transação de Pagamento (ITP), a Datanomik não está operando com a própria licença. E não é por falta de vontade. Segundo Gonzalo, o desafio está na evolução do Open Finance para pessoas jurídicas (PJs), que ainda engatinha quando comparado aos consentimentos dados por pessoas físicas. Em 2025, esse é um dos temas prioritários tanto para o ecossistema quanto para o regulador.
“O compartilhamento de dados via Open Finance por um MEI [microempreendedor individual] é diferente do que é feito por uma empresa de middle-market ou por enterprises“, exemplifica. “O mercado PJ tem uma complexidade que dificulta o desenho das APIs”, diz Gonzalo. Enquanto isso não avança, a Datanomik recorre a recursos de coleta de dados (screen scraping), assim como utiliza a infraestrutura da fintech Iniciador.
Na visão do empreendedor, o acesso a dados é o aspecto que mais importa na gestão das tesourarias, independentemente se essas informações vierem de um ambiente regulado como o Open Finance ou não. “O Open Finance é mais um canal e vai ajudar em nosso objetivo de apoiar as tesourarias a ter mais entendimento do seu caixa.”
Novos perfis de clientes
Fundada há pouco mais de três anos no Uruguai, onde nasceram Gonzalo e seu sócio Sergio Fogel (também co-fundador da dLocal), a Datanomik recebeu também em 2022 um aporte de US$ 6 milhões liderado pelo fundo norte-americano Andreessen Horowitz (a16z). Participaram, ainda, investidores como Canary, Nazca e Latitud, além de anjos do calibre de Conrado Engel, ex-CEO do HSBC, e Sebastião Mejia, fundador da Rappi, entre outros.
A startup prevê triplicar o faturamento até o fim do ano. Segundo o CEO, o plano é aumentar a carteira de grandes empresas, mas também chegar a negócios com um nível de complexidade menor. “No final do dia, independentemente do porte da empresa, as tesourarias são muito operacionais e com pouco olhar estratégico”, diz Gonzalo.
Atualmente, a Datanomik atende mais de 70 empresas no Brasil. Na lista estão, por exemplo, Magazine Luiza, CVC Viagens, Estapar, Flamengo e Cury Incorporadora. No total, são mais de 15 mil contas bancárias integradas, cobrindo mais de 6 mil CNPJs distintos. Ao todo, a plataforma monitora aproximadamente R$ 9 bilhões em ativos sob visibilidade (AUV, na sigla em inglês).
Comunidade de tesoureiros
Em outra frente, a Datanomik busca se tornar uma referência nas comunidades de tesouraria pelo Brasil, promovendo eventos e trocas entre pessoas da área. A própria equipe reúne diversos profissionais do segmento. “Temos pessoas com décadas de experiência em tesouraria. Nossa solução é feita de tesoureiro para tesoureiro”, define.
A startup também está anunciando uma parceria com a Association for Financial Professionals (AFP), principal órgão certificador global da área. O objetivo do acordo é impulsionar e melhorar a capacitação do mercado de tesouraria e de finanças corporativas no Brasil. A colaboração já resultou na criação de um conselho consultivo com cerca de 15 executivos financeiros de grandes empresas. Prevê, ainda, ações como reuniões mensais e participação no maior evento global do setor.