RANKING

Índice de Qualidade de Serviço do Pix, do BC, já influi na avaliação de fintechs

Investidores de fundos de 'Venture Capital' e até as próprias IPs usam a classificação como fiel da balança

Imagem: Canva
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Ainda pouco conhecido e divulgado, o Índice de Qualidade do Serviço (IQS) do Pix do Banco Central (BC) já vem sendo usado pelo mercado para valorizar (ou desvalorizar) fintechs. Ou seja: devido ao enorme sucesso de público e crítica, o Pix já virou moeda de troca. Quanto mais próximo das metas estipuladas pelo BC, e menos episódios de timeout (indisponibilidade de envio/recebimento), mais a fintech ganha pontos frente a clientes e investidores.

“Fundos de Venture Capital (VC) estão usando esse ranking para calibrar os preços (valuation) das fintechs nas operações de investimento ou M&A”, diz Charles Mendes, sócio e fundador do Bancão. Ele é consultor em Pix, Open Finance e Banking as a Service (BaaS).

“A gente acompanha esse indicador especialmente em casos de fintechs que oferecem Pix como produto central”, confirma Mariana Foresti, sócia do fundo de VC Honey Island. Ela explica que o fundo entra normalmente em estágio inicial da fintechs, quando ainda é muito caro para a empresa ser participante direta ou indireta do Pix. “Mas, se a empresa já estiver regulada, esse índice entra como parte de uma análise maior”, diz.

Mariana também acredita que o IQS do Pix pode ser um diferencial competitivo. “Quando a empresa está bem posicionada, a gente sabe que muitas vezes vai passar no compliance do cliente, no SLA. Isso coloca a empresa em outro patamar”, avaliou. SLA é a sigla para Service Level Agreement, que em português significa “Acordo de Nível de Serviço”. Por outro lado, ela destaca que empresas com grande volume de operações podem ter índices levemente mais baixos, o que precisa ser considerado com atenção.

Critérios

No processo de avaliação das startups, o Honey Island leva em conta critérios como engajamento da carteira, métricas como net dollar retention, unit economics e margens do negócio. “O time é fundamental, principalmente nesse estágio inicial. Também olhamos muito para a qualidade da tecnologia proprietária”, completou. Net dollar retention mede a porcentagem de receita recorrente retida de clientes existentes durante um período específico.

O Honey Island tem foco em fintechs e atualmente está finalizando os últimos investimentos de um fundo específico para o setor. “Fizemos 15 investimentos e devemos fazer mais dois ou três até o final do ano”, disse. O portfólio inclui empresas com perfis variados. Entre eles, desde pagamentos até infraestrutura de crédito e de softwares que se conectam a provedores de Pix, mesmo que não sejam participantes diretos do sistema.

O fundo, com sede em Curitiba (PR) tem R$ 30 milhões disponíveis atualmente e investiu cerca de R$ 40 milhões nas 15 empresas. Criado em parceria com a 4UM Investimentos, iniciou operações em 2022 e já teve uma saída: a da Transfeera, no ano passado.

“O IQS do Pix é realmente relevante na hora de contratar um fornecedor ou alguma instituição. E é um bom panorama para você entender como está aquela instituição”, diz Marcelo Martins, sócio do Iniciador. Segundo ele, no Open Finance está sendo construído algo semelhante. “Ainda não está pronto, mas essa é a visão que a gente tem, algo parecido com o IQS no Open Finance”. Marcelo é empreendedor, especialista em Open Finance e Pix e investidor-anjo.

Mas não é apenas para se valorizar perante investidores que o IQS do Pix vem sendo usado: para se “vender” para os clientes também. A Celcoin, por exemplo, aproveitou a “boa nota” em uma recente campanha de marketing, para atrair clientes.

Ranking

Em junho, último ranking disponível, mais de 890 instituições participaram, entre fintechs, bancos, cooperativas, financeiras e corretoras e distribuidoras de investimentos. Considerando apenas as fintechs – 183 Instituições de Pagamento (IPs) e Sociedades de Crédito Direto (SCDs), reguladas ou não reguladas – apenas 25 não atingiram a meta de disponibilidade do serviço fixada pelo BC. São elas as IPs 7Trust, Anspace, AQbank, Authpay, Belluno, Brasil Cash, BRX, Enoq Capital, Iugu, MB Investimentos, MT, Muito, Nel3Pay, OwenPay, Py2All, PayMeBrasil, Qesh, Saq, Smart Solutions, Wise e Woovi. E as SCDs Credifit, Credsystem, Sants e Numbrs.

Em relação a timeout, 39 tiraram nota D e 11 nota E – o restante levou nota máxima (A). No grupo das 11 com o pior desempenho do mês estão as IPs 7Trust, AQbank, Blu, Brinks, Conta Pronta, Corpx, HBI, PGWeb, Prover e Uzzzipay; e a SCD Numbrs.

E apenas 22 levaram nota C, D ou E em relação ao RDR – índice de reclamações não resolvidas. No último grupo (nota E) estão as IPs Astro, Atlas Brasil, BMB, Celcoin, Qesh e Transfero.

Na avaliação geral, que vai de 1 a 3, apenas 64 tirou 1 (a nota máxima). O restante tirou 2 – mas nenhuma tirou 3.

Como funciona

O BC divulga mensalmente o IQS, que foi criado para medir e comparar instituições financeiras e de pagamento. O índice tem como objetivo fornecer ao público informações claras sobre o desempenho de cada participante, promovendo mais transparência e embasando a escolha de consumidores, empresas e órgãos públicos. Em vigor desde julho de 2021, o IQS não tem caráter punitivo: mesmo instituições com desempenho abaixo do esperado não recebem sanções. Segundo o BC, a proposta é apenas incentivar a melhoria da prestação do serviço por meio da visibilidade dos dados.

O índice é composto a partir de três grandes grupos de indicadores. O primeiro deles é o Índice de Reclamações, que leva em conta a proporção de queixas recebidas por cada instituição, ajustada pelo tamanho da base de usuários (RDR), além de dois elementos adicionais. Um é a taxa de resolução dos problemas relatados, outro é o nível de satisfação do consumidor com a resposta recebida. Caso o cliente não responda à pesquisa de satisfação, as colunas correspondentes podem aparecer em branco na divulgação.

O segundo grupo de dados é o Índice de Disponibilidade. Ele mede o tempo em que os sistemas usados para realizar e receber transações Pix estiveram efetivamente disponíveis. O cálculo é feito a partir de dois subsistemas: o DICT, responsável pela consulta de chaves Pix, e o SPI, que executa as transferências entre contas. Ambos devem operar 24 horas por dia, sete dias por semana. Para aferir a disponibilidade, o BC compara as horas em que os sistemas deveriam estar funcionando com as horas em que, de fato, estiveram ativos. A meta estipulada pela autoridade monetária é manter esse índice igual ou superior a 99,9%, considerando uma média dos últimos três meses.

Fora do ar

O terceiro e último componente é o Índice de timeout, que registra a frequência de falhas de resposta dos sistemas, mesmo quando estes estão tecnicamente operacionais. Em termos simples, esse indicador mostra quantas vezes uma transação falhou ou demorou além do tempo considerado aceitável, prejudicando a experiência do usuário. Essa métrica ajuda a distinguir entre a simples indisponibilidade do sistema (quando está fora do ar) e o mau funcionamento em momentos em que o sistema deveria estar respondendo corretamente.

A divulgação do IQS ocorre até o dia 20 de cada mês, e os resultados são publicados em um painel de consulta que apresenta as notas individuais das instituições. O cálculo considera uma janela de três meses, atualizada a cada nova divulgação. Todos os detalhes metodológicos — incluindo fórmulas, critérios de avaliação e metas estabelecidas — são definidos e disponibilizados pelo próprio BC.