A expectativa em relação ao impacto do Open Insurance (Opin) no mercado segurador, com precificações mais ajustadas, melhor regulação dos sinistros e novas abordagens ao consumidor, segue elevada mesmo com o atraso na implantação do projeto. A demora, fruto do enorme desafio tecnológico que inclui a integração com o setor bancário, mas passa também pelo regulador, a Superintendência de Seguros Privados (Susep), não altera a percepção de que o Opin será transformador nos modelos de estruturação dos produtos.
“O mercado de seguros é a proxima grande revolução digital no setor financeiro. O que o mercado de seguros vive hoje é o que o mercado de pagamentos viveu há 10 anos”, comenta Jihane Halabi, sócia-fundadora do escritório Halabi Advogados, moderadora de uma das mesas de debate do FID23 — evento realizado pela Luceat em parceria com o Finsiders. Jihane se refere à quebra do monopólio das credenciadoras de cartões, Rede e Cielo, feita pelo Banco Central há uma década, que revolucionou os meios de pagamentos e fez surgir dezenas de outros adquirentes.
Em seguros, na avaliação da especialista, cabe à Susep ser este agente incentivador da inovação, do uso de novas tecnologias “e o sandbox é uma sinalização neste sentido”, colaborando para que o setor de seguros eleve a participação no PIB dos atuais 6,5% para 10%. A meta, estabelecida pela Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg) para 2030, inclui também elevar em 20% a população atendida por seguro.
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O sandbox, ao reduzir custos regulatórios e dar mais flexibilidade na criação de produtos, vem estimulando a criação de insurtechs com modelos sustentados no consumo maciço de tecnologia, que inclui captação, análise de dados e uso da inteligência artificial (IA). Um bom exemplo é a Darwin Seguros, que nasceu no sandbox e utiliza tecnologia, dados e IA para oferecer um seguro auto mais simples e acessível.
Na visão de Beto Barros, cofundador e co-CEO da empresa, o uso de tecnologia é o que pode levar o seguro auto a ultrapassar a barreira de apenas 20% da frota segurada no país e reduzir a concentração nas grandes seguradoras.
“Nos últimos dois anos, houve uma maior concentração no mercado segurador, em especial no auto. As empresas tradicionais responderam à piora da sinistralidade elevando o preço, sem muito dado ou uso de tecnologia para mitigar os efeitos no prêmio que subiu muito, mas fez reduzir a penetração do produto na sociedade”, afirma Beto.
A Darwin tem um produto que, destaca o executivo, “separa o bom do mal motorista” com a análise de dados para definir o perfil do cliente, como dirige, em que regiões, a velocidade média que utiliza etc. “Nosso produto pega motorista que hoje demora 10 anos para ter o melhor preço na seguradora e com uso de dados e tecnologia oferecemos a ele em semanas uma cotação mais justa”, explica o empreendedor, lembrando que haverá um efeito em todo o mercado com seguradoras incorporando tecnologia. “Se você pega os 10% a 20% dos piores motoristas e separa, é possível reduzir o preço da grande maioria em até 50%. Hoje, as seguradoras tratam todo motorista igual, nossa proposta é outra.”
A 180º Seguros, por sua vez, seguiu um caminho diferente. Recém-autorizada pela Susep a operar como seguradora, a insurtech atuou inicialmente como corretora, mas já “querendo virar seguradora”, conforme diz Mauro Levi D’Ancona, cofundador e CEO da startup.
“Sabemos que o Open Insurance será mais lento do que gostaríamos, mas o impacto será mais profundo do que imaginamos. Com o usuário compartilhando seus dados, haverá uma mudança em todos os elos da cadeia de seguros”, comenta Mauro, acrescentando que o desafio é ter plataformas que capturem dados e saibam trabalhar com a informação para que auxilie na tomada de decisão.
O executivo da insurtech cita também o impacto da IA no mercado segurador, que vai da precificação à ponta final, o CRM. “Risco e prevenção à fraude sofrerão um impacto relevante. Produtos cada vez melhores e mais adequados ao cliente. Muitas fintechs já usavam este conceito para melhorar o produto, mas sem a marca IA. Em regulação de sinistro, podemos reduzir o número de pessoas envolvidas, garantir um fluxo mais rápido. Na 180º, começamos focando no uso de IA na regulação de sinistro.”
Tecnologia e relacionamento com corretores
Jihane lembra, ainda, o Open Insurance sozinho não é capaz de mudar tudo, destacando que será necessária uma maior integração, via Open Finance, para que novos modelos de negócios inovadores surjam. “Esperávamos mais rapidez, mas não é o que ocorre. Tem detalhes tecnológicos importantes para que caminhemos mais aceleradamente. Talvez em 2025 veremos o retorno”, comenta Jihane Halabi, acrescentando que a IA terá papel importante no processo.
Uma iniciativa para integrar diferentes áreas das empresas, como vendas, marketing e atendimento, via IA, foi lançada recentemente pela Salesforce. O Einstein GPT é uma tecnologia geradora de CRM de IA, que fornece conteúdo criado por IA para todas as áreas de uma empresa. A promessa da Salesforce é transformar a experiência de cada cliente com recursos de IA generativa.
“Vivemos uma nova onda desde a criação do ChatGPT, que só em janeiro deste ano registrou 100 milhões de acesso. Quando falamos de IA Generativa há um ponto de inflexão que é o potencial de ensinar a máquina a tomar decisões e criar. O que a Salesforce fez foi unir IA Generativa com portfólio de soluções de CRM e levar para dentro das organizações para apoiar as equipes a tomarem decisões e serem mais eficientes”, afirma Fábio Couto, diretor regional de vendas da companhia.
Em relação ao potencial do Open Insurance, o executivo aponta, ainda, que as seguradoras precisam ter tecnologia para dar suporte a esta mudança. “Pode ajudar na redução de fraude e de sinistro ao utilizar a análise dos dados abertos dos clientes”, diz Fábio, citando um case de seguradora parceira na Salesforce nos Estados Unidos. A empresa utiliza telemetria para prevenir sinistros. Ao identificar que há riscos de tempestades em determinada região, informa o usuário via SMS para evitar o local, o que reduz sinistros. “Uso de IA, de big data para tomar decisão é essencial, saber transformar o dado em oportunidade faz a diferença.”
O co-CEO da Darwin destaca também a importância de desenvolver um bom relacionamento com os corretores. “Precisa ter um olhar também para o canal de distribuição de seguros. Em auto, por um bom tempo corretores e insurtechs não se aproximavam tanto”, comenta Beto, elogiando a criação do SPOC – Sociedade Processadora de Ordem do Cliente. “Gosto da ideia. É um bom canal. Precisamos trazer os corretores para perto da tecnologia e da inovação. Apoiamos, na Darwin, a busca por um canal com os corretores. Um produto mais simples, baseado em análise de dados, com preço melhor é bom para todos.”
*Jiane Carvalho é a jornalista convidada pelo Finsiders para cobrir o FID23.
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