Quem acompanha as apresentações do presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, já deve ter percebido que a fala do chefe da autoridade monetária está cada vez mais recheada de expressões de tecnologia e economia digital, numa tentativa de tentar entender (como todos nós) para onde caminham as transformações do setor financeiro.
“Não entender nada é ultimamente um estágio constante em que me sinto olhando as inovações no mundo financeiro”, reconheceu ele, durante evento organizado pela DrumWave, empresa de tecnologia que se propõe a criar uma poupança de dados. “Se pudesse voltar atrás para pensar o que eu gostaria de fazer, muito provavelmente uma das atividades enriquecedoras seria como resolver os problemas da humanidade com tecnologia.”
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As previsões do presidente do BC apontam para a construção de um agregador de serviços financeiros, reunindo num só lugar Pix, Open Finance, real digital, crédito, cash management, criptoativos, além de uma carteira virtual de dados.
“A gente acha que em algum momento, nos próximos dois ou três anos, vamos ver uma coisa como essa. Isso muda um pouco o eixo do mundo financeiro. A briga vai ser também por canal, e não só por produto, lembrando que quem for o canal vai ter a experiência de entrada do cliente naquele marketplace”, disse Roberto.
Na avaliação do presidente do BC, a tendência é que esse agregador tenha outras soluções, como seguros e serviços de saúde. “Isso diminui custos e aumenta a integração entre as coisas, mas principalmente é um grande produtor de dados”, afirmou. “Tenho crença de que é uma dimensão em que ainda não conseguimos avançar e talvez onde tenha grande parte do valor a ser capturado.”
O caminho está começando a ser pavimentado na direção de uma economia tokenizada, com monetização de ativos de forma digital, segura, encryption e baseada em tecnologia blockchain. É nisso que Roberto acredita. “Acho que isso vai avançar e, quando avançar, vai ser exponencial”, disse. “Hoje já vemos muitas aplicações, com NFTs, arte, propriedade, ideias e o dinheiro, com os criptoativos. E vemos também a entrada do metaverso. Achamos que isso é só o começo e vai interagir com o mundo de dados.”
Pix
Ao comentar sobre a agenda de inovação do BC, o executivo destacou a rápida popularização do Pix. Lançado há menos de dois anos pelo regulador, em um projeto que custou cerca de R$ 5 milhões, o sistema de pagamentos instantâneos já representa 70% do total das transferências financeiras eletrônicas de pessoas físicas, tendo atingido quase R$ 1 trilhão só no mês de agosto deste ano, com 497 milhões de chaves cadastradas, segundo o BC.
Segundo o presidente do BC, o Pix já gerou uma redução de algo como R$ 6 bilhões a R$ 7 bilhões do dinheiro de papel em circulação no país. “A economia já está ficando mais digitalizada. “O Pix só está começando. Tem muita coisa pela frente e para subir ainda”, comentou Roberto. “Vamos ter o Pix programado. A parte de utilities também já começou a usar o Pix, e vamos avançar nisso.”
Outra frente é a internacionalização, destacou ele, citando que participou nesta semana de uma reunião com os presidentes dos bancos centrais da Colômbia, do Uruguai e Peru, que querem fazer iniciativas semelhantes ao Pix. “Abrimos uma sessão em novembro, de seis dias, em que vamos mostrar basicamente tudo o que fizemos com o Pix. Nossa prioridade agora é América Latina, mas acho que tem chance de expandir isso aí.”
Open Finance
O Open Finance é um dos projetos mais ambiciosos do regulador. No total, já são quase 10 milhões de consentimentos de compartilhamento de dados de clientes e cerca de 350 milhões de chamadas de APIs por semana, conforme disse Otavio Damaso, diretor de regulação do BC, durante o Fintouch 22, evento da ABFintechs realizado nesta semana. Ao todo, são mais de 800 instituições participantes.
“Já começamos a ver o Open Finance em números, o que é importante para demonstrar o resultado prático do que estamos fazendo”, disse Roberto. “Ainda temos problema com a qualidade e homogeneização dos dados, e precisamos avançar nisso. Temos reuniões semanais sobre esse tema”, reconheceu o presidente do BC.
Real digital e mundo tokenizado
Com a criação do real digital, a CBDC brasileira, o BC quer avançar no movimento de tokenização e digitalização da economia, otimização de balanços e intermediação financeira, assim como a criação de novos modelos de negócios. Assim definiu o presidente da autoridade monetária.
“A moeda digital completa essa noção de que vamos para um mundo tokenizado. Em algum momento, os bancos vão olhar para seus balanços de forma tokenizada. Isso tem benefícios de funding, de securitização, de liquidação atomizada, de menor risco, além de aplicações para investment banking”, exemplificou Roberto.
Neste mês, o LIFT Challenge deu início à execução dos projetos selecionados. Das 43 propostas apresentadas, não apenas do Brasil, mas também de sete outros países (Alemanha, Estados Unidos, Israel, México, Portugal, Reino Unido e Suécia), nove foram escolhidas para acompanhamento [a lista completa está no site do BC].
Os projetos de aplicações foram os mais variados, com aplicações de entrega contra pagamento (DvP), pagamento contra pagamento (PvP), internet das coisas (IoT), finanças descentralizadas (DeFi) e soluções de pagamentos quando tanto o pagador quanto o recebedor se encontram sem acesso à internet (dual offline).
A ideia é ter um piloto do real digital pronto no começo do segundo semestre de 2023, contou Roberto. “É o projeto que dou mais atenção hoje. Estamos fazendo reuniões semanais”, disse. Para ele, a moeda digital vai gerar uma “intermediação financeira mais barata”, com impacto no spread de crédito. “No final das contas, é uma parceria público-privada porque os bancos vão desenvolver um pedaço da tecnologia”, afirmou.
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