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Na terça-feira (11), a Stone surpreendeu o mercado ao fazer uma oferta para comprar a Linx por R$ 6,045 bilhões, pagos em cash (90%) e o restante (10%) em ações. A operação, de sinergias óbvias, resultaria em um negócio de 375 mil clientes e com receita de R$ 3,6 bilhões, conforme apresentação divulgada pela Stone para detalhar a transação.
Mas a Totvs resolveu entrar na disputa e fez uma proposta de combinação de negócios com a Linx por R$ 6,1 bilhões. As propostas feitas por Stone e Totvs devem ser analisadas em assembleia de acionistas da Linx.
Stone e Linx
Com a integração, a Stone está evoluindo para se tornar o “one-stop-shop” do comércio, disse a empresa de pagamentos ao defender o acordo. “Um belo movimento”, como define à Finsiders um executivo que soma 15 anos no setor de pagamentos, com passagens por grandes instituições financeiras.
“A complementariedade dos dois é o mais interessante. A Stone ganhará um novo footprint e integrará cada vez mais seus produtos aos varejistas e a Linx poderá também expandir por meio da Stone. Ambos proporcionarão um melhor aproveitamento da cadeia de valor, que tem visto redução das margens nas transações e terá ainda mais pressão após o lançamento do PIX. Aumentar o leque de serviços será fundamental.”
A Linx tem uma participação de 45,6% no varejo brasileiro, o que representa 70 mil varejistas, para os quais a Stone poderia prestar serviços, destaca relatório assinado pelos analistas Eduardo Rosman e Thomas Peredo, do BTG Pactual. “Além dos serviços de pagamento, a Stone também tem espaço para vendas cruzadas de serviços financeiros na base de clientes da Linx”, escrevem os analistas.
Competidor de peso
De fato, a combinação dos negócios criaria um competidor de peso no mercado de pagamentos, colocando a pulga atrás da orelha nos concorrentes diretos da Stone, como Rede, GetNet, PagSeguro, mas principalmente Cielo, que tem sido visto por analistas e executivos de mercado como a mais afetada pela guerra das maquininhas nos últimos anos.
Para o especialista Bruno Diniz, sócio da consultoria Spiralem e head para a América do Sul da FDATA (Financial Data and Technology Association), o negócio preocuparia especialmente os concorrentes de capital aberto, com destaque para a Cielo.
Bruno Diniz: “A Cielo tinha um market share grande e vê alguns pequenos comendo cada vez mais fatia de mercado.”
Para Diniz, Rede (Itaú) e GetNet (Santander) têm maior flexibilidade para pensar em sinergias internamente, ao contrário da Cielo, que tem como sócios controladores BB e Bradesco. Ou seja, seria mais fácil para Rede e GetNet fazerem novos movimentos para apimentar a disputa com a Stone. “Para a Cielo, é mais complicado por conta dos acionistas”, diz.
Em relação ao cenário competitivo, Bruno Diniz acredita que a PagSeguro ainda pode surpreender. Há três anos, a empresa controlada pelo grupo UOL adquiriu a fintech Biva. Em 2019, o grupo comprou o controle do banco BBN. E tem feito novos esforços para diversificação do portfólio.
Bruno Diniz: “PagSeguro tem as raízes ligadas ao digital, independência e uma base diversificada de clientes de ponta a ponta. Podem, obviamente, ampliar o portfólio.”
Dos R$ 89 bilhões em volume total de pagamentos processados (TPV, em inglês) em transferências eletrônicas de fundos (TEF) da Linx, a Rede abocanha 40%, enquanto Cielo fica com 20% e GetNet, 12%, segundo os analistas do BTG Pactual.
Eduardo Rosman e Thomas Peredo, do BTG Pactual: “Existem desafios de integração e a Stone deve manter seu mantra de serviço de qualidade, mas no geral o M&A foi um grande negócio para Stone e nos deixa mais otimistas sobre as ações.”
Minoritários
No dia seguinte à oferta feita pela Stone para comprar a Linx, o mercado começou a questionar o acordo de não competição para os fundadores da Linx na fusão com a Stone. Seria um subterfúgio para pagar um valor mais alto para esses acionistas, em detrimento dos minoritários. O alerta partiu do gestor Fabio Alperowitch, da Fama Investimentos, que detém uma fatia de 3% das ações da Linx.
Em carta aberta, Alperowitch apontou que o valor total a ser recebido pelos principais executivos da Linx seria de aproximadamente R$ 1,2 bilhão, o que significaria um total de R$ 46 por ação, prêmio de aproximadamente 35% sobre o valor a ser recebido pelos minoritários. Leia a íntegra da carta.
A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) abriu, na última quinta-feira (13), dois processos administrativos para analisar a transação. Um diz respeito a “notícias, fatos relevantes e comunicados” e outro é sobre “incorporação”.
Totvs e Linx
Na sexta-feira (14), a Totvs divulgou uma proposta de combinação de negócios com a Linx por R$ 6,1 bilhões. Em apresentação, a empresa comandada por Dennis Herszkowicz, ex-executivo da Linx, defende que a transação criaria a maior empresa de SaaS da América Latina, com receita líquida pro-forma consolidada de R$ 3,2 bilhões.
A projeção é que o mercado de software como serviço tenha um crescimento de 22% na América Latina ao longo dos próximos três anos, nas contas da consultoria IDC.
Na apresentação, a Totvs destaca o fortalecimento de um ecossistema de três dimensões: core (ERP, RH e verticais), techfin (crédito, serviços e pagamentos) e business performance (vendas e marketing).
Techfin
Em techfin — como a Totvs tem destacado seu avanço no setor financeiro — , a combinação dos negócios resultaria no melhor das soluções de pagamentos da Linx com a plataforma de crédito B2B da Totvs.
No ecossistema de crédito da Totvs, há a plataforma da Supplier focada em PMEs, comprada no ano passado por R$ 455 milhões.
A companhia destaca também a solução “Totvs Antecipa”, com oferta de crédito para a base de clientes, além de um FIDC de R$ 1 bilhão para incentivar a estratégia de empréstimos, assim como as parcerias com Creditas e banco BV.
Bruno Diniz: “Quando falamos de Totvs e Linx, vejo a união de duas techfin, que nasceram com pegada de tecnologia e ERP e estão caminhando para o setor financeiro. Mas a junção de Stone e Linx parece ter uma captura de sinergias maior.”
Diversificação
Isso porque a Stone já vinha expandindo seu portfólio. Neste ano, a companhia de André Street comprou a startup de saúde Vitta, a empresa de gerenciamento de redes sociais mLabs, a plataforma de entrega de comida Delivery Much e a MVarandas, de tecnologia para food service.
Para Diniz, é o próximo passo da briga que começou como uma guerra em função de preços. Segundo o especialista, o segmento está se tornando mais “commoditizado” e isso tem feito os principais players se mexerem para ampliar a oferta de produtos e serviços para o cliente.
A ver os próximos capítulos da história.