Por Adilson Martins, Maurício do Valle e Ricardo Marín*, exclusivo para o Finsiders
O volume de transações de crédito que não foram liquidadas, os chamados NPLs (Non Perfoming Loan, em inglês) vem crescendo fortemente no Brasil. Neste ano, pode ultrapassar os R$ 72 bilhões, o que significará um recorde de transações, conforme estimativa da Deloitte. A análise do mercado também aponta que mais de R$ 16 bilhões já foram transacionados no Brasil em 2023.
Uma das causas para esse movimento é a inadimplência que, em abril, atingiu 71,4 milhões de brasileiros, segundo a Serasa Experian. Uma população, entre pessoas físicas e jurídicas, que enfrenta aumento no custo de vida e queda na renda familiar. O resultado é a dificuldade em honrar as próprias dívidas, podendo levar à redução do fluxo de caixa das instituições financeiras.
Por isso, cada vez mais, as organizações monitoram de perto seus portfólios para avaliar a qualidade de seus ativos e a saúde financeira geral. O aumento dos índices de inadimplência e endividamento observados desde meados de 2021 tem impactado negativamente os resultados dos credores e estão exigindo ações rápidas, como provisões para perdas ou estratégias diferenciadas para recuperação de crédito.
Dentre as medidas, por exemplo, está a cessão dos NPLs para outras instituições ou investidores especializados em recuperação de dívidas. Ainda que a venda seja feita com desconto, o que permite resgatar parte do valor emprestado, a transferência do risco e responsabilidade para o comprador não só disponibiliza recursos imediatos para o cedente investir no seu ‘core business’, como pode trazer alívio nos indicadores de provisionamento, risco de crédito e antecipar benefícios fiscais.
Potencial
Mesmo com o rápido crescimento de transações de NPLs nos últimos cinco anos, o mercado brasileiro ainda está num patamar de transações muito menor quando comparado a mercados que adotaram estratégias de desalavancagem.
Segundo o levantamento da Deloitte, em média, se comparado a países europeus, o volume transacionado no Brasil no Sistema Financeiro Nacional (SFN) é oito vezes menor do que Itália e Grécia entre 2019 e 2020. Espanha e Reino Unido, países com menor saldo transacionado no mesmo período, têm média de operações quatro vezes maior que a nacional.
Embora já venha numa crescente, o segmento brasileiro, que recentemente passou por uma modernização na legislação, ainda tem muito terreno para expandir. Por aqui, o percentual médio do estoque de NPL, movimentado entre 2019 e 2020, chegou a apenas 4% do estoque de NPLs — este percentual contempla créditos em atraso a partir de 90 dias e já baixados a prejuízo.
Cooperativas
A venda de créditos não performados faz parte da régua de cobrança e da estratégia dos grandes vendedores. E pode ser uma alternativa para organizações, cuja estrutura não possui uma área de cobrança tão pragmática quanto a dos bancos. É o caso das cooperativas que, tradicionalmente, têm uma relação mais próxima dos associados. Não por acaso, essas instituições são baseadas no princípio da cooperação, em que os membros são tanto donos quanto usuários, uma estrutura completamente distinta dos bancos.
No ano passado, o Banco Central (BC) chegou a destacar que as cooperativas iriam ocupar um espaço maior no mercado financeiro. A expectativa surgiu após a sanção da lei complementar nº 196/2022 que atualizou diversas regras do cooperativismo de crédito e, embora tenha possibilitado a oferta de novos produtos, também trouxe grandes desafios. Entre eles, aprimorar a governança e a estrutura organizacional, peças fundamentais para a expansão desse segmento.
Levando em consideração que os NPLs, se não bem administrados, podem representar perdas significativas, é fundamental que as cooperativas tenham como aliado um sistema de inteligência para que o crédito seja concedido com qualidade e, ao mesmo tempo, as organizações tenham mecanismos capazes de recuperar e administrar as carteiras.
Essa pode, portanto, ser uma estratégia inteligente para fomentar o crescimento das instituições, permitindo o foco na sua atividade principal, que é oferecer serviços financeiros e crédito a seus cooperados de forma segura e sustentável.
*Adilson Martins é sócio de risk advisory, Maurício do Valle é diretor de recuperação e
reestruturação de empresas, e Ricardo Marin é sócio de financial advisory, todos da Deloitte.
As opiniões neste espaço refletem a visão de founders, especialistas e executivo(a)s de mercado. O Finsiders não se responsabiliza pelas informações apresentadas pelo(a) autor(a) do texto.
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