Há cerca de um mês, Paulo David (foto), cofundador e CEO da AmFi, fintech de infraestrutura de crédito em tecnologia blockchain, contou ao Finsiders que aguardava o ‘sinal verde’ da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para ofertar seus tokens em uma plataforma de crowdfunding. Pois bem. Nesta semana, o regulador concedeu a autorização para que a empresa possa seguir com a iniciativa e distribuir seus ativos de forma pública.
Com o movimento, a fintech poderá oferecer seus pools de liquidez (liquidity pools), que usam como garantia ativos tradicionais, a exemplo de recebíveis de cartões e duplicatas, para ser a ponte entre fintechs que atendem PMEs e buscam crédito e os investidores de varejo, além dos investidores qualificados.
Para que as empresas possam distribuir os tokens publicamente, além de operarem como plataformas de crowdfunding, elas precisam solicitar autorização prévia, estar registradas junto ao órgão e fazer captações de até R$ 15 milhões, com o prazo limitado a 180 dias.
“Agora, podemos falar abertamente sobre o que estamos fazendo e realizar a distribuição pública dos ativos. Podemos trazer cada vez mais investidores para as operações que estamos estruturando”, afirma Paulo, em conversa exclusiva com o Finsiders.
Neste sentido, a AmFi já pensa em fazer sua primeira oferta pública ainda em setembro. Os parâmetros da operação ainda não foram definidos, mas o produto de entrada da AmFi atualmente é de investimento de R$ 1 mil. E, segundo as regras da CVM, o investidor de varejo pode aplicar até R$ 35 mil no ano-calendário em ofertas deste tipo.
‘Bolsa de tokens’
Para o próximo ano, a AmFi prevê inserir ainda mais tecnologia na sua plataforma. Hoje, a fintech faz diversas integrações com o sistema financeiro tradicional ao se conectar com infraestruturas bancárias e registradoras de ativos. A equipe tem experiência no setor — das 14 pessoas que formam o time de tecnologia e produto, cada profissional possui, em média, cerca de sete anos de mercado.
No pipeline de ajustes para atender às exigências da CVM, o compliance foi um dos principais aspectos afetados, para identificar os riscos das operações, considerados de alta complexidade. Paulo explica que o regulador sinalizou de forma positiva sobre a construção de um mercado secundário de tokens — algo nos moldes do Mercado de Startups, da SMU, que faz parte do ambiente do sandbox regulatório –.
Esse tipo de iniciativa pode trazer mais liquidez para os investidores. “Para quem vende, o que gera mais valor para o investidor é a liquidez, já que ele pode se desfazer de um ativo e aproveitar uma outra oportunidade. No Brasil, não existe isso com os recebíveis. Os FIDCs [fundos de investimento em direitos creditórios] são muito engessados. Então, quando a gente faz isso com segurança e controle é uma enorme vantagem”, diz o CEO da AmFi.
Ele conta que a fintech vem evoluindo em termos de aplicação e regra de negócio. O passo seguinte é usar os smart contracts (contratos inteligentes) como gatilhos nas operações, colocando todo o potencial da tecnologia blockchain no jogo para executar determinada ação em caso de atraso no pagamento de uma das partes, por exemplo.
Foco em investidores qualificados
Outro ponto é que a AmFi deve fazer um lançamento internacional para fundos estrangeiros e investidores dos Estados Unidos. Segundo o executivo, as altas taxas de juros no Brasil despertam a atenção dos ‘gringos’. “Os investidores principalmente dos EUA olham muito para as taxas de juros no Brasil, uma das mais altas do mundo. A gente antecipa isso com uma taxa de 20%. Então, se torna muito atrativo”, diz o empreendedor.
Atualmente, a fintech possui ativos com rentabilidade entre 17% a 18% ao ano, mas que chega a 30% quando se trata de um ativo judicial, seguindo o maior grau de risco.
Mesmo com a possibilidade de chegar ao varejo, a estratégia da AmFi continua sendo ganhar espaço entre os investidores qualificados. “O varejo não é o foco, ainda que tenha um grande espaço. Temos focado em investidores qualificados, com operações maiores e um pouco mais de flexibilidade”, comenta Paulo.
Isso vem consolidando a expansão da fintech. Em 2023, a empresa já realizou 35 operações, processou mais de 3 mil ativos financeiros e registrou crescimento de 107% na receita a cada mês. São 500 investidores qualificados cadastrados na plataforma, sendo 151 ativos. O objetivo é chegar a dezembro com 50 originadores e R$ 500 milhões ofertados.
Rumo à economia tokenizada
Sobre o bom desempenho, o CEO diz que dois fatores favorecem a operação da AmFi. O primeiro é que a oferta de antecipação de recebíveis de cartões ou duplicatas não está disponível facilmente nas plataformas de corretoras.
O segundo é a visão da CVM e do Banco Central (BC) de tokenizar a economia brasileira. A personificação dessa tendência, inclusive, é o Drex, a versão digital do Real que começa a realizar as suas primeiras transações em fase piloto. “Caminhamos para ser o primeiro país do mundo a ter uma economia tokenizada“, aponta Paulo.
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