No Venture Capital, boas e más práticas virão à tona em 2023

O ajuste no valor estimado das startups escancarou a falta de responsabilidade de alguns gestores de Venture Capital, analisa Thiago Gramari

Por Thiago Gramari,*, exclusivo para o Finsiders
Depois de um ano difícil para startups e empresas de tecnologia em termos de captação de recursos por meio de Venture Capital, acredito que temos a chance de ver em 2023 o quanto o ecossistema brasileiro amadureceu com a digitalização, os crescentes avanços tecnológicos e o os desafios de acesso a capital. É um ano em que podemos avaliar a viabilidade e resiliência dos modelos de negócios das startups, mas principalmente o comportamento dos fundos de investimento.

Essa oportunidade se dá por conta da conjuntura econômica que vivemos, não só no Brasil, mas em toda a América Latina e nos Estados Unidos. Em 2020, muitas empresas enfrentaram desafios diante da instabilidade gerada pela pandemia e, ao mesmo tempo, cresceu a demanda por soluções digitais, impulsionando o desenvolvimento e a escala de startups que resolvem problemas da sociedade.

O crescimento do setor culminou no boom de Venture Capital em 2021, atingindo um volume recorde no país e no mundo. No ano passado, com a mudança de cenário, surgiu a necessidade urgente dos negócios olharem para gastos com maior cuidado a fim de buscar um ponto de equilíbrio, muitas vezes recorrendo a layoffs.

Ainda que o ritmo tenha diminuído e o clima seja de dúvidas, reforço que empresas boas continuam recebendo investimentos. Uma prova disso é que a captação de recursos atingiu um novo recorde anual no fim do terceiro trimestre de 2022, quando o total captado por gestores na América Latina superou o valor do ano anterior. Além disso, o Brasil lidera no volume de capital comprometido, ou seja, que ainda não foi alocado, e reporta números fortes em comparação com os últimos anos. O que muda a partir de agora é como esse dinheiro vai ser investido.

Primeiramente, é preciso saber que há boas e más práticas de investimentos. Os ajustes no valor estimado das startups e a realização de rodadas com down round escancarou um problema: a falta de responsabilidade de alguns gestores no mercado, que muitas vezes colocavam montantes maiores que o necessário e justo para a fase do negócio, com nível de diligência baixo, bem como fundadores que viram vantagem em captar a um valuation mais “esticado” e agora estão entendendo a importância do valor de cada rodada. Aí está a importância de investir de forma responsável, para viabilizar o crescimento da empresa, mas não a qualquer custo.

Thiago Gramari, diretor do BizHub Ventures. Foto: Divulgação
Thiago Gramari, diretor do BizHub Ventures. Foto: Divulgação

O que está acontecendo desde o ano passado é a busca por minimizar os riscos. Em vez de fazer rodadas sozinhos, os fundos estão optando por coliderar junto a outros pares. Também vemos um aumento da participação de corporações por meio do Corporate Venture Capital.

Players importantes do mercado estão apostando em retorno estratégico, muito além do financeiro, ao investir em empresas com modelos validados, que precisam de um empurrão para entrar no mercado e alcançar a escalabilidade. As vantagens para esses players é resolver uma dor interna, melhorar a experiência do cliente ou até mesmo gerar uma fonte nova de receita.

Aqui no BizHub Ventures, nossa premissa é apostar apenas em empresas B2B que consigam abrir mercado oferecendo soluções aos clientes da consultoria A&M, de forma que possamos acelerar o crescimento e a expansão por meio do smart money.

Consideramos que um bom investimento envolve uma startup com modelo de negócios validado, liderada por pessoas que demonstram resiliência em meio a crises e capacidade de pivotar se preciso. Ainda que nesse momento seja preciso avaliar se a empresa tem perspectivas de alcançar o breakeven, o mais importante é encontrar pessoas que querem resolver dores importantes e moldar o futuro.

Podemos observar isso nos diferentes perfis de startups investidas pelo fundo. Há empresas que não conseguiram lidar com a crise, outras apelidadas de “camelos”, que amadurecem mais devagar e conseguem um equilíbrio entre custos e receita, e também aquelas que jogaram o jogo do Venture Capital “versão 2021”. As últimas são startups que desenvolveram soluções latentes para o mercado e estratégicas para alguns setores e receberam aportes de gestores de Venture Capital e de corporações interessadas em investir, mesmo que queimem caixa nos próximos dois anos.

Não faltará dinheiro para empresas boas, que tenham soluções que resolvam grandes dores do mercado e que tenham em seu horizonte o atingimento do equilíbrio entre receitas e despesas, principalmente em setores pouco atendidos, por exemplo, marketplaces, em especial ligados a área de saúde, empresas cibersegurança, mobilidade e cidades inteligentes, que tendem a crescer no longo prazo. Neste ano teremos a chance de ver esses negócios crescerem, enquanto o mercado vai se ajustando à nova realidade e os bons investimentos vão se revelando.

*Thiago Gramari é diretor do BizHub Ventures, plataforma de inovação da consultoria Alvarez & Marsal (A&M).

As opiniões neste espaço refletem a visão dos especialistas e executivos de mercado. O Finsiders não se responsabiliza pelas informações apresentadas pelo(a) autor(a) do texto.

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