Artigo | Como o 'embedded finance' pode mudar o Brasil

Por Gaston Irigoyen, John Paz e Bruno Martucci*, exclusivo para o Finsiders

Bill Gates já dizia em 1994: “Banking is necessary, but banks are not”. Em português, podemos dizer que o sistema bancário é necessário, já os bancos não. Muitos anos se passaram e, hoje, mais do que nunca, esse conceito ficou evidente com milhares de fintechs provendo serviços financeiros para que outras empresas os incluam na jornada de experiência do consumidor.

A integração desses serviços virou realidade em várias indústrias e setores, como companhias aéreas, varejistas, empresas de logística, seguradoras, marketplaces diversos, operadoras de telecom, aplicativos de mobilidade e delivery. Desta forma, muitas empresas vêm se preparando para lançar produtos financeiros integrados para atender aos seus clientes e parceiros de forma mais completa.

Apesar do termo complicado, a proposta conhecida como ‘embedded finance‘ nada mais é do que a oferta desses serviços financeiros que vem complementar a proposta de valor como parte de seus produtos. Para o usuário, a experiência é mais completa. No mesmo ambiente em que o consumidor faz uma compra, já é oferecida a opção de crédito para pagamento.

A oferta dos produtos é customizada e personalizada de acordo com a necessidade de cada cliente. Eles incluem qualquer processo relacionado ao gerenciamento de dinheiro, como pagamentos, transferências, empréstimos, contas digitais, cartão físico ou virtual, possibilidades diferentes de pagamentos, recargas, transferências e até serviços mais complexos como investimentos, produtos de crédito e seguros.

Para os consumidores, os benefícios estão ligados à facilidade de uso com a oferta integrada e o preço mais atrativo customizado de acordo com a necessidade do cliente.

Imagine, por exemplo, ter a possibilidade de financiar sua viagem ou mesmo comprar um seguro viagem no momento da compra de uma passagem com apenas um clique, sem a necessidade de tratar dessas transações com um terceiro. Ou mesmo, apps de mobilidade pagando a seus motoristas de forma imediata e tornando possível transacionar e/ou pagar contas direto do aplicativo da empresa. Outro exemplo comum é, ao fazer compras no supermercado, pagar uma conta ou efetuar recarga de celular.

Hoje, a criação de serviços financeiros não precisa mais ser feita por meio de bancos, nem mesmo é necessário depender deles para criar ou capturar o fluxo de informação para um produto financeiro. Assim, empresas de outros setores como de varejo, mobilidade e marketplaces passam também a oferecer serviços financeiros.

Desta forma, o ‘embedded finance’ amplia a oferta de produtos e serviços, podendo aumentar o ‘lock-in’ positivo entre empresas e usuários. Além disso, funciona como um propulsor que facilita a compra de produtos, no caso de crédito, ou fortalece a proposta de valor daquela empresa ao oferecer contas digitais, seguros, entre outros.

Não significa somente uma fonte adicional de receita, mas uma proposta de valor forte e que será a única forma de acesso a serviços financeiros para muitas pessoas desbancarizadas. Também permite que as empresas tenham novos e diversificados rendimentos, de forma segura e sem riscos.

Todo esse processo citado acima, foi acelerado pela transformação digital, que está acontecendo nos últimos anos e foi acelerada com a pandemia. Fez com que a população mundial, cada vez mais, tenha acesso à internet móvel e de alta velocidade, smartphones com mais recursos, possibilitando que milhões de pessoas entrassem em uma curva de aprendizado forçada positiva e um processo de educação sobre ferramentas financeiras. O que poderia levar de três a cinco anos, ocorreu em seis meses, e muitos passaram a fazer compras, pagamentos, envio de dinheiro e até operações financeiras mais complexas e investimentos por smartphones.

Pensando apenas no Brasil, soma-se isso ao Open Banking e à grande adesão dos brasileiros ao Pix, por exemplo. Isso significa um acesso altíssimo à informação financeira, como formas de pagamentos, juros e tudo que envolve esse setor, o que faz com que as pessoas sintam mais confiança e segurança ao fazer transações financeiras através de seus celulares.

De acordo com estudos de Simon Torrance, o ‘embedded finance’ oferece uma nova oportunidade de mercado muito grande, que vale mais de US$ 7 trilhões em dez anos, duas vezes o valor combinado dos 30 maiores bancos do mundo hoje.

A nova tendência tecnológica mundial chegou para transformar e mudar a forma tradicional que conhecemos de pagamentos hoje no Brasil. O país vem criando as bases para ter as finanças embarcadas de forma orgânica e acessível, mas ainda tropeça no desenvolvimento da área tecnológica e processos arcaicos que foram desenhados nos anos 90, baseados em processamento de cartões.

Existem várias empresas que já aderiram ao ‘embedded finance’. Um dos exemplos mais antigos é o crediário das Casas Bahia, quando se podia comprar qualquer produto e pagar as prestações por meio do carnê — o famoso ‘buy now, pay later’ (BNPL) atualmente –, assim como hoje oferecem cartão de crédito e seguro garantia estendida, bem como criaram o banQi, app para empréstimos pessoais, conta pré paga com cartão e cashback.

O Mercado Livre também disponibiliza uma ampla variedade de serviços por meio do Mercado Pago, que incluem enviar e receber dinheiro por Pix/TED, pagamento de contas, recargas de celular, seguros e crédito para clientes comprarem dentro do seu ecossistema, além do crédito para vendedores.

Estratégia semelhante adota o Rappi, com o Rappi Bank, que criou um cartão de crédito com cashbacks e possibilita também a compra de seguros.

A Ipiranga, com o Abastece , criou um app para abastecimentos que oferece cashback e pagamentos via Pix. Outro exemplo é o iFood, que além de oferecer conta virtual, maquininha de cartão e crédito para restaurantes, também entrou no mercado de vale alimentação mais recentemente, com soluções para empresas.

Por último, um exemplo próximo do dia a dia de muitas pessoas é a função de enviar e receber dinheiro pelo WhatsApp, que busca trazer uma usabilidade simples aos usuários.

Ainda falta um maior entendimento do que o usuário busca, facilitar e desburocratizar os processos e, ao mesmo tempo, eliminar tarefas operacionais para as empresas que fornecem esses serviços.

Vemos mais empresas buscando oferecer este tipo de solução, apoiadas em um ecossistema forte e maior informação do usuário, que agora busca por facilidade e menor custo. O consumidor já percebeu que pode ter um serviço melhor que o prestado por bancos, sem burocracia e mais baratos, além de ser tão seguro quanto.

Este tipo de serviço, ‘embedded finance’, deve crescer em razão do maior acesso a smartphones, internet e informação financeira, além da familiaridade com modelos mais simples de contratação.

Mais empresas como a Pomelo podem ajudar outras com segmentos diferentes do financeiro, podendo oferecer esses serviços, adicionando a sua proposta de valor sem as empresas terem que mudar do seu campo de atuação, ou terem que se especializar em um segmento totalmente diferente. Trazendo soluções com excelente experiência, maior abertura e segurança regulatória, que permite mais competidores no mercado, reduzindo custos, ampliando oferta de soluções e atendendo casos de uso mais específicos.

*Gaston Irigoyen é CEO da Pomelo; John Paz, COO; e Bruno Martucci, head de produtos.

As opiniões neste espaço refletem a visão dos especialistas e executivos de mercado, e não a do Finsiders.

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